BSPF - 19/09/2018
Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal
(STF) negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 601580, com repercussão
geral reconhecida, no qual se discutia a possibilidade de um servidor público
militar transferido por interesse da administração e matriculado em faculdade
particular ingressar em universidade pública caso não exista, na localidade de
destino, instituição particular semelhante. A decisão foi tomada na sessão desta
quarta-feira (19).
O recurso foi interposto pela Universidade Federal de Rio
Grande (FURG) contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4)
que garantiu a um servidor público militar o acesso à universidade pública sem
a realização de processo seletivo. A universidade alegava afronta ao princípio
de igualdade de condições para o acesso à educação (artigo 206, inciso I, da
Constituição Federal) ao privilegiar a possibilidade de acesso à universidade
pública de aluno egresso de universidade privada, em detrimento dos candidatos
que realizam o vestibular tradicional.
Ainda segundo a FURG, o Plenário do Supremo julgou, por
unanimidade, parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI) 3324 para declarar a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei
9.536/1997, assentando que a transferência de militar de universidade
particular para pública fere o direito de igualdade de condições de acesso e
permanência na escola superior.
Preliminar
Antes de julgarem o mérito do recurso, os ministros
assentaram, por maioria, ser possível a apreciação de tese de repercussão geral
em recurso extraordinário mesmo nos casos em que o processo esteja prejudicado.
A discussão se deu após o ministro Ricardo Lewandowski levantar a possibilidade
de que o militar do caso concreto já tenha terminado o curso superior, tendo em
vista que o recurso tramita no Supremo há nove anos. Essa circunstância levaria
à perda de objeto do recurso.
Ficou vencido neste ponto o ministro Marco Aurélio, por
entender que o recurso extraordinário é processo subjetivo (entre as partes) e,
uma vez prejudicado, o Supremo não poderia transformá-lo em processo objetivo,
atribuindo-lhe efeitos que ultrapassem o caso concreto.
Voto do relator
No mérito, o Plenário acompanhou por maioria a posição
adotada pelo relator, ministro Edson Fachin, pelo desprovimento do recurso. Ele
assentou seu voto em três premissas. A primeira delas é, no julgamento da ADI
3324, o Tribunal adotou a técnica da declaração parcial de nulidade sem redução
de texto, afastando uma interpretação tida por incompatível com a Constituição,
mas preservando o texto impugnado e outras possíveis interpretações. À exceção
da interpretação julgada inconstitucional pelo Tribunal, o dispositivo, para o
relator, continua válido. Além disso, Fachin observou que não foram examinados
pelo Supremo os casos de transferência de servidor em que não haja instituição
congênere. “Não há, pois, no precedente invocado, solução nítida para a
hipótese deste recurso extraordinário”.
A segunda razão pela qual o ministro votou pelo
desprovimento do recurso é que a transferência ex officio de servidor público
não pode privá-lo do direito à educação. De acordo com o relator, a situação
dos autos “restringe imoderadamente” o exercício desse direito, tendo em vista
que a garantia de ensino é tão importante quanto o acesso a ele. “Exigir que a
transferência se dê entre instituições de ensino congêneres praticamente
inviabilizaria o direito à educação não apenas dos servidores, mas de seus
dependentes, solução que, além de ir de encontro à disciplina feita pelo
legislador, exclui, por completo, o gozo de um direito fundamental”.
Por fim, para Fachin, a previsão legal que assegure, na
hipótese de transferência ex officio, a matrícula em instituição pública se
inexistir instituição congênere à de origem, não fere o direito à igualdade de
condições para o acesso à escola. O argumento de que a garantia de igualdade de
acesso não poderia ceder ante eventual interesse da Administração na
transferência de seus servidores, para o relator, não procede. “Na situação
limite em que não é possível ao servidor exercer o seu direito à educação,
tanto o direito à educação invocado pelo Estado quanto o que solicitam os
servidores têm o mesmo conteúdo”, afirmou. “Dada a ausência de outras opções
fáticas, deve a jurisdição constitucional guardar deferência em relação à opção
normativa realizada pelo legislador”, concluiu.
Divergência
Único a divergir, o ministro Marco Aurélio votou pelo
provimento do recurso. Para ele, no julgamento da ADI, o Tribunal emprestou ao
artigo 1º da Lei 9.536/1997 interpretação conforme a Constituição, sem redução
do texto, e concluiu que a matrícula deve se dar em instituição privada, se
assim o for a de origem, e, em pública, se o servidor ou o dependente for
egresso da instituição pública. “Acertou o Tribunal à época ao estabelecer,
considerado o livre acesso preconizado ao ensino superior no artigo 206 da
Constituição Federal, essa vinculação, obstaculizando que a simples
determinação de transferência conduza à matrícula daquele que fez vestibular
para uma universidade particular em uma universidade pública”, afirmou.
Tese
A tese de repercussão geral aprovada no RE foi a seguinte:
“É constitucional a previsão legal que assegure, na hipótese
de transferência ex officio de servidor, a matrícula em instituição pública, se
inexistir instituição congênere à de origem”.
Fonte: Assessoria de Imprensa do STF