BSPF - 08/12/2015
Os alvos da ação são cinco concorrentes a diplomata que se
inscreveram pelo sistema de cotas
O Ministério Público Federal (MPF) quer impedir que cinco
candidatos aprovados na terceira e última fase do concurso para a carreira de
diplomata tomem posse nas vagas reservadas a negros. Para isso, apresentou à
Justiça nesta segunda-feira (7) uma ação civil pública contra os
concorrentes suspeitos de terem fraudado
a autodeclaração racial. Eles se inscreveram para concorrer às seis vagas
destinadas ao sistema de cotas, previsto na Lei 12.990/14. No entanto, o MPF
constatou que nenhum deles apresenta cor de pele escura, própria de pretos ou
pardos, e nem mesmo traços faciais/cabelos característicos de pessoas negras. A
medida pede, ainda, que a Justiça obrigue a União – por meio do Ministério das
Relações Exteriores (MRE) – a tomar providências para garantir a regularidade
nas nomeações.
A ação é resultado de um inquérito civil instaurado em
agosto deste ano para apurar irregularidades no certame. Informado, por meio de
duas representações, de que o edital do concurso era omisso em relação à
previsão de mecanismos de verificação da autodeclaração e de que existia a
participação fraudulenta de candidatos brancos no sistema de cotas, o
Ministério Público tentou solucionar a questão extrajudicialmente. Ainda na
primeira fase do certame, enviou uma recomendação ao Itamaraty para que fosse
instaurado procedimento administrativo com o objetivo de investigar as
suspeitas de declarações falsa. No entanto, órgão alegou ser impossível
realizar a avaliação das declarações e prosseguiu com as etapas do concurso.
Considerando que o Itamaraty não demonstrou que adotaria as
medidas necessárias para coibir as fraudes noticiadas, o MPF optou por levar a
questão à Justiça. “A conduta omissiva do Itamaraty representa grave risco aos
direitos dos candidatos negros que serão excluídos com a homologação do
concurso e com a convocação para participação no Curso de Formação do Instituto
Rio Branco”, justificam os procuradores da República Ana Carolina Alves Araújo
Roman, Lucinana Loureiro Oliveira e Felipe Fritz Braga, que assinam a ação.
Urgência
Conforme previsto no edital, o resultado final deve ser
divulgado em 14 de dezembro, quando começará a correr o prazo de validade do
concurso, que é de apenas 30 dias. Tendo em vista que o certame expira em pouco
tempo e que – tão logo seja publicado o resultado final deve ser feita
convocação única dos aprovados para que iniciem o curso de formação –, o Ministério
Público pede que a ação seja analisada com urgência. “A demora pode excluir de
forma permanente e irreversível os candidatos negros preteridos pela nomeação e
a posse de candidato branco, ceifando de modo definitivo o direito desses ao
ingresso legítimo na carreira de diplomata”, explicam os procuradores. O
impedimento de posse dos cinco réus pela Justiça é visto pelo MPF como uma
garantia de que outros concorrentes, realmente negros, poderão ocupar as vagas
destinadas para o sistema de cotas raciais.
Fundamentação
A identificação dos concorrentes que supostamente fraudaram
a autodeclaração foi feita pelo MPF a partir de fotografias. As imagens foram
obtidas diretamente de bancos de dados oficiais e também de redes sociais por
meio dos endereços de e-mail fornecidos pelos próprios concorrentes no momento
da inscrição no certame. Da análise das fotos, os procuradores concluíram que
os candidatos não têm a aparência física das pessoas negras. “Não se imagina
que possam, na interação social, considerado o comportamento habitual da
sociedade brasileira, ser alvos de preconceito e discriminação raciais em razão
da cor da pele que ostentam”.
Ainda na ação, o Ministério Público argumenta que o Supremo
Tribunal Federal (STF) já julgou constitucional a análise dos traços
fisionômicos como critério adequado para distinguir negros e não negros. “A
razão essencial que justifica a adoção desse critério – aparência física e
análise fenotípica – reside no fato de serem justamente as características
físicas próprias do indivíduo negro a força motriz do preconceito racial no
seio da sociedade brasileira”, argumentou o STF à época do julgamento.
Em vigor desde o ao passado, a Lei 12.990 instituiu a
reserva de 20% das postos oferecidos em concursos públicos para candidatos
pretos ou pardos e estipulou a autodeclaração como critério para garantir as
candidaturas. A norma também prevê que, em casos de confirmação de fraude, o
candidato deverá ser eliminado do certame ou ter sua nomeação anulada. Para o
MPF, caso não sejam tomadas providências em relação ao atual concurso, além de
contrariar a legislação, haverá duplo descumprimento – tanto pelos candidatos
quanto pelo Estado – de objetivos fundamentais previstos na Constituição, como
o de construção de uma sociedade solidária; de redução das desigualdades
sociais e de promoção do bem de todos sem preconceito de raças.
00711.4259.2015.4.01.3400
Com informações da Assessoria de Imprensa do MPF/DF