Congresso em Foco
- 22/02/2019
O governo federal está definindo um conjunto de critérios
que deverão ser seguidos para o preenchimento de funções de confiança na
administração federal. A medida será anunciada como prova de coerência com a
promessa do presidente Jair Bolsonaro de pôr fim ao “toma lá dá cá”, isto é, à
prática de oferecer aos parlamentares nomeações de afilhados políticos e outras
benesses em troca do compromisso de votar a favor das propostas do governo no
Congresso Nacional.
A intenção, porém, é exatamente criar uma forma tecnicamente
defensável, politicamente palatável e moralmente aceitável de atender à notória
sede dos deputados e senadores por cargos governamentais. “Não vai haver toma
lá dá cá. Vamos atender aos parlamentares, na medida das possibilidades, se os
nomes indicados atenderem aos critérios técnicos que serão divulgados nos
próximos dias e sem fazer nenhuma exigência de contrapartida em votações na
Câmara ou no Senado”, disse ao Congresso em Foco uma fonte do governo.
Bolsonaro poderá assinar um decreto com a lista dos
pré-requisitos que serão obedecidos nas nomeações. Tais critérios deverão
incluir a exigência de formação educacional adequada, experiência comprovada na
área e “ficha limpa”. Entre outras coisas, o indicado não poderá ter condenação
criminal confirmada por órgão colegiado do Poder Judiciário nem ter tido suas
contas rejeitadas por qualquer tribunal de contas em razão de “ato doloso de
improbidade administrativa”, conforme prevê a Lei da Ficha Limpa.
“Respeitados esses critérios, o político poderá indicar. Não
é porque a indicação é feita pelo político que a pessoa não pode ocupar cargo.
Isso não é toma lá ”, completou a mesma fonte governamental.
No Congresso, integrantes da base governista manifestam
ceticismo. “O relacionamento do governo com o Senado e a Câmara não é bom”,
afirma o senador Mecias de Jesus (PRB-RR). “O governo age como se estivesse
discriminando o meio político, como se um político, ou alguém indicado por um
político, não pudesse ser capacitado para exercer um cargo público”, arremata o
senador, ressaltando que não está pedindo a nomeação de ninguém.
São vários os sinais de insatisfação da base governista. O
mais óbvio deles foi a derrota sofrida na última terça-feira com a derrubada do
decreto que ampliou as restrições à divulgação de documentos públicos. Nos
bastidores, as pressões por nomeações se intensificaram e alguns partidos –
como o próprio PRB – ameaçam se declarar independentes em relação ao governo. O
deputado Marcos Pereira (SP), primeiro-vice-presidente da Câmara e uma das
principais lideranças do PRB, chegou a usar o Twitter para se queixar do fato de o governo ter
optado pelo envio posterior das mudanças na legislação previdenciária
aplicáveis aos militares.
Também há reclamações contra a desarticulação política do
governo Bolsonaro e o bate-cabeça entre membros da base governista. A grita é
generalizada e o Palácio do Planalto já captou a mensagem de que, sem mudança
no relacionamento com o Congresso, não será possível aprovar uma proposta
polêmica como a reforma da Previdência. Retirar direitos, adiar aposentadoria e
reduzir benefícios de trabalhadores têm um elevado custo político para os
parlamentares e é esse custo que muitos congressistas estão agora determinados
a cobrar para votar a favor da reforma.
De qualquer maneira,
sabe-se que o texto entregue por Bolsonaro deverá passar por alterações
importantes para ter sua aprovação viabilizada. As regras propostas para o
pagamento da aposentadoria rural e dos benefícios
de prestação continuada (BPC), que beneficiam mais de 30 milhões de pessoas, e
a idade mínima de 65 anos para os homens e de 60 anos para os professores estão
entre os pontos mais questionados pelos parlamentares.
“Temos de ver como será a pressão da sociedade, de fora para
dentro do Congresso”, pondera o oposicionista Glauber Braga (Psol-RJ), “mas é
certo que, do jeito que veio, a reforma não passa. Exigir idade mínima de 70
anos para pagar o BPC, que é concedido a famílias com renda individual de um
quarto do salário mínimo, é tirar 30% da população que normalmente teria
direito a recebê-lo. É uma crueldade que o Congresso terá condições de evitar.”
Ele reconhece que as chances de aprovação aumentam se o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assumir mesmo o papel de
articulador da reforma. “É algo um tanto inusitado um presidente de poder agir
como líder do governo de fato, mas pode funcionar”, diz Glauber Braga. “Na derrubada do decreto,
Rodrigo Maia demonstrou que tem força para mobilizar a Câmara e derrotar o
governo. Na rejeição às emendas do cadastro positivo, ele mostrou que pode
fazer a mesma mobilização para dar a vitória ao Planalto”, analisa o deputado.
Com alguma ironia, a deputada Joice Hasselmann observa que a
reforma da Previdência produziu um “climão geral” de receio de desgaste
político entre parlamentares que até há pouco “juravam amor a Bolsonaro”.
Motivo: o medo de que se associar à reforma diminua as chances eleitorais de
congressistas que pretendem disputar as eleições municipais do ano que vem.
Por Sylvio Costa