Vera Batista
Correio Braziliense
- 21/04/2016
De um lado, uma presidente enfraquecida, sem nove ministros
titulares. Do outro, um vice com grande possibilidade de assumir o governo.
Esse vácuo de poder deixa o serviço praticamente paralisado. Entre os
comissionados, há o receio do desemprego
O Brasil vive um período de ressaca. A incerteza que assola
a economia do país entre a aprovação do impeachment da presidente Dilma
Rousseff, pela Câmara dos Deputados, e a continuação do processo no Senado,
também se espalha pela Esplanada. Após as declarações do presidente da Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de que nenhum projeto será tocado até que o comandante
do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), avance com a cassação política do atual
mandato, a indolência tomou conta do serviço público. Nove ministérios estão sem
titulares oficiais. Sem a cabeça, o corpo deixou de funcionar. Poucos
trabalham. Os gestores não ousam tomar decisões importantes pelo temor de
represálias.
"A Esplanada está anestesiada, esperando mudança. Nada
anda. O Brasil está funcionando burocraticamente, porque, é claro, alguém tem
que pagar as contas de luz, telefone e os salários. De resto, quem vai assumir
despesas se não sabe sequer se continuará no posto e, se continuar, poderá ser
chamado a se explicar?", questionou Gil Castello Branco, secretário-geral
da Associação Contas Abertas. Além da insegurança, há outro fator de
excepcional gravidade que tende a piorar: a falta de recursos. "O quadro é
assustador. Quem vencer a batalha, Temer ou Dilma, terá que aprovar a CPMF,
fazer a desvinculação ao salário mínimo (nos programas sociais) e desengessar o
Orçamento. Com esse aperto, é difícil encontrar um corajoso para usar a
caneta", destacou Castello Branco.
Se a situação é difícil para os concursados, que desfrutam
do benefício da estabilidade, entre aqueles que estão a serviço do governo sem
vínculo de espécie alguma, o pavor está estampado na testa. Provavelmente
engrossarão a fila do desemprego, que já está em 10,2%, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Existem 100.269 ocupantes de
cargos, funções e gratificações no país. Desses, 6.604, ou 6,6% do total, não
são concursados. Segundo informações do Ministério do Planejamento, grande
parte tem Direção e Assessoramento Superior (DAS). "No Executivo, são
21.795 cargos DAS. Desse total, 16.115 são concursados, uma maioria de 78,4%.
Os sem vínculo são 5.680, o que corresponde a 43% dos ocupantes."
A conjuntura é inusitada, no entender de políticos
experientes. Apesar de o PMDB ter ainda indicados em ação - mesmo com a entrega
de sete pastas e 600 cargos no rompimento com Dilma -, o troca-troca não vai
ser um por um, ou seja, se Temer seguir à risca o que prometeu, acabará pelo
menos com metade dos cargos, para deixar a máquina mais enxuta. "Ele
(Temer) provavelmente fará novo contingenciamento das despesas obrigatórias. Um
corte muito mais radical para acertar de vez as contas públicas", revelou
um político ligado a Temer, que não quis se identificar.
Os nomes que estão sendo ventilados para compor a equipe
econômica de Michel Temer trouxeram de volta um sentimento que os servidores
federais desejariam esquecer: o pavor de que as reivindicações sequer sejam
consideradas e de que fiquem mais oito anos sem reajuste, como ocorreu entre
1995 e 2003. Se durante a era Fernando Henrique Cardoso, o governo, por medida
provisória ou projeto de lei, suprimiu, segundo o funcionalismo, mais de 50
direitos, vantagens ou garantias do servidor, o que se espera, agora, é um
quadro de terra arrasada e de total falta de diálogo.
"Pelo passado recente que tivemos com algumas das
figuras, o caminho é escuro. Essas pessoas não têm tradição de diálogo com o
movimento sindical", lembrou Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da
Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef).
Ele quer evitar que o resultado dos tratos da difícil negociação da Campanha
Salarial de 2015 fique congelado. Para decidir os próximos passos, o Fórum das
Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasef) vai se reunir na
terça-feira.
Para Daro Piffer, presidente do Sindicato Nacional dos
Funcionários do Banco Central (Sinal), do ponto de vista do atendimento ao
cidadão, o serviço da autoridade monetária tende a piorar. "Se ele (Temer)
está dizendo que vai colocar banqueiros para tomar conta do Banco Central, está
sinalizando que o BC vai fazer o que interessa ao mercado. E a lógica do
mercado atende somente ao capital", frisou. Piffer concorda que a vocação
da possível futura equipe não é de diálogo. "No entanto, acho que isso
pode mudar. Ninguém quer enfrentar uma greve geral já no início da
gestão", observou. Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional
Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), contou que o desespero
das categorias aumentou porque, diante das mudanças na Esplanada, não se
vislumbra possibilidade de envio a tempo dos projetos de lei que autorizam os
aumentos acordados com os servidores.
"Até 22 de maio, tem que ser enviada ao Congresso a
programação das receitas orçamentárias, com os projetos de lei. Se isso não
acontecer, dificilmente os contracheques de agosto virão com aumento",
observou Marques. Outra preocupação é com a atitude que Temer em relação aos
órgãos de controle. "O pessoal do Tribunal de Contas da União, Ministério
Público, Polícia Federal e Controladoria-Geral da União teme pela metodologia
de aplicação dos recursos públicos no combate à corrupção. Estamos, inclusive,
preparando uma nota conjunta para externar nossa angústia", salientou.