Correio Braziliense - 24/08/2016
Suspensão da tramitação de projetos de correção, pedido pelo
Executivo, põe em confronto parlamentares do PMDB e do PSDB. Ministro da Casa
Civil diz que Planalto não recuará da decisão. Aumento de ministros do STF tem
parecer contrário no Senado
A tentativa do governo de adiar aumentos salariais do
funcionalismo para salvar o ajuste fiscal, abriu um front de batalha com os
servidores e se desdobrou em outra guerra na própria base de apoio parlamentar,
que o Executivo sonha ver marchando unida. Enquanto tucanos defendem o
adiamento da revisão salarial, deputados e senadores do PMDB do presidente
interino, Michel Temer, brigam pela correção nos contracheques.
Ontem, duas categorias viram empacar, na Comissão de
Assuntos Econômicos do Senado (CAE), a tramitação dos projetos de lei que
elevam seus ganhos: ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e membros do
Ministério Público Federal (MPF). No caso dos defensores públicos da União, a
validade de uma vitória no Senado é colocada em dúvida (leia texto abaixo).
O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, reiterou que
o governo não recuará da decisão de suspender os reajustes até a aprovação do
impeachment definitivo da presidente afastada, Dilma Rousseff. “Não haverá
exceções”, afirmou. Na Câmara dos Deputados, 10 categorias negociam a aprovação
de projetos garantindo correção das remunerações. A lista inclui os auditores
da Receita Federal, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal.
Padilha deu entrevista no Rio de Janeiro, após se reunir com
o prefeito Eduardo Paes para fazer um balanço da Olimpíada. Segundo ele, a
suspensão é uma decisão de governo. “Era necessário suspender esse tipo de
tratativa. Até passar o impeachment, o governo não falará em aumento para nenhuma
categoria” afirmou.
Na CAE, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) deu parecer
contrário ao aumento dos ministros do STF, que elevaria o teto se remuneração
do serviço público. Além disso, ficou claro que a decisão não será rápida. Como
foi concedida vista coletiva ao projeto, o texto será analisado na próxima
sessão ordinária da comissão, marcada para 30 de agosto. Mas tendência é de a
reunião não ocorrer, já que, naquela data, o processo de impeachment estará na
reta final. Com isso, os trabalhos deverão ser transferidos para 6 de setembro,
mas há o temor de que não haja sessão também nesse dia, véspera do feriado da
Independência. Dessa forma, a CAE deve se reunir somente em 13 de setembro.
O ministro do STF Gilmar Mendes não quis comentar o
adiamento do reajuste no seu contracheque. Entretanto, criticou o fato de
remunerações de juízes de primeira e segunda instância, muitas vezes,
ultrapassarem o teto constitucional. “Eu tenho a impressão de que o país virou
uma república corporativa em que cada qual, aproveitando da autonomia
administrativa e financeira, faz seu pequeno assalto”, disse.
Disputas
Tanto os ministros do STF quando o procurador-geral da
República pleiteiam salário de R$ 36.713 a partir de 1º de junho de 2016 e de
R$ 39.293 a partir de 1º de janeiro de 2017. A Consultoria de Orçamento do
Senado estima que a aprovação dos aumentos terá impacto financeiro anual
superior a R$ 4,5 bilhões para os cofres públicos. Apenas na União, a despesa
estimada supera o R$ 1,2 bilhão, graças à repercussão sobre os salários dos
demais juízes federais, ministros do Tribunal de Contas União (TCU) e à elevação
do teto do funcionalismo. Com o efeito cascata, haverá gasto adicional também
nos estados.
“Não estamos aqui falando apenas de um aumento para os 11
ministros do Supremo Tribunal Federal. Se fosse apenas isto, o impacto seria
inferior a R$ 1 milhão por ano. Estamos falando de um complexo sistema de
vinculações automáticas nas três esferas de governo que leva a um impacto
bilionário”, afirmou Ferraço.
A divisão da base aliada de Temer ficou clara quando o
senador Valdir Raupp (PMDB-RO) apresentou voto em separado favorável ao
reajuste dos magistrados. O peemedebista argumentou que o impacto da medida já
está previsto no Orçamento deste ano. A proposta revoltou senadores do PSDB e
do DEM. Para Ronaldo Caiado (DEM-GO), o momento é de sacrifícios para todos.
“Causa estranheza que a própria base do presidente venha aqui com um discurso a
favor do aumento um dia após o próprio presidente defender a suspensão da
discussão sobre esse projeto. Não dá para entender”, reclamou.
Despesa extra
O senador Valdir Raupp é relator do projeto que reajusta os
salários de integrantes do Ministério Público, que também tem forte impacto nos
orçamentos públicos. O texto ainda precisa ser lido na CAE. No Ministério
Público da União (MPU), o custo extra será de R$ 243,2 milhões em 2016, cresce
nos anos seguintes e chega a R$ 1,2 bilhão em 2020. No Ministério Público do
Distrito Federal e Territórios (MPDFT), as despesas com pessoal aumentarão R$
33,2 milhões em 2016, subindo para R$ 162,2 milhões em 2020.
Por Antonio Temóteo e Paulo Silva Pinto