O Estado de S. Paulo
- 27/11/2011
A criação de um fundo de previdência para o servidor público
deu mais um passo na última semana e o governo espera aprová-la até o dia 10 de
dezembro na Câmara dos Deputados. Se tramitar rápido no Senado, é possível que
a presidente o sancione até o final do 1.º semestre de 2012. Esse é o único
item da reforma da previdência que Dilma Rousseff concordou em tocar - é o
menos polêmico, porque atingirá só os futuros servidores, não mexe nos atuais,
mas também não resolve em curto prazo o gigante déficit da previdência pública,
que já soma R$ 57 bilhões e vai continuar crescendo, pelo menos nos próximos
dez anos.
Em reunião com lideranças partidárias no Congresso,
quarta-feira, o governo cedeu a pressões do Judiciário e aceitou criar três
fundos distintos: para os servidores do Executivo, do Legislativo e do
Judiciário. O que seria um virou três. Até aí, nada demais. Afinal, qualquer
erro de gestão que resulte em déficit para o fundo todos nós, brasileiros, que
nada temos que ver com a história, seremos chamados a cobrir o prejuízo com
impostos. Melhor dividir riscos. Até porque concentrar todos os futuros
funcionários da União (os atuais são 2,11 milhões) pode, no futuro, fazer dos
três fundos os maiores do País, talvez até da América Latina. Com potencial de
gerar lucros fabulosos ou prejuízos fantásticos, dependendo da gestão.
Por isso é fundamental agregar ao projeto que está no
Congresso regras de gestão capazes de blindá-los contra fraudes, interferências
políticas, operações desastrosas, enfim, regras para proteger o dinheiro do
contribuinte. E a mais indispensável é dar acesso pela internet aos
participantes fiscalizarem as operações. O histórico dos fundos de pensão das
estatais é rico em gestões intencionalmente desastrosas e irresponsáveis, que
traziam lucro para os gestores (escolhidos por filiação partidária) e prejuízos
para a estatal mantenedora. Que pelo menos sirva de lição para o governo e o
Congresso conceberem com muito cuidado regras para esses fundos.
Na década de 1990, por mais de uma vez a Petrobrás socorreu
a Fundação Petros com aportes bilionários de dinheiro que ultrapassaram R$ 6
bilhões. E as regras de gestão só mudaram porque a Securities and Exchange
Comission (SEC), a CVM dos EUA, exigiu como condição para a Petrobrás negociar
ações na Bolsa de Nova York. Como o governo brasileiro não é empresa, não tem
ações em NY e é sustentado com dinheiro de impostos, cabe ao governo e ao
Congresso a responsabilidade de proteger o dinheiro de todos os brasileiros,
proibindo o uso político e evitando a repetição de erros das estatais.
O projeto do governo prevê terceirizar a gestão para bancos
com experiência em administrar esse tipo de patrimônio, como ocorre com fundos
de empresas privadas. Mas o PT tem pressionado para mudar esse item e entregar
a gestão a funcionários inexperientes. Alega que a gestão privada pode tirar a
liberdade para aplicar o patrimônio dos fundos em projetos de interesse do
governo.
É aí que mora o perigo. Fundo de pensão precisa de gestão
profissional e competente para gerar lucro, ter boa rentabilidade e garantir o
pagamento dos benefícios no futuro. Se o projeto de interesse do governo
conseguir esse objetivo, tanto melhor. Mas não é o que ocorre. E o perigo
aumenta exatamente no início da vida dos fundos, por três razões:
em nove anos de governo, o PT e aliados mostraram o tamanho
da sede por cargos e dinheiro. Os fundos precisam ficar longe deles;
se hoje a escolha dos gestores já é partidária nas estatais,
imagine como se dará a disputa em se tratando de funcionários dos Três Poderes;
nos primeiros 20 ou 30 anos, o fundo só vai acumular
patrimônio, não terá despesas com pagamento de benefícios, porque ainda não
haverá aposentados. Isso faz crescer o olho grande do governo e dos políticos
em usar o dinheiro dos fundos com fins eleitorais e transferir prejuízos para o
futuro.
Se a intenção da presidente Dilma é criar fundos que
realmente complementem a aposentadoria de funcionários na velhice, que trate de
garanti-lo no projeto que vai sair do Congresso.
SUELY, CALDAS, JORNALISTA, PROFESSORA DA PUC-RIO
E-MAIL: SUCALDAS@TERRA.COM.BR
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