BSPF - 11/04/2019
O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério
Marinho, disse nesta quarta-feira (10) que o Brasil terá agora a última
oportunidade de fazer um ajuste no sistema previdenciário sem avançar nos
direitos adquiridos de mais de 30 milhões de brasileiros. A afirmação foi feita
durante instalação da comissão destinada a acompanhar a Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) 6/2019 que modifica o sistema de previdência social, em
tramitação na Câmara.
Composta por nove membros titulares e igual número de
suplentes, a comissão é presidida pelo senador Otto Alencar (PSD-BA) e tem como
relator o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
— O que nos motivou a apresentar o projeto é para que o
sistema fosse justo e sustentável, ao contrário da forma como ele se encontra
hoje. Nós temos um sistema previdenciário que é injusto porque poucos ganham
muito e muitos ganham pouco, e é insustentável do ponto de vista fiscal — disse
Marinho.
O secretário explicou que a ideia do projeto é que, ao longo
de um período de transição, funcionários públicos federais, que ganham um pouco
mais do que a média da população, vão ter as mesmas regras tanto na questão de
critérios de admissibilidade para a aposentadoria como para o recebimento do
benefício.
— Tanto no regime geral como no regime próprio, todos se
aposentarão com o teto de cinco mil e oitocentos e pouco reais e com o piso do
salário mínimo – observou.
Aposentados e pensionistas
Em relação ao perfil dos beneficiários do INSS, Marinho
disse que há aproximadamente 30 milhões de aposentados e pensionistas no regime
próprio. Cerca de 66,5% recebem até um salário mínimo e 16,9% recebem até dois
salários. O contingente de brasileiros que ganham até dois salários mínimos é
de 83,4%.
— Essa é a realidade do nosso sistema previdenciário do
país. A União pretende, no regime previdenciário e assistencial, economizar R$
1,1 trilhão. Caso as medidas sejam aprovadas em sua integralidade, teremos R$
329 bilhões nos próximos dez anos, em favor dos estados; e R$ 170 bilhões em
favor dos municípios — estimou.
Marinho disse que no Brasil há 71,3 milhões de pessoas potencialmente
beneficiárias do INSS, o que inclui celetistas, autônomos, microempresários e
trabalhadores intermitentes que estão na ativa e ainda irão se aposentar.
Aqueles que estão no topo da pirâmide vão contribuir 14 vezes mais do que quem
está na base, tendo em vista a regra da proporcionalidade, afirmou.
Fraudes
Em relação ao combate à fraudes, Marinho lembrou que há mais
de 60 dias tramita no Congresso a Medida Provisória (MP) 871/2019, que trata
especificamente do tema.
— Nós esperamos R$ 9,8 bilhões no primeiro ano, como
resultado de implementação dessa MP — disse.
Marinho apontou a fragilidade do sistema previdenciário e
informou que, dos R$ 712 bilhões de reais que o governo despendeu com
assistência em 2018, cerca de R$ 98 bilhões estavam relacionados à
judicialização.
— Ou seja, foi fruto de ações judiciais em função da
fragilidade do sistema. Essa situação é atacada frontalmente pela MP, que tenta
corrigir uma série de impropriedades na nossa legislação e preencher vácuos
jurisdicionais.
Marinho ressaltou que o sistema previdenciário é
deficitário, conforme atesta o próprio Tribunal de Contas da União (TCU), ao
contrário do que sustentam instituições que adotam metodologias distintas, não
reconhecidas pelo governo.
— O nosso deficit, em 2018, é de R$ 265 bilhões de reais. A
gente pode até discutir o tamanho do deficit, mas hoje há um consenso de que
ele existe e há o desequilíbrio fiscal. Essa rubrica orçamentaria, ao lado da
questão da dívida pública, é o elemento que mais pressiona tanto o Orçamento
federal como o orçamento dos estados e municípios - esclareceu.
Rural
Atualmente, disse Marinho, 53% dos brasileiros aposentam-se
aos por tempo de serviço aos 65 anos e meio. Ele disse que é preciso separar a
assistência da Previdência Social, tendo em vista que os mais pobres
aposentam-se dez anos depois dos mais ricos.
O secretário apontou desencontro de dados entre os
beneficiários da Previdência no meio rural. O Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) informa que 16% da população mora no meio rural, mas o
governo registra mais de 33% de aposentados no regime geral, garantiu.
— Há fragilidade do cadastro para verificação de quem
efetivamente tem direito a ser segurado especial. Não está tendo rigidez
necessária. Quem tem direito tem que ser alcançado, mas quem não tem direito
também está sendo alcançado. Na MP 871 mudamos a forma de convalidação do tempo
por sindicatos e passamos a uma declaração do próprio trabalhador rural, que
vai definir o tempo que efetivamente passou na atividade rural. A ideia é que
possamos tornar o cadastro livre de fraude. Na PEC fizemos mais três
alterações, propondo aumento de 55 para 60 anos na idade da mulher, o aumento
do tempo de contribuição de 15 para 20 anos, e o limite mínimo de contribuição
por ano, que passa a ser de R$ 600,00 — explicou.
