Correio Braziliense - 29/03/2010
Apesar de óbvia, a comprovação da frequência não constitui praxe no Senado. Depois de desgastante escândalo que sangrou a instituição por quase um ano, o presidente José Sarney decidiu instalar ponto eletrônico para registrar o horário de entrada e saída dos servidores. A iniciativa foi reação à denúncia de desmandos no pagamento de horas extras. Em pleno recesso parlamentar de janeiro de 2009, a Câmara Alta desembolsou nada menos de R$ 6,2 milhões a título de pagamento extraordinário para os servidores. Nos 12 meses do mesmo ano, os valores somaram R$ 87,6 milhões.
Depois de idas e vindas, em fevereiro finalmente veio à luz medida que dava resposta à indignação pública. Mas o que parecia conquista da ética tornou-se objeto de burla. Brecha na regulamentação abriu portas para a desmoralização. Trezentos servidores (efetivos e comissionados), a pedido de parlamentares, foram dispensados do ponto. A razão: alguns não têm horário rígido de trabalho. Precisam atuar fora da Casa. Umas vezes, em órgãos localizados em Brasília. Outras, no estado representado pelo senador.
A exceção, porém, virou regra. O senador Almeira Lima (PMDB-SE), por exemplo, liberou todo o gabinete. Efraim Morais (DEM-PB) dispensou 43 dos 58 servidores a ele subordinados. É como se todos — ou a grande maioria — não tivessem o que fazer na Casa na qual são lotados. Tal argumento, convenhamos, não convence ninguém. A maior parte das atividades se desempenha nas dependências legislativas. Ali se reúnem as comissões, debatem-se matérias no plenário, o eleitor localiza o político.
Soa falsa, assim, a desculpa de que o trabalho do senador tem características incompatíveis com o controle da frequência dos servidores. Se assim fosse, não se justificaria a instalação do ponto eletrônico. A iniciativa, longe de dar provas da vontade de moralizar a administração da Casa, torna-a, mais uma vez, objeto de justas críticas.