BSPF - 06/03/2019
No momento em que o debate sobre a quantidade de servidores
públicos no Executivo e no Legislativo ganha força por causa da reforma da
Previdência, um levantamento do Estadão/Broadcast mostra que a Câmara dos
Deputados mantém 80% do seu quadro de funcionários com indicações políticas. Ao
todo, são 11.817 cargos comissionados, número que deve aumentar com
contratações feitas pelos novos parlamentares.
Na prática, boa parte desses servidores dá expediente nas
bases eleitorais dos congressistas e, em alguns casos, funcionam como uma
espécie de "cabo eleitoral" durante os quatro anos do mandato
parlamentar. Há também situações em que os cargos são usados para contratar
políticos sem mandato, como a ex-senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM),
nomeada no mês passado no gabinete da deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) após
não se reeleger. A ex-parlamentar afirma que, após 30 anos de mandatos, não
ficou rica e precisa trabalhar.
Quem defende o preenchimento das vagas na Casa com
indicações políticas argumenta que, embora em maior número, os comissionados
custam menos aos cofres públicos. Enquanto a folha de pagamento dos
comissionados soma R$ 1,1 bilhão ao ano, as despesas com os funcionários de
carreira (como consultores e policiais legislativos) chegam a R$ 1,3 bilhão.
Esta relação entre comissionados e servidores efetivos
observada na Câmara, no entanto, é bem diferente em outros órgãos. No
Executivo, são 633,6 mil funcionários ativos. Os indicados políticos, por sua
vez, equivalem a menos de 2% desse total e eram 12,5 mil em julho de 2018, o
dado mais atual disponível. Havia ainda 12,1 mil "funções
comissionadas", que, embora também sejam preenchidas por indicações
políticas, só podem ser ocupadas por servidores efetivos.
O Ministério da Economia já anunciou que vai apertar as
regras para todos os órgãos pedirem abertura de novos concursos públicos e
cortar 21 mil cargos, comissões e funções gratificadas. Uma reforma nas carreiras
do Executivo também está sendo elaborada. Na Câmara, o último grande concurso
para preenchimento de vagas ocorreu em 2012.
Custos
Cada deputado tem R$ 111.675,59 por mês para pagar salários
a até 25 funcionários do gabinete - os "secretários parlamentares"
Eles podem receber de R$ 1.025,12 a R$ 15.698,32. Encargos trabalhistas como
13.º salário, férias e auxílio-alimentação são bancados com recursos da Câmara.
Para integrantes do comando da Câmara, é interesse dos
servidores públicos explorar a discrepância no número de funcionários de
carreira e indicados políticos no momento em que são discutidas a proposta de
reforma da Previdência e a estabilidade do funcionalismo. Estes parlamentares
argumentam, porém, que os cargos temporários - vinculados ao regime geral do
INSS - custam bem menos do que a folha dos servidores ativos e inativos, que
soma, por ano, quase R$ 4 bilhões.
Em média, um servidor de carreira custa R$ 457,5 mil ao ano,
em comparação a R$ 94,9 mil do ocupante do cargo indicado pelo parlamentar.
Isso porque o salário médio do funcionário de carreira da Câmara é de R$ 30
mil.
Em alguns casos, o servidor pode se aposentar com o mesmo
salário que possuía quando estava em atividade, enquanto o teto do INSS é de R$
5.839,45.
Um dos pontos defendidos pelo governo na reforma da
Previdência é justamente a necessidade de se equilibrar as condições de
aposentadoria entre servidores e da iniciativa privada para ajustar as contas
públicas.
Sindicato
Na direção inversa, o presidente do SindCâmara, Ezequiel
Nascimento, diz que a quantidade de servidores já saiu do padrão de
racionalidade. "Esse número de cargos comissionados não é razoável",
afirmou. Segundo ele, o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ),
citou em seu discurso de posse o grande número de cargos comissionados.
Parlamentares da bancada do Novo, partido que conta com oito
deputados, já anunciaram que vão contratar no máximo 12 dos 25 servidores a que
têm direito. Eles também decidiram cortar 50% da cota parlamentar que têm direito
e que varia entre R$ 30 mil a R$ 45,6 mil, dependendo de cada Estado.
Para o líder do Novo, deputado Marcel Van Hattem (RS), a
prática atual acaba dificultando a renovação política, pois em muitos casos as
vagas são dadas a políticos da região que não foram eleitos ou parentes.
"É um problema. É um vício", afirmou o parlamentar.
Em palestra recente, o presidente da Câmara defendeu ser
preciso ter "coragem" de enfrentar as despesas e criticou as
corporações por atuarem contra as reformas da Previdência e administrativa. Ele
lembrou que salários no setor público são em média 67% superiores aos do setor
privado. Maia também defendeu na ocasião uma mudança na carreira dos servidores
da Câmara. Procurada, a assessoria da Câmara não quis comentar.
(Estadão Conteúdo)
Fonte: Jornal Cidade Verde