BPC
Marinho também explicou as mudanças apresentadas pelo
governo em relação ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). O benefício de
um salário mínimo mensal é pago à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos
ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção, nem de
tê-la provida por sua família.
As regras de pagamento continuariam as mesmas para as
pessoas com deficiência — algo em torno de 2,5 milhões de beneficiários. Aos
idosos, o governo propõe o pagamento de R$ 400,00 a partir dos 60 anos. O valor
integral do benefício seria pago a partir dos 70 anos.
— O BPC tem a particularidade de duas clientelas distintas.
Propusemos a antecipação para os idosos e o governo deverá investir até R$ 18
bilhões para atender em torno de um milhão de pessoas — afirmou.
Marinho explicou que o Benefício de Prestação Continuada não
entra no cálculo do deficit previdenciário, visto que é suportado pela
contribuição do sistema social, e não apenas pela Previdência.
Militares
No caso dos militares, Marinho explicou que houve aumento do
tempo de contribuição de 30 para 35 anos, e na taxa de permanência, a depender
do posto.
— Um general, por exemplo, vai sair aos 70 anos de idade, e
a cada gradação de posto há acréscimo de tempo, o que vai permitir que o
suboficial, que normalmente se reformava abaixo dos 50 anos, fique praticamente
até os 58 anos de idade. Aumenta bastante o tempo de permanência da tropa
dentro das Forças Armadas. Há também a cobrança às pensionistas e aos cabos e
soldados — hoje isentos — da alíquota, que vai subir de 7,5 para 10,5%,
acrescido de um plano de saúde que é pago pelos militares, que vai para 14%,
média em que os servidores civis são remunerados — esclareceu.
Em contrapartida, ressaltou Marinho, foi oferecido aos
militares um projeto de reestruturação das carreiras das Forças Armadas, que
vai custar em torno de R$ 85 bilhões, e o saldo seria de R$ 10,5 bilhões, ao
longo de dez anos.
Capitalização
Em relação à capitalização, a PEC 6/2019 define que o tema
será tratado em projeto de lei complementar futuro, o qual estabelecerá uma
espécie de “colchão social”, para que nenhum brasileiro receba menos de um
salário mínimo, mesmo no sistema de capitalização, a qual não será de adesão
obrigatória, mas de livre escolha pelo trabalhador, disse Marinho.
A possibilidade de contribuição patronal e de trabalhadores,
dos entes federativos e do servidor, vedada a transferência de recursos
públicos, também está prevista em lei complementar, bem como os benefícios de
idade avançada, maternidade, incapacidade temporária ou permanente, morte e
risco de longevidade do segurado, explicou o secretário.
Cobrança de dívidas
Em março, disse Marinho, o governo apresentou projeto de lei
que instrumentaliza a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional para que ela possa
trabalhar na recuperação de dívidas contra grandes devedores — acima de R$ 15
milhões — e fazer tratativas de cunho administrativo, sem necessidade de
judicialização, com devedores de dívidas de menor valor.
— O nosso perfil da dívida previdenciária é hoje em torno de
R$ 500 bilhões, que a gente pode dividir grosseiramente em três partes. A
primeira, está ajuizada em torno de R$ 170 bilhões. Há uma recuperação anual na
ordem de seis a oito bilhões, em função do próprio trâmite judicial. Um terço
está em processo de negociação ou ajuizamento, e o terço remanescente é
irrecuperável porque é fruto de passivos de empresas que já faliram. As mais
famosas são as grandes companhias aéreas do passado, alguns bancos e grandes
lojas de magazines — explicou.
Marinho disse que o projeto de reforma previdenciária leva
em consideração a preservação dos direitos adquiridos e “uma máxima
estabelecida que aqueles que têm a maior capacidade contributiva contribuirão
com mais, e aqueles com menor capacidade contribuirão com menos, mas todos vão
contribuir”.
Questão demográfica
O secretário disse ainda que a questão demográfica impacta
diretamente a questão previdenciária. Na década de 80, o país saiu da média de
4,1 filhos por casal para a situação atual de 1,7, que sequer repõe a população
ao longo dos próximos anos, explicou.
— Isso significa que nós vamos ter um envelhecimento maior
da população ao longo do tempo, e um aumento da sobrevida, que é justamente o
que interessa para o cálculo atuarial. Há uma discussão na sociedade de que é
necessário trabalhar com expectativas de vida diferentes em função das regiões
do país, onde elas são diferentes. Só que esse dado, para efeitos
previdenciários, não é o mais importante. O que nos interessa é a sobrevida. A
partir dos 65 anos de idade, que é a idade de aposentadoria, a população, em
média, vive hoje 18 anos e quatro meses a mais. Em 2060 deve chegar a 21 anos e
dois meses. Isso é uniforme em todo o território nacional. A diferença de
sobrevida do Nordeste para o Sul é de seis meses. A expectativa de vida é
impactada por outros fatores, como mortalidade infantil, falta de saneamento
básico e violência, que não afetam as pessoas que conseguem chegar aos 65 anos
- considerou.
