Correio Braziliense
- 03/07/2018
No jogo entre Brasil e México, muitos funcionários públicos
que optaram por trabalhar deixaram o serviço de lado e assistiram ao jogo.
Especialistas criticam postura, que custa dinheiro aos cofres públicos
Quem passou pela Esplanada dos Ministérios ou em órgãos
públicos, na segunda-feira (2/7), no horário do jogo entre Brasil e México, se
espantou. Pouco movimento ou barulho, até que acontecia alguma jogada. Se o
México ameaçava a rede do goleiro Alisson, ocorria uma explosão de gritos e,
até, xingamentos. Nos gols do Brasil, comemoração. Eram os servidores que
assistiam à partida. O amor à camisa verde-amarela seria perfeito se os
funcionários não tivessem reivindicado e ganhado o direito do trabalhar para
não ter de compensar as horas de jogo.
Na maioria dos ministérios, as portas estavam fechadas ou
entreabertas. O pessoal da segurança as abria quando alguém se aproximava, mas
proibia fotos das portarias enfeitadas com tevês ligadas. Na
Controladoria-Geral da União (CGU), a informação foi a de que o expediente
começaria após as 14h. Até a principal agência do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS), da 502 Sul, estava fechada e permaneceu sem atendimento ao
cidadão até as 14h.
O governo tentou impor um procedimento linear, rechaçado
pela maioria. A Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público
Federal (Condsef) e o Sindicato Nacional dos Auditores e Técnicos de Finanças e
Controle (Unacon Sindical), entre outros, entraram na Justiça para dar às
categorias o direito de optar pela presença nas repartições. As queixas eram
contra a portaria do Ministério do Planejamento que estabelecia horário
especial e fechava as portas da administração pública durante os jogos do
Brasil. Os sindicatos exigiam respeito à escolha do servidor de trabalhar ou
não.
Quem paga o pato
Segundo economistas, os 635.731 servidores ativos da União
custam ao Tesouro R$ 544,4 bilhões por ano. Isso significa que apenas um dia de
pagamento de salários tem impacto de R$ 1,39 bilhão nos cofres da União. “Se
trabalham apenas meio expediente, já é um prejuízo para a sociedade de quase R$
700 milhões. E se vão à repartição, mas fingem que executam as tarefas, sem
efetivamente cumpri-las, o dano à economia é incalculável, porque entram na
conta gastos com energia, combustível e uso de máquinas e equipamentos, entre
outros”, contabilizou um especialista.
Em 4 de junho, a Portaria 143 estabeleceu que, nos dias de
jogos do Brasil pela manhã, o expediente começaria às 14h, e, quando as
partidas fossem à tarde, o período de trabalho terminaria às 13h. As horas não
trabalhadas em dias de meio expediente deveriam ser compensadas até 31 de
outubro. Em 9 de junho, líderes da Condsef e do Unacon reivindicaram que os
servidores que não quisessem desfrutar da Copa, pudessem trabalhar nos horários
de jogo, e se comprometeram em denunciar o descumprimento da medida.
Diante da pressão, o Planejamento editou nova portaria.
Dessa forma, os servidores puderam optar por assistir às partidas fora e
compensarem, ou continuar as atividades “regularmente nas repartições”, apontou
o ministério. O texto, entretanto, não especificou a punição, em caso de
desobediência, como observada durante a partida Brasil x México. A falta de
previsão legal deu lugar ao jogo de empurra.
Especialistas em cobrar direitos, as entidades sindicais não
têm estratégias com propósito de fazer cumprir os deveres, como fica evidente
no discurso de Gilberto Cordeiro, da Condsef. “Deixamos claro que o governo não
poderia impor um horário. É nossa função. Agora, se a pessoa não cumpre o que
promete e fica vendo tevê, cabe à chefia fazer a correção necessária. Só
podemos intervir, se tivermos provas”, disse.
Rudinei Marques, presidente do Unacon, ponderou que é
preciso saber “quem é quem”. Segundo
ele, no sexto andar do prédio da CGU há um espaço de convivência. “Quem está
lá, provavelmente, não está com o ponto aberto. Não podemos saber se quem
gritou na hora do gol é servidor ou terceirizado”, alegou. Até a última
atualização desta matéria, o Ministério do Planejamento não havia informado que
medida tomará para coibir abusos.
Por Vera Batista