BSPF - 28/04/2019
A extinção do Ministério do Planejamento, no primeiro dia da
gestão Jair Bolsonaro, fechou um canal de negociação entre o governo e os
servidores públicos instituído havia mais de uma década. A consequência é o
aumento da pressão do funcionalismo sobre o Legislativo.
Um exemplo é a ofensiva de entidades representativas do
funcionalismo para desidratar a reforma da Previdência na Comissão Especial da
Câmara dos Deputados.
A medida provisória 870, de 1º de janeiro fundiu a pasta do
Planejamento na estrutura do superministério da Economia, sob comando de Paulo
Guedes. Lideranças do funcionalismo ouvidos pelo Valor relataram que o quadro
técnico dedicado à interlocução se manteve, mas que a orientação do ministério
mudou a equação. "Se, depois de sentar para conversar com a categoria, o
governo não faz nenhum ajuste, nunca, é porque não existe uma verdadeira
disposição para o diálogo", afirma o presidente do Sindicato Nacional dos
Funcionários do Banco Central (Sinal), Jordan Pereira.
Os sindicatos viveram um protagonismo nos anos do governo do
PT, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva instituiu uma mesa de
negociações permanente. O modelo foi reconhecido em relatório do Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), de 2014, como boa prática de
transparência. Líder sindical, Lula tinha no funcionalismo uma de suas bases
eleitorais. Eram, além disso, tempos de crescimento econômico, em que o Estado
conseguiu arcar com reajustes e concursos para aumentar a máquina pública.
Para a mestre em Administração Pública Cibele Franzene,
professora da Fundação Getulio Vargas, as mesas permanentes de negociação eram
um espaço institucional para tratar não só de questões salariais, mas de modelo
de carreira e de incentivos não financeiros. "As organizações sindicais
saem de um modelo em que tinham tudo para outro em que não têm nada",
afirma a especialista, em um paralelo entre os anos do PT e a gestão Bolsonaro.
"É necessário que o governo ofereça um espaço de negociação formal, senão
as entidades mais poderosas vão buscar encaminhar seus interesses por meio de influência
no Congresso. Ganha quem tem poder de pressão pelo lobby, e perde a sociedade
como um todo, que não tem como ser representada."
A fusão do Planejamento na estrutura da Economia coloca
questões relacionadas ao funcionalismo debaixo de um viés orçamentário, afirma
a pesquisadora. "O enfoque deixa de ser planejar aspectos da carreira
pública e passa a ser folha de pagamento, a cortar", afirma Cibele
Franzene.
A professora aponta que um momento como o atual, de aperto
fiscal, seria propício para, ao invés de falar somente em congelar concursos,
trabalhar em uma proposta de reestruturação das carreiras públicas.
A ideia de uma reforma institucional abarcaria, por exemplo,
a criação de cargos amplos, como de especialistas em políticas públicas. Esse
modelo, que remonta ao governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso
(PSDB), possibilita que se faça intercâmbio de servidores entre os órgãos
públicos, o que traria eficiência sem os custos de abrir um concurso público.
Hoje, cada categoria tem regras próprias, o que impede a
transferência de um órgão para outro. No Brasil, são mais de 360 carreiras
públicas.
O secretário de Gestão e de Desenvolvimento de Pessoal do
Ministério da Economia, Wagner Lenhart, afirma ter montado um cronograma de
reuniões para ouvir as categorias do funcionalismo. Participam dos encontros
ele ou o diretor do departamento de Relações de Trabalho no Serviço Público,
Cleber Izzo. "Estamos dispostos a ter um canal de diálogo permanente, mas
o governo tem a sua visão sobre as questões sindicais", afirma. O
ministério da Economia manteve o quadro de 745 pessoas na secretaria e 9 no
departamento.
Fonte: Valor Econômico