O Brasil tem hoje 13,3% da população idosa, que atingirá
42,6% em 2060, fruto da questão demográfica e do aumento da expectativa de
vida, disse Marinho. O deficit da Previdência pode atingir 294 bilhões, com
acréscimo de R$ 30 bilhões por ano, apenas em função do pagamento de novas
aposentadorias, disse.
Responsabilidade previdenciária
Marinho destacou que a PEC 6/2019 também prevê a criação de
uma Lei de Responsabilidade Previdenciária, a qual estabelece que os estados e
municípios deverão adequar-se à realidade em determinado período, sob pena de
não receberem repasses. Também permitirá aos fundos previdenciários dos estados
fazer correção de débito atuarial com acréscimo de alíquotas, evitando o
remanejamento de recursos para esse fim, em prejuízo da educação, saúde e
infraestrutura.
A partir da votação da PEC, o prazo máximo de parcelamento
do Refis será de 60 meses, e não mais de 240 ou 360 meses, “para evitar a roda
viva feita pelos devedores contumazes”, segundo Marinho.
Discussão
Durante o debate com o secretário especial da Previdência, o
senador Otto Alencar explicou que a comissão do Senado pretende discutir a
reforma previdenciária “ponto por ponto” em diversas audiências públicas. Disse
ainda, ser fundamental “compatibilizar o aspecto fiscal com o social” em um
país com tantas desigualdades como o Brasil.
— Não haverá interferências da comissão nas decisões da
Câmara. O que vai acontecer é o acompanhamento dos estudos preliminares que
estão sendo feitos lá para, quando chegar ao Senado, termos consciência do que
está acontecendo — esclareceu.
Otto Alencar defendeu a manutenção do BPC nos moldes atuais
e sugeriu ao governo fazer um cruzamento de dados com as declarações de imposto
de renda como forma de combater fraudes no pagamento do benefício. O senador
ressaltou ainda que muitos cidades do interior do Nordeste dependem mais dos
repasses da Previdência do que do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Tasso Jereissati sugeriu a Marinho a adesão opcional ao BPC,
por meio da qual o beneficiário escolheria receber R$ 400,00 aos 60 anos de
idade, ou aguardar pelo pagamento integral quando alcançasse 70 anos.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) defendeu a
necessidade da reforma, mas ressaltou que a parcela mais desprotegida da
população precisa contar com a ajuda do governo para a sua sobrevivência.
— O governo deveria flexibilizar na questão do BPC e do
rural, na alteração da idade da mulher do campo e do tempo de contribuição. Tem
muita dificuldade para a população mais pobre do país. Se o governo
flexibilizar alguns pontos, teremos uma Previdência mais compatível com o país
— considerou.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) avaliou que as mulheres
estão sendo duplamente penalizadas com a reforma da Previdência, tendo em vista
o aumento do tempo da contribuição em cinco anos, e da idade de aposentadoria
em dois anos.
O senador Cid Gomes (PDT-CE), por sua vez, criticou a
reforma da Previdência, que classificou de “remendo em câmara de ar velha e
ultrapassada, que é o nosso modelo de repartição, tratando de parametrizações
de tempo de contribuição, idade mínima e percentuais de contribuição”.
— Isso vai adiar a necessidade de se alterar e mexer de novo
as parametrizações, pois a população tem ampliado o tempo de sobrevida em
função da medicina e até melhoramentos genéticos. Preocupa-me dar crédito de
confiança a um governo profundamente ideológico, com ministros exóticos que têm
preconceitos e posições muito claras em relação à visão da economia. Hoje, o
deficit no regime geral de Previdência Social é muito em função de remendos no
modelo de repartição - afirmou.
Cid Gomes defendeu a taxação sobre lucros e dividendos, bem
como a implantação de um novo modelo de Previdência e a tributação dos bancos,
que registram “lucros exorbitantes e recordes em todos os anos”, segundo o
senador.
— O poder econômico dos bancos sustenta o poder político.
Precisamos mudar o sistema de Previdência, mas temos que mudar de fato, do
modelo de repartição para o modelo de capitalização — afirmou.
Já o senador Eduardo Braga (MDB-AM) disse que “há certezas e
muitas dúvidas" em relação à reforma da Previdência.
— O Brasil precisa de uma reforma que tenha aspectos fiscais
e sociais. Há que se ter uma rede de proteção social. É importante que o Brasil
tenha consciência disso — concluiu.
Fonte: Agência Senado