Correio Braziliense
- 05/11/2017
Apesar da crise fiscal e das sucessivas promessas de corte
de gastos, União, estados e municípios aumentaram o quadro de servidores nos
últimos 12 meses. Governo federal terá R$ 700 milhões para contratações em 2018
Nos últimos 12 meses, o setor público contratou 240 mil
servidores, apesar de sucessivos anúncios de corte de gastos. A maioria foi
admitida entre julho e setembro deste ano. Conforme o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), naquele trimestre, 191 mil pessoas passaram a
fazer parte do quadro de funcionários de prefeituras, governos estaduais e do
Executivo federal. Em 2016, o número de contratados no mesmo período havia sido
de apenas 29 mil. No total, o funcionalismo público brasileiro soma 11,5
milhões de trabalhadores.
O Ministério do Planejamento informou que, entre janeiro e
setembro, o governo federal admitiu 14.934 funcionários por concurso público.
No início da semana, o ministro Dyogo Oliveira disse que, com o novo projeto de
Orçamento de 2018, a União terá R$ 700 milhões para contratar servidores no
próximo ano. Para isso, o Palácio do Planalto encaminhou ao Congresso medidas
provisórias adiando o reajuste de servidores do ano que vem para 2019 e
elevando a contribuição previdenciária deles de 11% para 14%. No momento, existem
4.292 vagas em aberto no Executivo. Isso porque a diferença entre o número de
contratados não superou o de aposentados entre janeiro e setembro - 19.226.
O governo do Distrito Federal também contratou. No último
trimestre, foram nomeados 470 servidores para as secretarias de Saúde,
Educação, Criança e também para Polícia Civil, Polícia Militar e Corpo de
Bombeiros. As nomeações foram possíveis após o GDF sair, em outubro, do limite
para gastos com pessoal estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF),
que é de 60% da receita corrente líquida.
Para o professor de administração pública da Universidade de
Brasília (UnB) José Matias-Pereira, a movimentação é natural, visto que muitos
servidores se aposentam e outros se desligam ou morrem. Ele acredita que a alta
do último trimestre tem mais relação com o novo cenário econômico. "Quando
a economia dá sinais de recuperação e a arrecadação cresce, os gestores buscam
suprir as áreas com maior deficiência", opina. "Em anos eleitorais, muitos
deles costumam assumir postura mais arriscada em relação a contratações. Mas,
neste ano, ainda não teve isso. Frente ao risco de infringir a LRF, é melhor
não arriscar."
O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco
Central, classifica a nova onda de contratações como perigosa. "O salário
do funcionalismo público é mais de uma vez e meia maior do que o salário médio
da economia. Isso é um baita problema, principalmente para estados e municípios
que estão com a corda no pescoço e não conseguem pagar os servidores",
lamenta. A principal consequência disso, ressalta, é ter de usar todo o
dinheiro arrecadado para pagar funcionários, e não aplicá-lo na prestação de
serviços. "Não há segurança, hospitais não funcionam. Não sobra dinheiro
para a população. O estado gasta uma estupidez para manter o funcionalismo e o
serviço é ruim", enfatiza.
A diferença de remuneração, por vezes, chama a atenção. A
agente socioeducativa Juliana Corrêa, 31 anos, formada em direito desde 2008,
conta que não encontrou oportunidade rentável no mercado formal e, por isso,
buscou o serviço público. "Eu me senti frustrada com as ofertas do mercado
de trabalho. Na ponta do lápis, não compensava", relata. Há cerca de três
anos, conseguiu um cargo comissionado na Secretaria de Educação do GDF.
"Mas sabia que teria um tempo específico para sair e voltar à
instabilidade", desabafa. Por isso, decidiu prestar concurso em 2015. Foi
aprovada e tomou posse em julho deste ano.
O papiloscopista Eduardo França, 25, foi efetivado em julho
na Polícia Civil do DF. Graduado em relações internacionais, ele foi corretor
de imóveis por quase três anos. "São dois mundos bem diferentes. Como
autônomo, eu chegava a trabalhar dois ou três meses para conseguir vender um
apartamento. Não dava para saber como seria o dia seguinte. Agora, sei que no
fim do mês o salário chega", comemora.
Acima da média
De acordo com o IBGE, o servidor público brasileiro ganha,
em média, R$ 3.272 mil por mês. Já o rendimento médio de um brasileiro
empregado no setor privado com carteira assinada é de R$ 2.035 mil. No trabalho
informal, a renda média é de R$ 1.206 mil. Dados do Índice Firjan de Gestão
Fiscal da Federação (IFGF), elaborado pela Federação das Indústrias do Rio de
Janeiro, apontam que a folha de pessoal é a principal despesa das prefeituras
brasileiras, tendo atingido 52,6% dos orçamentos dos municípios em 2016.
Segundo o estudo, 575 dos 5.570 municípios ultrapassaram o limite legal para
esse tipo de gasto.
Por Aline do Valle