Marcela Fernandes
Correio Braziliense
- 25/01/2016
Mesmo com as recomendações do Ministério Público Federal
(MPF) para dar um basta em casos de nepotismo no Legislativo, a prática pode
continuar dentro do Senado Federal. Dois dos três senadores que receberam, na
última semana, solicitações de exoneração de comissionados resistem ao
entendimento do MPF. Eles aguardam análises técnicas para decidir o destino dos
servidores.
O senador Telmário Mota (PDT-RR) espera parecer da consultoria
jurídica da Casa sobre a contratação de Telmar Mota de Oliveira Neto,
sobrinho-neto do parlamentar. Para atuar como motorista em Roraima, ele recebe
salário de R$ 3.159,75 e R$ 835,06 em benefícios. Já o departamento jurídico do
gabinete do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) analisa a situação de Roseanne
Flexa Medeiros, prima do parlamentar. Comissionada admitida em 2009, ela recebe
salário de R$ 7.353,14 e R$ 835,06 em benefícios. Os senadores alegam que os
comissionados não se enquadram na súmula 13 do Supremo Tribunal Federal (STF).
O texto classifica como nepotismo casos de parente até terceiro grau. Já o MPF
argumenta não existirem "impedimentos à determinação do quarto grau de
parentes para se aferir ocorrência de
nepotismo, uma vez que a súmula do Supremo Tribunal Federal almeja
impedir de forma absoluta essa prática". Nas recomendações, a procuradora
Márcia Brandão Zollinger indica que acionará a Justiça, caso o Legislativo
divirja do MPF.
"Não sendo atendida a recomendação, o Ministério Público
Federal desde logo informa que proporá ação civil pública com vistas a buscar
provimento jurisdicional adequado", diz o texto.
Os dois casos são parte de inquérito civil instaurado em
maio de 2015 a partir de reportagens do Correio Braziliense. Em outros casos
levantados por meio do cruzamento de sobrenomes de funcionários e de
parlamentares, as investigações do MPF não conseguiram comprovar
irregularidades. Dos 10 casos encontrados na Câmara dos Deputados, pelo menos
cinco continuam nas mesmas funções. Além de Telmário Mota e Flexa Ribeiro, as
presidências do Senado e da Câmara e o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PA)
também receberam recomendações do MPF para tomar providências sobre a prática.
O tucano informou que acatará o pedido do MPF.
Ele emprega o primo Flávio
Romero Moura da Cunha Lima como chefe de gabinete. Analista legislativo admitido
como efetivo desde 1982, Flávio recebe R$ 4.749,84 adicionais pela função
comissionada. AnáliseA Presidência do Senado encaminhou em 19 de janeiro o
documento para a advocacia da Casa e tem até 15 de fevereiro para se
manifestar. Antes das contratações serem efetivadas, o Senado entendeu não
haver irregularidades. A nomeação de servidores para cargos comissionados
considera a declaração de parentesco apresentada pelo indicado e é
regulamentada pelo Ato da Comissão Diretora nº 5, de 2011, que aplica o conteúdo
do Decreto nº 7.203, de 2010, referente à proibição do nepotismo na
administração pública federal. De acordo com as normas, cabe à Diretoria-Geral
"solucionar casos omissos ou que suscitem dúvida".
Para o especialista
em administração pública José Matias-Pereira, professor da Universidade de
Brasília (UnB), o MPF teve uma interpretação adequada da súmula do STF. "O
que se tenta evitar com a decisão é exatamente acabar com o que chamamos de
patrimonialismo disfarçado. Se você tem um parente de terceiro ou quarto grau,
fica claro que está enquadrado no nepotismo", afirma. Matias classifica a
postura dos senadores como tentativa de protelar a discussão. Já Marlon Reis,
cofundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), defende uma
mudança legal para deixar claro quais casos são irregulares.
Como projeto de
lei há uma dificuldade maior - uma vez que depende do Legislativo - a outra
solução seria por uma reedição da súmula nº 13. "O Supremo tem tido, ao
longo do tempo, um aprofundamento das reflexões sobre esse tema. Não será
surpreendente se o Supremo vier a rever essa súmula", afirma. "O que
se tenta evitar com a decisão é exatamente acabar com o que chamamos de
patrimonialismo disfarçado. Se você tem um parente de terceiro ou quarto grau,
fica claro que está enquadrado no nepotismo" José Matias-Pereira,
especialista em administração pública.