Correio Braziliense - 17/07/2013
Correio teve acesso a uma lista de nomes de 94 funcionários
de nível médio da Câmara dos Deputados que recebem salários bem acima dos
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), cuja remuneração é usada como
referência para o teto constitucional dos vencimentos no serviço público. Esses
servidores de carreira técnica custam à Casa cerca de R$ 44 milhões por ano.
Os salários brutos mensais variam entre R$ 42.805 e R$
31.233, e os valores líquidos, de R$ 29.639 a R$ 21.774 segundo checagem
realizada na seção de "transparência" da página eletrônica da Câmara.
Ministros do STF recebem remuneração básica de R$ 28.059. No caso dos que estão
também no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), há uma gratificação extra, de R$
3.086, que eleva o ganho total para R$ 31.145 ao mês.
Mesmo esses ministros mais bem pagos do que os demais
colegas do Supremo perdem a corrida salarial para o grupo de funcionários de
nível médio da Câmara: levam para casa, depois do pagamento de todos os
tributos, R$ 21.133. Foi considerada, no caso do Supremo, a remuneração de
maio, já que a de junho incluía pagamento de adicional de férias, o que não
ocorreu no caso dos funcionários da Câmara. No Superior Tribunal de Justiça
(STJ), os salários giram em tomo desses valores, com alguma variação por conta
de itens eventuais. No contracheque mensal, um parlamentar fica, após os
descontos, com R$ 18.080.
Para o Executivo, não há dúvida de que o teto do
funcionalismo é de R$ 28.059, o bruto básico no STF. Um dos mais importantes
ministros do governo, por exemplo, tem remuneração de R$ 50.908, graças à soma
do salário e da aposentadoria a que tem direito. Mas o abate teto é implacável,
retirando da conta dele R$ 22.849. E não para aí. Só depois desse corte é que
vêm os descontos do Imposto de Renda e da Previdência, que derrubam a
remuneração líquida para R$ 20.540. Caso o mesmo critério valesse para a
Câmara, a economia anual para o Erário seria de cerca de R$ 10 milhões,
considerando-se apenas alista dos 94 técnicos.
O site da Câmara informa que "não estão sendo
consideradas para fins de base de cálculo do redutor constitucional (abate
teto) as parcelas pagas a título de função ou cargo em comissão e serviços
extraordinários". Essa posição, ainda de acordo com o texto, deve-se a um
processo em curso na Justiça Federal. Foi concedida uma liminar, decisão
judicial provisória, que permite tal interpretação, seguida também pelo Senado
Federal.
A assessoria de imprensa da Câmara informou os usados pela
Casa. Ela se atém à resolução 13 de 2006 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
segundo a qual está excluído do cálculo do teto o "abono de
permanência", que é concedido a servidores que já têm idade para se
aposentar mas preferem ficar na ativa,
por exercício da presidência de tribunais, a gratificação eleitoral
(para os ministros que trabalham no TSE) e remuneração proveniente do
magistério.
Com base nessa resolução, e em outra semelhante do Conselho
Nacional do Ministério Público, a administração da Câmara entende que
pagamentos que dizem respeito às funções de confiança estão fora da conta do
limite salarial. O problema é que, no caso do Legislativo, esses penduricalhos
são bem maiores do que os que são mencionados na decisão do STJ. O item
"cargo em comissão" de um dos servidores da Câmara indica valor de R$8.200
mensais.
Imoralidade
Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello
Branco, o pagamento de salários acima do teto constitucional a funcionários da
Câmara é "absolutamente imoral". "É por esse e outros fatores
que o orçamento do Congresso Nacional ultrapassa mais de R$ 8,3 bilhões aò ano.
O alto valor pago a esses servidores é profundamente injusto com as demais
categorias de trabalhadores do país, seja na esfera pública ou na privada, que
não conseguem jamais ter um salário desse nível", afirmou.
De acordo com os cálculos de Castello Branco, o custo diário
do Congresso é de R$ 23,7 milhões. "Isso se deve a essas barbaridades e
imoralidades dos salários e dos penduricalhos, até porque grande parte do
orçamento é com pessoal”, disse.
O diretor-geral da Câmara, Sergio Sampaio Almeida, e o
diretor-administrativo, Rômulo Mesquita, constam da lista de servidores de
nível médio que recebem mais do que ministros. Conforme as informações no
portal de transparência da Câmara, ambos são técnicos legislativos. Nenhum dos
dois foi encontrado ontem para comentar as informações sobre seus casos
específicos e a lista de 94 nomes. Almeida está em férias. Mesquita estava em
compromisso externo e não retomou as ligações.
Pode-se ter a impressão de que esses dois nomes, no topo da
administração da Casa, inflam a remuneração média da lista. Mas não é assim.
Eles nem sequer têm os salários mais altos. Não recebem, por exemplo, o tal
abono de permanência, destinado a segurar quem tem direito à aposentadoria.
Essa valor é pago a vários dos servidores de nível técnico que recebem mais do
que ministros.
Segundo a assessoria da Câmara, há ali 3.410 funcionários,
dos quais 1.568 são de nível médio. “Em tese, a remuneração total de um
servidor de nível médio pode, eventualmente, ultrapassar a de um servidor de
nível superior, dependendo de algumas variáveis, como o tempo de casa e funções
comissionadas exercidas ao longo da carreira”, afirmou, por meio de nota ao
Corteio. Ainda de acordo com a assessoria, há servidores que incorporaram na
remuneração gratificações por função de confiança exercida no passado.
(Colaboraram Bárbara Nascimento e Leandro Kleber)
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