Ana D'Angelo
Correio Braziliense
- 24/02/2014
Após perder na Câmara, o Planalto articula no Senado para
evitar que os advogados da AGU tenham direito a receber honorários em causas
vencidas pela União
Votação na Câmara para discutir o CPC: rebelião de deputados
da base aliada resultou em derrota do Planalto
O Palácio do Planalto vai montar uma ofensiva com os líderes
da base aliada no Senado para reverter a derrota que sofreu na Câmara no início
do mês, que garantiu aos integrantes da Advocacia-Geral da União (AGU) o
direito aos honorários das causas vencidas pela União pagos pelas partes
perdedoras. A ministra de Relações Internacionais, Ideli Salvatti, pretende
tratar do assunto já na reunião programada para esta semana com os líderes, ou
logo após o feriado, caso o encontro fique esvaziado por causa do carnaval.
O dispositivo, incluído no texto principal do Código de
Processo Civil (CPC) há cinco meses, foi mantido na Câmara por 206 votos a 159,
com apoio de boa parte de deputados aliados. O governo pretendia retirá-lo do
novo CPC com a apresentação de um destaque supressivo, mas teve baixas até no
PT e no PMDB — os partidos que dão maior sustentação ao Planalto —, que
contrariaram a orientação dos líderes governistas.
A disputa entre os servidores e o governo federal envolve um
montante da ordem de R$ 150 milhões a R$ 200 milhões por ano, correspondente a
entre 5% e 20% do valor das causas, sem incluir as ações tributárias
milionárias. A quantia a ser distribuída entre os 12 mil advogados da União,
procuradores federais e procuradores da Fazenda Nacional pode ser maior ainda,
porque a categoria promete se esforçar para aumentar as vitórias da União, já
que receberão o valor mensalmente no contracheque.
Os advogados públicos têm salários que variam entre R$ 15,7
mil (inicial) e R$ 20,4 mil (final), os maiores entre as carreiras do
Executivo, só ficando atrás da magistratura e do Ministério Público. O teto
seria o limite constitucional do funcionalismo, hoje em R$ 29,4 mil. Quem ocupa
cargo comissionado já tem salário maior. Atualmente, os honorários de sucumbência
pagos pela parte perdedora são incorporados ao caixa do Tesouro Nacional. Na
advocacia privada, ficam com os advogados do vencedor do processo.
A Casa Civil informou ao Correio que, independentemente do
mérito da questão, o governo entende que o assunto não deveria ser tratado no
CPC, mas em legislação específica de cada carreira da advocacia pública,
inclusive para assegurar o respeito à autonomia de cada unidade da Federação.
No CPC, os honorários passam a ser garantia também dos advogados dos estados e
dos municípios.
Sem sucesso
O governo vinha adiando a apreciação do dispositivo há seis
meses, por medo da derrota que se avizinhava. No penúltimo embate na Câmara, em
dezembro, teve que desistir da votação. Por ordem do Planalto, o presidente da
Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), retirou o destaque de pauta com a
promessa de que seria votado no dia seguinte, véspera do recesso de fim de ano.
Sabia que não haveria quórum.
O adiamento só serviu para fortalecer o movimento da
categoria que já vinha fazendo corpo a corpo com parlamentares desde outubro de
2013. Coordenado pelo procurador da Fazenda Nacional Paulo Renato Nardelli, o
grupo de 3 mil membros da AGU reunidos numa rede social, com apoio da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) e associações que representam a categoria,
convenceram a maior parte dos parlamentares.
Na sessão em que o governo foi derrotado, os líderes das
três maiores bancadas da Câmara — PT, PMDB e PP-Pros — recomendaram o voto
contra a proposta. O líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), chegou a
subir na tribuna quatro vezes, mas não conseguiu sequer adiar a matéria. Houve
rebelião de todos os lados.