BSPF - 17/10/2019
A Comissão de Direitos Humanos (CDH) lançou nesta
quinta-feira (17) a cartilha “Reforma Administrativa do Governo Federal —
contornos, mitos e alternativas”. Organizado pela Frente Parlamentar Mista em
Defesa do Serviço Público, o texto traz um capítulo sobre as bases de um
serviço público de qualidade e outro sobre o alicerce de uma reforma
administrativa republicana e democrática.
A cartilha discorre sobre seis supostos mitos que existem em
torno do estado brasileiro: a máquina pública está inchada; as despesas com o
pessoal da União estão altas e descontroladas; o Estado é ineficiente; a
estabilidade do funcionalismo é um privilégio e é absoluta; o dinheiro do
governo acabou; as reformas (previdenciária, administrativa e microeconômicas)
vão recuperar a confiança dos investidores privados, o crescimento e o emprego.
Para os convidados, o governo pretende desmontar o serviço
público por meio de cortes, precarização e manipulação da opinião pública
utilizando a atual crise econômica para reduzir o Estado. O deputado federal
professor Israel Batista (PV-DF) ressaltou que é necessário investir em
comunicação, distribuindo a cartilha da reforma em todas as repartições
públicas do país e que o objetivo do governo é criar um inimigo comum que, no
caso, é o servidor.
— Precisamos entender que o jogo do governo é o jogo de mobilização
da opinião pública. Ela se mobiliza através da criação de grandes inimigos
comuns. E o inimigo comum da vez é o servidor, que vai ser demonizado — previu
o deputado.
Segundo Rudinei Marques, do Fórum Nacional Permanente de
Carreiras Típicas do Estado (Fonacate), uma das formas de colocar a população
contra os servidores públicos é comparar os salários deles com os pagos na
iniciativa privada. Para ele, essa ideia é grosseira, por não levar em conta o
nível de escolaridade. Marques destacou que isso foi feito em recente
publicação editada pelo Banco Mundial (Bird).
— O Banco Mundial aponta que servidores ganham 96% a mais
que os demais trabalhadores. Mas esquece de dizer que 75% dos servidores têm
nível superior, sendo 40% com pós-graduação e 35% com mestrado e doutorado,
contra 15,3% da população geral com nível superior.
Ele lembrou que as carreiras de Estado não têm
correspondência com as privadas, por isso a comparação se torna inócua.
— O salário do diplomata foi comparado com o de quem na iniciativa
privada? E os dos funcionários do Fisco? Essa é, aliás, a definição de carreira
de Estado, não existe correspondente no mercado — comparou.
O advogado Marcelino Rodrigues, da Associação Nacional dos
Advogados Públicos Federais (Anafe), questionou como exercer a atividade de
gestão e fiscalização de contratos, por exemplo, se não houver a garantia de
estabilidade e autonomia.
— Quem fez a Lava Jato? Foram policiais, juízes, promotores.
Tirar a estabilidade enfraquece o Estado e o serviço público que atua contra a
corrupção.
O representante da Associação Brasileira de Economistas pela
Democracia, Paulo Klias, destacou que o trabalhador remunerado com salário
mínimo se escandaliza ao saber do subsídio pago a um juiz ou procurador.
— Esse tipo de populismo é utilizado com o intuito de
promover a redução do Estado — ressaltou.
Estado Mínimo
Klias considera que nos últimos cinco anos o país vem
passando “por retrocesso da democracia e destruição das condições mínimas para
que a sociedade consiga ter um futuro de maior igualdade e justiça social”. O
erro, na visão dele, é a ideia de “austericídio”, definido como corte radical
de gasto público para solucionar a crise econômica.
Ele criticou a redução de gastos públicos prevista para os
próximos 20 anos, as privatizações das estatais, a redução das condições dos
trabalhadores na reforma trabalhista e a ideia populista de reduzir os salários
e os cargos da administração pública para arrumar as contas públicas.
— Qualquer projeto de recuperação econômica inclusiva
precisa de um estado forte, não um estado desmontado.
O representante da Associação dos Funcionários do Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Celso Cardoso Junior, acusou o
governo de desmonte no setor produtivo estatal e nas áreas social, ambiental,
institucional e internacional.
— Redução de estruturas, carreiras e cargos. Redução de
remunerações para a redução do gasto global com pessoal, avaliação de
desempenho para fins de demissão, ou seja, quebra da estabilidade, e
cerceamento das formas de organização, financiamento e atuação sindical. São
pilares da reforma administrativa que está se desenhando como proposta do
governo — destacou José Celso.
Essas quatro frentes de desmonte do estado brasileiro,
segundo o funcionário do Ipea, estão ancoradas numa visão equivocada sobre o papel
das finanças públicas no desenvolvimento brasileiro.
— É a ideia de que o gasto público é ruim por natureza, sem
considerar a prestação de serviços, a arrecadação e a contribuição para o
desenvolvimento econômico que provêm desses fatores.
Organizador da cartilha, José Celso afirmou que o documento
sugere alternativas para debater e qualificar essa discussão. Entre elas estão
democratizar a gestão pública; fortalecer o servidor público e dar
transparência aos processos; trazer a participação social para as instituições
públicas; e melhorar o planejamento estratégico e a gestão dos ativos e dos
investimentos das estatais.
Fonte: Agência Senado