quinta-feira, 11 de junho de 2009

Diretor-geral do Senado nomeou servidor acusado de fraude a cargo comissionado



Correio Braziliense - 11/06/2009

A audácia da burocracia administrativa do Senado parece não ter limite. É capaz de atropelar até mesmo as ordens da mais alta autoridade da Casa, o presidente. O atual diretor-geral do Senado, José Alexandre Gazineo, protagonizou um exemplo recente dessa ousadia. Sem fazer alarde, Gazineo nomeou um servidor acusado de fraudar licitações para um cargo comissionado apenas dois dias depois de esse mesmo funcionário ter sido exonerado.

O episódio ocorreu em 2008 e só agora vem à tona, no rastro da publicação de atos administrativos retroativos. Em 2 de dezembro de 2008, no ato de nº 2.670, Gazineo nomeou Dimitrios Hadjinicolaou para o posto de chefe de gabinete administrativo da Secretaria de Estágios com efeitos retroativos a 16 de outubro. Dois dias antes, no dia 14, o então presidente Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) havia exonerado o servidor da função de diretor de Contratações e Compras por causa de seu suposto envolvimento num esquema de fraudes em licitações. O posto destinado a Dimitrios, um FC-07, representa R$ 3,3 mil a mais no contracheque.

Ontem, abordado em plenário, Garibaldi ficou pasmo com a informação apresentada a ele pelo Correio: “Isso é um absurdo. Eu não sabia. Tem de haver uma investigação”, afirmou o peemedebista. Em 2008, pressionado a agir por causa da revelação de detalhes da Operação Mão-de-Obra, ação da Polícia Federal contra as irregularidades em licitações da Casa, Garibaldi determinou o afastamento de Dimitrios e Aloysio Brito Vieira, outro ex-diretor na Secretaria de Compras e Contratações do Senado, além da realização de licitações para substituir as empresas investigadas.

Dimitrios e Aloysio são servidores de carreira e, na avaliação de Garibaldi, deveriam ficar afastados das funções de confiança até que fossem esclarecidas as denúncias de que, em troca de suposta propina, colaboraram com empresários do ramo da terceirização investigados pela polícia e pelo Ministério Público Federal. Não existe, porém, uma sindicância interna. Os dois são alvos de ação por improbidade administrativa e representação criminal na Justiça Federal de Brasília. Ainda que não tenha sido sanadas essas dúvidas, Dimitrios foi beneficiado pelo ato assinado por Gazineo.

Nos corredores do Senado, servidores costumam dizer que a área para a qual o servidor foi nomeado chefe de gabinete, a Secretaria de Estágios, é feudo de Agaciel Maia. Tanto que Sânzia Maia, mulher do ex-diretor, comandava o setor. Ela foi exonerada, no ano passado, por causa da súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) que proibiu o nepotismo na administração pública.

Não se lembra
Procurado pela reportagem, o diretor-geral afirmou não se recordar do ato administrativo. Disse que não raras as vezes assinava esses documentos no lugar de Agaciel, seu ex-superior hierárquico. Gazineo buscou explicação técnica para justificar a nomeação. Argumentou que Dimitrios, por ser do quadro de analista legislativo, teria que obrigatoriamente ser nomeado. “A função comissionada é inerente ao cargo (de analista legislativo). Portanto, ele não poderia ficar sem ela.”

O diretor-geral, porém, foi alertado pelo Correio de que o próprio o ato assinado por ele descreve Dimitrios como ocupante do quadro de “técnico legislativo” e não de analista legislativo. “É, aí ele não teria direito (à nomeação). Mas digo isso a princípio, a princípio. Essa é uma situação que tem que ser analisada. Verificar se ele tem algum direito adquirido”, acrescentou. À tarde, por volta das 16h15, a reportagem tentou falar com Dimitrios na Secretaria de Estágios. Uma servidora disse que não havia mais ninguém no setor. O repórter insistiu sobre a presença de Dimitrios e ela falou que ele “entra e sai” o tempo todo e que fica difícil saber em que momento ele está no setor.

Análise da notícia
Limpeza ética distante

A revelada nomeação de Dimitrios Hadjinicolau para a Secretaria de Estágios do Senado simboliza a dificuldade que a Casa tem para promover a prometida limpeza ética. Pipocam as denúncias de irregularidades desde o ano passado — ora em contratos com prestadoras de serviço, ora na distribuição de cargos comissionados ou nas cotas aéreas e do auxílio-moradia dos senadores —, mas pouco se viu até agora para estancá-las. Há duas semanas, o Correio denunciou que o funcionário Aloysio Brito Vieira, investigado pela Polícia Federal no episódio das licitações fraudadas assim como Dimitrios, fora nomeado para trabalhar numa comissão especial encarregada de inventariar o patrimônio. O servidor disse que desconhecia o ato, que algum colega o quis ajudar. É subestimar a capacidade do contribuinte, que paga uma conta anual superior a R$ 2,7 bilhões para manter o Senado em funcionamento. José Sarney entregou a vassoura a Heráclito Fortes. O senador do DEM piauiense encampa o discurso da arrumação. No entanto, de tantas amarras políticas costuradas nos últimos anos entre senadores e o alto comando burocrático da Casa fica difícil avançar. Para citar apenas um exemplo: foram anunciadas auditorias em todos os contratos com terceirizadas. O trabalho têm identificado uma série de irregularidades, como sobrepreço e excesso de funcionários contratados. Muitas dessas contratações, porém, têm sido renovadas porque não houve tempo de fazer novas licitações. E, assim, segue o Senado. (MR)

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