Agência Senado
- 26/08/2019
Reforma administrativa é desmonte do Estado, concordam
debatedores na CDH
A reforma administrativa proposta pelo Poder Executivo foi
criticada em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) nesta
segunda-feira (26). O colegiado reuniu sindicalistas para discutir "O
Estado necessário para o desenvolvimento brasileiro no século 21",
atendendo a requerimento do presidente, senador Paulo Paim (PT-RS).
Para o presidente da Associação dos Servidores do Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Sindicato Nacional dos
Servidores do Ipea, José Celso Cardoso, a reestruturação do sistema proposto
pelo governo resultará em perda de qualidade da política e em um colapso da
prestação de serviços a médio e longo prazos. Ele defendeu a manutenção da
estabilidade do funcionalismo público, ações para a cooperação entre as instituições
e garantias de remuneração e capacitação dos servidores. Ao dizer que o país
está em processo de desmonte, Cardoso acusou o governo de promover o
enfraquecimento da estrutura pública desde a retirada do PT do poder, em 2016.
— O que está se propondo como modelo de desenvolvimento e
sociedade é contrário à experiência exitosa que construímos no país ao longo de
sua história republicana — denunciou.
Vice-presidente da Associação dos Funcionários do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Arthur Koblitz declarou
que o Brasil está fora do caminho do desenvolvimento há décadas. Ele comentou
que o banco tem sofrido ataques desde a gestão do ex-presidente Michel Temer. E
citou como exemplo a extinção da taxa subsidiada do órgão, por meio da Medida
Provisória 777/2017.
Koblitz também criticou o trecho da reforma da Previdência
(PEC 6/2019) que zera os repasses constitucionais de recursos ao BNDES, bem
como o excessivo número de CPIs contra o banco. Para o debatedor, tratam-se de
medidas que não apresentam resultados nem comprovam crimes, mas se configuram
somente em propagandas mentirosas em desfavor da instituição.
— Claramente, esses discursos e essas CPIs fornecem
elementos para se tentar aprovar as reformas econômicas contra o próprio banco.
Mas é preciso lembrar que o BNDES é uma das instituições financeiras mais
transparentes do mundo — garantiu.
Críticas
A representante da Associação dos Empregados da Financiadora
de Estudos e Projetos (Afin-Finep), Beatriz Helena de Nascimento Alves,
comentou que o Brasil não conta com um projeto de desenvolvimento sustentável.
Para ela, o governo utiliza o argumento da crise econômica para promover
mudanças na Previdência e nos direitos trabalhistas, quando o intuito real é
fragilizar as relações de emprego e desmontar as organizações.
— Agora, essa proposta de reforma administrativa, que também
desconstrói o nosso Estado. Estamos perdidos num caminho errado que não nos
levará a lugar nenhum — criticou
Claudio Anselmo de Souza Mendonça, representante do
Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes),
defendeu as universidades públicas, afirmando que a autonomia acadêmica e seu
caráter de produção curricular estão sob ameaça. Ao dizer que tem havido
ingerência do Ministério da Educação (MEC) sobre as pesquisas, ele pediu a
união das organizações como forma de superar os desafios.
— Estamos em um momento gravíssimo. As entidades sindicais
devem compreender que ou a gente avança e cria espaços unitários para superar
esse lugar de ataque a quem tem sonhos, ou a gente vai entrar num processo onde
aquilo que lutamos para garantir levaremos 100 anos para recuperar.
Representante do Sindicato Nacional dos Servidores Públicos
Federais da Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial (SindCT), o
pesquisador aposentado Acioli Antônio de Olivo acusou o governo de desconhecer
a realidade do país e de atacar órgãos como o Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe), com ações como a exoneração do diretor Ricardo Galvão no começo
de agosto.
Acioli alertou que os institutos de Ciência e Tecnologia
estão a ponto de entrar em colapso, principalmente pela falta de recomposição
de funcionários. Segundo ele, há 4.515 servidores de carreira atualmente
lotados no Ministério da Ciência, Tecnologia Inovações e Comunicações (MCTI), e
1.469 cargos vagos. O debatedor também falou sobre a necessidade de capacitação
dos pesquisadores para atuar em áreas como o sensoriamento remoto, desmatamento
e queimadas no país. E defendeu que os investimentos na área sejam priorizados.
Já o representante do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), Paulo Januzzi, reforçou que os cortes no orçamento
público são retrocessos que colocam o Brasil na contramão da história. Ele
pediu o fortalecimento do Instituto por meio de concursos públicos, ressaltando
que o país seria ainda mais pobre sem a existência das estatísticas
disponibilizadas pelo IBGE. Isso porque, conforme explicou, os dados ajudam a
direcionar os investimentos.
Ao manifestar preocupação com o crescimento da pobreza,
Januzzi defendeu a manutenção das agendas de interesse coletivo voltadas à
educação, saúde e regulação ambiental e trabalhista, por exemplo. Para o
especialista, o alerta sobre os indicadores negativos vai além do aumento do
desmatamento, da evasão escolar, da mortalidade infantil ou da pobreza, uma vez
que o cenário de todas as políticas públicas também se apresenta “muito ruim”.
—Estamos numa situação muito complicada, inclusive pelo
desafio para manter as instituições que produzem as estatísticas que mostram os
avanços e retrocessos do nosso país.
e-Cidadania
Diversos internautas participaram da audiência pública,
enviando perguntas e comentários por meio do portal e-Cidadania. Leonardo
Castro Mascarenhas, do Piauí, por exemplo, questionou a ausência de
representantes do governo para explicar quais áreas estão sofrendo cortes
orçamentários e os motivos dessas medidas. Já Keila Naarah Costa, da Bahia,
escreveu que a via para a construção do conhecimento e a base para o progresso
humano é o direito de acesso às informações.