Veja - 14/04/2015
União pagou R$ 1,2 bi em pensões indevidas Relatório da CGU
mostra fraudes como homens que estavam cadastrados como 'filhas solteiras' e
servidores sem filhos que recebiam auxílio-creche
Apesar do ajuste fiscal para "salvar" as contas
públicas, o governo federal pagou nos últimos quatro anos pensões indevidas a
supostas "filhas solteiras" de servidores que eram, na prática,
casadas ou até mesmo do sexo masculino. Bancou também benefícios para
"filhos" de funcionários públicos nascidos mais de um ano após a
morte dos pais. E houve quem recebesse auxílio-creche sem ter, nos registros
oficiais, nenhuma criança em casa.
Os exemplos constam de uma extensa lista de irregularidades
detectadas pela Controladoria-Geral da União (CGU) na folha de pagamentos da
administração direta federal, de autarquias e fundações. Por ano, a folha de
pagamentos consome 129 bilhões de reais para remunerar 1,2 milhão de
trabalhadores da ativa, aposentados e pensionistas. Na maioria dos casos, a CGU
mandou corrigir o que chama de "inconsistências" causadoras de
prejuízo, logo que elas foram descobertas. Com os cortes, houve economia de 1,2
bilhão de reais até dezembro do ano passado, conforme relatório do órgão.
Na relação também estão servidores que conseguiram reajustes
superiores a 200% num período de três anos; além de outros que extrapolam o
teto do funcionalismo público. Há ainda inúmeros outros casos que desafiam o
tempo e a lógica. Por exemplo, "filho" ganhando pensão de pai mais
jovem.
As conclusões foram obtidas após o cruzamento de informações
da folha de pagamentos de 259 órgãos com dados de outros sistemas oficiais. O
trabalho foi feito em períodos de 2011, 2012, 2013 e 2014.
Para o governo, a economia é considerada simbólica diante da
necessidade de cortes de gastos. Recentemente, o Ministério do Planejamento
anunciou que vai cessar até a impressão de contracheques do funcionalismo. Tudo
para não gastar 40 milhões de reais ao ano com tinta e papel.
O que foi pago de forma irregular até o pente-fino da CGU
não foi calculado, tampouco será recuperado. É que, salvo exceções, parte-se do
princípio de que os servidores receberam por erro dos departamentos de recursos
humanos, e não de má fé. Segundo a CGU, os tribunais já firmaram jurisprudência
a respeito, entendendo que não cabe devolução nesses casos.
"De maneira geral, o relatório não trata de fraudes. O
trabalho detectou oportunidades de correção", afirma o secretário federal
de Controle Interno, Francisco Eduardo de Holanda Bessa, explicando que, só em
casos de golpe, abre-se um processo administrativo para punir o servidor
envolvido e buscar o ressarcimento devido.
Os auditores descobriram, por exemplo, 153 casos em que
funcionários mudaram as próprias informações nos sistemas de recursos humanos,
dando margem a aumento de salário. Trata-se, no entanto, de uma situação rara
entre as 330.000 falhas detectadas.
Algumas são mais frequentes, como quando o empregador faz
descontos menores que os devidos no contracheque. Servidores e pensionistas que
tiveram parcelas de devolução ao erário interrompidas ou mesmo alteradas
representaram, nos períodos investigados, um prejuízo de 253 milhões de reais
aos cofres públicos. Eram 12.000 exemplos.
Chama a atenção também o fato de a auditoria citar ao menos
260 casos em que "filhas solteiras" de servidores mortos, maiores de
idade, recebiam pensões, mas tinham estado civil distinto. Dessas, 62 eram
casadas. Outras 41 pensionistas, com direito ao mesmo benefício, em verdade
eram homens e seis estavam registradas com "sexo inexistente". Os
nomes dos envolvidos foram mantidos em sigilo pelo órgão.
"As informações foram enviadas aos gestores. Contudo, a
CGU deve preservá-las, já que indicam problemas que já foram resolvidos e
outros que ainda estão sob monitoramento", informam os responsáveis pela
auditoria.
Ao menos 67 "filhos" de servidores recebiam
pensão, mas nasceram mais de um ano após a morte do instituidor do benefício
(pai ou mãe). Em mais 232 casos, os "filhos" eram mais velhos que o
pai ou a mãe.
Um grupo de dezenove pessoas ganhava acima do teto do
funcionalismo público, hoje em 33.700 reais . E mais 3.390 tiveram reajustes
generosos, que alcançaram mais de 200% entre 2008 e 2011. A CGU diz que o
trabalho continuará sendo feito de tempos em tempos, para cortar mais gastos.
(Com Estadão Conteúdo)