JOTA - 23/03/2020
JOTA ouviu economistas e constitucionalistas para saber se
medida seria viável do ponto de vista legal
A redução temporária das jornadas e salários de servidores
públicos é uma alternativa para aumentar o poder de manobra da gestão pública
em meio à crise do coronavírus? Mais: a opção é válida e viável no ordenamento
jurídico brasileiro?
A questão divide as opiniões de economistas, advogados e
constitucionalistas ouvidos pelo JOTA. Para defensores dessa adaptação da
jornada e dos vencimentos, seria uma forma de levar ao setor público os mesmos
efeitos que estão sendo sentidos pelos trabalhadores de empresas. Para os
contrários, a medida não se justifica porque há outras formas de reforçar o
caixa do governo e porque a Constituição impede a redução de vencimentos.
Na iniciativa privada, o Executivo federal propôs nesta
semana permitir a redução de até 50% da jornada de trabalho, com corte de
salário na mesma proporção, para evitar demissões. No caso do serviço público,
o debate ainda é inicial no Congresso.
Em recente webinar com o JOTA, presidente da Associação
Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Porto,
mostrou que a Justiça do Trabalho não é receptiva à ideia do governo. A
magistrada considera preocupante o fato de a flexibilização trabalhista ser
unilateral. “A Constituição prevê flexibilização de jornada e de salário, mas
desde que tenha participação do sindicato. A crise não pode ser uma carta
branca para os empregadores agirem do jeito que quiserem”, disse.
Para a consultora econômica Zeina Latif, a redução da
jornada e dos salários dos servidores públicos é uma necessidade no momento.
“Vamos ter demandas por recursos explodindo de todo lado. Vai ser preciso
dinheiro para cuidar da saúde, das pessoas mais vulneráveis e para
disponibilizar auxílios”, diz a consultora econômica Zeina Latif ao JOTA. “É
importante que o governo tenha um poder mínimo de manobra.”
Para a economista, a redução temporária na jornada e nos
salários dos servidores públicos traria um alívio aos estados e municípios, que
hoje comprometem grande parte da receita com funcionalismo.
Consultor legislativo do Senado e doutor em economia, Pedro
Nery considera que essa seria uma boa iniciativa. “Uma redução temporária de
salários como essa liberaria dezenas de bilhões, poderia ser uma medida de
solidariedade, de fraternidade”, diz.
Nery avalia que a medida iria “tirar um pouquinho de quem
ganha mais e tem emprego vitalício e dar para quem é pobre e não tem emprego
formal”.
Paulo Feldmann, professor de Economia da USP, avalia que a
medida não seria adequada. “É preciso taxar os mais ricos. Metade da riqueza
brasileira está concentrada em apenas 1% da população e nós não temos um
imposto sobre fortunas”, diz.
O economista lembra que as famílias que ganham mais de R$
320 mil ao mês pagam impostos entre 2,5% e 3% desse valor, já a classe média
arca com 15% de tributos. Feldmann defende que o governo faça um “decreto de
emergência taxando a renda dos mais ricos, aproveitando que estamos no período
de declaração do imposto renda”.
Já o economista Raul Velloso, especialista em contas
públicas do país, é enfático ao afirmar que não está “nem um pouco preocupado
com alívio financeiro”. Ele defende foco total para evitar contaminação
generalizada do coronavírus. “O menos importante é pensar no custo mais baixo.
Estou mais preocupado em saber o que é preciso fazer para evitar a
contaminação. Seja qual for a solução, que se use a solução”, afirma.
O que diz a Constituição
A Constituição define no inciso XXXVI do artigo 5º que “a
lei...
Leia a íntegra em É possível reduzir a jornada e os salários dos servidores públicos?