Jornal Hora do Povo
- 20/06/2014
Ações da AGU foram aceitas pelo STJ proibindo a greve dos
servidores das universidades federais. O governo se nega a negociar as
reivindicações
Em greve há mais de 90 dias, professores e técnicos
administrativos de Institutos de Ensino e servidores das Universidades Federais
tiveram o seu direito constitucional à greve cassado após ação do governo
federal no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em mais uma tentativa de judicializar as greves, duas ações
movidas pela Advocacia-Geral da União (AGU), órgão subordinado ao governo
federal, foram aceitas pelo STJ contra os movimentos grevistas. Sob pena de
estratosférica multa diária de até R$ 200 mil por ordem descumprida, as
paralisações foram julgadas ilegais e foi ordenado o retorno dos servidores às
suas funções. Os sindicatos da categoria afirmaram que recorreram das decisões.
Esta não é a primeira vez que o governo federal tenta, por
via judicial, suprimir o direito de greve dos trabalhadores. Em maio deste ano,
ás vésperas do início da Copa do Mundo, o STJ acatou outro pedido da AGU com o
objetivo de proibir uma greve dos policiais federais. Ou seja, além de praticar
uma política de arrocho salarial e se negar a negociar com os servidores, o
governo Dilma desvirtua o artigo 9° da Constituição Federal ao proibir as
paralisações dos trabalhadores.
Ao todo, servidores de 19 estados abrangendo 163
instituições estão em greve.
A AGU argumenta que a greve prejudica cerca de um milhão de
estudantes em todo o país e que os serviços essenciais prestados pelas
universidades e institutos estavam comprometidos. Por esse motivo, requereu a
suspensão das paralisações e a aplicação de multas caso as ordens fossem
descumpridas.
“A nossa luta ganha um novo e importante ponto de pauta: a
defesa do direito constitucional de greve”, “greve é direito, não se negocia”,
aponta o Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica,
Profissional e Tecnológica (Sinasefe).
REIVINDICAÇÕES
De acordo com a Federação de Sindicatos dos Trabalhadores
Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Públicas do Brasil (FASUBRA)
em 2012, após a greve que durou meses, os servidores federais de todas as
categorias receberam a proposta de reajuste do governo, que consistia em
aumento de 15% dividido em três anos.
Na ocasião os servidores encerraram a greve, mas não as
negociações, uma vez que aumento de cerca de 5% por ano não cobriria as perdas
salariais ou a inflação do período. Como esperado, para este ano o reajuste
concedido ao funcionalismo, de 5,2%, não cobriu a inflação oficial de 2013, que
ficou em 5,91%.
Segundo a Fasubra, eles reivindicam também o aprimoramento
da carreira, com piso inicial de três salários mínimos; aproveitamento de
disciplinas de pós-graduação para pleitear progressão por capacitação
profissional; turnos contínuos com jornada de trabalho de 30 horas semanais,
sem redução salarial, com intuito de manter a universidade funcionando nos
períodos da manhã, tarde e noite; dentre outros.
Segundo a AGU, os pedidos de suspensão têm por base acordo
firmado judicialmente em 2012, para reestruturação remuneratória, entre o
Governo Federal e os servidores públicos federais, incluindo os docentes e
técnicos administrativos das instituições de ensino superior federais, o
acordo, na verdade, mantinha um arrocho salarial aos servidores.
Os procuradores federais ajuizaram as ações contra os
sindicatos sustentando que a paralisação era abusiva considerando o acordo em
vigor.
Porém o Sinasefe, que representa os servidores das escolas
federais, como o Colégio Pedro II no Rio de Janeiro, e Institutos Federais de
Educação Ciência e Tecnologia, nega a versão apresentada pela AGU, sustentada
pelo Ministério da Educação.
O sindicato explica que a liminar apresentada pela AGU se
baseia em “uma série de inverdades (que o MEC reproduz em seu site), tendo como
fundamento principal a vigência de um acordo assinado em 2012 por uma entidade
(Proifes) que não nos representa, e que, inclusive, a própria justiça nega a
sua representatividade. Vale ressaltar que esse acordo não foi assinado por
Andes-SN e SINASEFE por representar um óbvio retrocesso a carreira docente, e
portanto não há descumprimento de nenhum acordo”.
O Sinasefe ainda ressalta o papel retrógrado que o governo
federal vem adotando sobre os direitos dos trabalhadores com políticas de
cercear o direito a greve via judicial e sufocar os sindicatos com multas
abusivas. “em vez de reconhecer a relevância do nosso trabalho e da nossa luta
por uma educação pública, gratuita, laica e sobretudo de qualidade para os
nossos estudantes, negociando nossa pauta de reivindicações, o governo prefere
atacar nossa greve ferindo os direitos constitucionais de greve e de autonomia
das nossas instituições”, destacou o sindicato.
No último dia 17, uma reunião com representantes de 74
entidades sindicais, aprovou um indicativo para que os servidores em greve
voltem ao trabalho. A decisão final, no entanto, caberá às bases regionais dos
sindicatos espalhadas pelo país.
RESTRIÇÃO À GREVE
As recorrentes decisões judiciais contra o direito de greve
e negociações coletivas no Brasil foram alvo de criticas das centrais sindicais
na Organização Internacional do Trabalho (OIT). CUT, Força Sindical, CGTB, CTB,
Nova Central e UGT apresentaram uma reclamação ao Departamento de Normas da
Organização Internacional do Trabalho (OIT) apontando que o Estado brasileiro
viola o direito à livre negociação coletiva.
Eles destacam as decisões tomadas pelos Tribunais Regionais
e Superior do Trabalho (TRTs e TST) e iniciativas do Ministério Público do
Trabalho (MPT), sobre as contribuições e o exercício do direito de greve como
ocorrido no caso da greve do Metrô de São Paulo e servidores federais.
As centrais pedem intermediação da OIT, para buscar “uma
solução juridicamente sustentável e adequada às diretrizes” da organização. O
documento foi apresentado durante a 103ª Conferência Internacional do Trabalho,
em Genebra.
O Estado brasileiro “vem, partindo do precedente judicial do
Tribunal Superior do Trabalho, acionado por intermédio de representantes do
Ministério Público do Trabalho”, promovendo “atos de ingerências nos
instrumentos coletivos (convenções e acordos coletivos de trabalho) firmados
por trabalhadores e empregadores”.
Outro método utilizado para por fim às greves é o
estabelecimento de multas milionárias que tem como objetivo quebrar os
sindicatos organizados. No caso da greve do Metrô de São Paulo, as multas aos
sindicatos dos Metroviários e Engenheiros chegou a R$ 3,4 milhões, contando
ainda com o bloqueio das contas das entidades até que as multas fossem sanadas.
Até mesmo juízes tem se posicionado contra a judicialização
do direito à greve. A Associação Juízes para a Democracia, em nota apoiando a
greve dos metroviários paulistas ressaltou o papel antissindical e
anticons-titucional adotado pela Justiça e pelo governo federal.
A entidade ressalta que “a greve é um direito que consiste
justamente na possibilidade de causar prejuízos a outrem, em especial ao
empregador, mas também de gerar perturbação, incômodos e transtornos para os
usuários de serviços públicos”, além de relembrar que os trabalhadores podem
“realizar piquetes ofende o art. 6º da Lei n. 7.783/89, segundo o qual “são
assegurados aos grevistas, dentre outros direitos: I – o emprego de meios
pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à
greve”.