Maria Clara Prates
Estado de Minas
- 29/03/2014
Medida pagou horas extras a ocupantes dos cargos e levou ao
desembolso de R$ 2,3 milhões em 15 dias
O Conselho Nacional de Justiça decidiu, por unanimidade,
cassar a Portaria nº 262/2012 do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG), que
autorizava o pagamento de horas extras a ocupantes de cargos em comissão. De
acordo com levantamento do próprio tribunal, somente com o pagamento do período
extraordinário de trabalho, foram desembolsados R$ 2,3 milhões em apenas 15
dias, no fim de 2012 e início de 2013. No período, alguns funcionários da
cúpula do tribunal receberam valores superiores a R$ 20 mil pelo trabalho fora
de hora. Os desembolsos foram noticiados com exclusividade pelo Estado de
Minas. Em seu voto, o ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal
Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), disse que a portaria era
“absolutamente ilegal” e seguia a “tendência de fazer generosidade com dinheiro
público, que cresce no país”.
O pagamento do benefício, cassado no dia 25, já estava
suspenso desde junho, por força de liminar da conselheira ministra Maria
Cristina Peduzzi, que considerou que “o pagamento indevido de parcelas a
servidores públicos tem o evidente potencial de causar danos de difícil
reparação ao erário”. A decisão foi motivada a partir de um procedimento de
controle administrativo (PCA), apresentado pelo advogado Paulo Gustavo de
Freitas Castro, com pedido de providência, uma vez que o pagamento desse tipo
de benefício contraria a jurisprudência do próprio CNJ. Aprovado integralmente,
o procedimento determina, ainda, o ressarcimento aos cofres públicos de valores
que foram pagos indevidamente durante o recesso de fim de ano e início de
janeiro.
O pedido de providência afirma que a portaria atentava
contra o artigo 19, parágrafo 1º, da Lei 8.112/1990, que determina que os
servidores comissionados se submetam ao regime de dedicação integral ao
serviço, podendo ser convocados sempre que houver interesse da administração
pública. “Os cargos em comissão são remunerados com retribuição específica,
compatível com as exigências do cargo e suficiente para compensar o regime de
integral dedicação”, diz a inicial do processo. O ministro Joaquim Barbosa
lembrou que a norma criada em Minas Gerais contraria até mesmo a resolução do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de 2008, que permitia o pagamento de extras
aos comissionados apenas no período eleitoral. “A lei diz que cargos
comissionados têm que trabalhar em regime integral. Portanto, essa portaria não
tem nenhuma razão de ser”, disse Barbosa.
Apuração
O procedimento, acatado pelo CNJ, pedia a apuração do
recebimento de extras pelos servidores Elizabeth Rezende Barra, diretora-geral
do TRE licenciada; a secretária de Gestão de Pessoas, Gessy Rodrigues Rosa; a
secretária de Orçamentos e Finanças, Maria Leonor Almeida Barbosa de Oliveira
Santos; e o secretário de Gestão Administrativa, Felipe Alexandre Santa Anna
Mucci Daniel, todos afastados de seus cargos por ordem do presidente do TRE,
desembargados Antônio Carlos Cruvinel, que também determinou a apuração para
verificar se houve abuso à corregedoria do tribunal. Em dezembro, a comissão
concluiu pela necessidade de “procedimento administrativo para o fim de
ressarcimento ao erário dos valores recebidos pelos servidores da secretaria do
tribunal”, o que não foi acatado pela presidência da Corte.
Levantamento do TRE mostrou que somente a então
diretora-geral, Elizabeth Barra, recebeu, pelo expediente compreendido entre 20
e 31 de dezembro e os dias 2 e 6 de janeiro, o valor de R$ 19.214,37, referentes
a 62 horas e 31 minutos de trabalho extra. O salário da diretora, considerando
direitos adquiridos e o cargo em comissão, chegou a R$ 29.537 e sofreu um
desconto de R$ 687,08 para não ultrapassar o teto do funcionalismo. No entanto,
como as horas extras não são incluídas no cálculo do teto, o vencimento bruto
de Elizabeth Barra em janeiro foi de R$ 62.311, considerando que ele foi
acrescido também de antecipação do 13º salário, de R$ 13.361, de acordo com
dados do próprio tribunal. Ou seja, duas vezes mais que o teto salarial dos
ministros do Supremo Tribunal Federal, que é de R$ 28.059 por mês.