Agência Brasil
- 02/08/2016
O Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão
estabeleceu regras de verificação da autodeclaração prestada por candidatos
negros em concursos públicos. A partir de agora, os candidatos que se
inscreverem nas vagas destinadas a cotistas deverão se apresentar pessoalmente
a uma comissão designada para tal fim. As orientações para os órgãos e
entidades federais foram publicadas na edição de hoje (2) Diário Oficial da
União.
As novas regras regulamentam a Lei nº 12.990, de 2014, que
reserva aos negros 20% das vagas oferecidas em concursos públicos. Podem
concorrer a essas vagas aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato
da inscrição no concurso público.
De acordo com a norma, os editais devem prever e detalhar os
métodos de verificação da veracidade da autodeclaração, com a indicação de uma
comissão que terá seus membros distribuídos por gênero, cor e naturalidade. As
formas e critérios de verificação levarão em conta apenas os aspectos
fenotípicos do candidato, que são suas características físicas, e não a
ascendência.
Segundo o diretor executivo da organização não governamental
Educafro, Frei David Santos, entre os pretos não há problema para definir
cotas. O problema está na hora de definir entre os três grupos de pardos: o
pardo-preto, o pardo-pardo e o pardo-branco.
“Todo o problema está no pardo-branco, porque ele tem poucos
traços fenotípicos do povo negro e usa a genotipia [genética/ascendência] para
usurpar um beneficio que não lhe pertence”, disse.
Frei David explicou que os dois últimos grupos [pardo-pardo
e pardo-branco] não são alvo dos processos de exclusão.
“Quando a polícia faz uma revista em pessoas que passam na
rua ou entra em um ônibus, ela vai diretamente em quem julga negro: preto ou
pardo-preto. Nunca vai em um pardo-pardo ou pardo-branco. Das várias vezes que
passei por revista, nunca vi um pardo-branco reivindicar o direito de ser
revistado. Agora é para ter benefício?”, criticou.
Para o diretor da Educafro, a questão das regras de
verificação ainda será alvo de muita polêmica, mas que será positivo.
“Entendemos que o Brasil passa por um momento especial. Estamos discutindo
fortemente um elemento da identidade nacional que nunca foi discutido. Quando é
para tornar o Brasil um país mais igual, há omissão da classe dominante. Nós
precisamos entender que o Brasil só vai ser melhor quando pretos e pardos
tiverem oportunidades reais no cenário nacional”, destacou.
Frei David disse ainda que é fundamental que as comissões
que farão as averiguações tenham um treinamento, porque o olhar das pessoas
varia muito conforme suas definições pessoais. Segundo ele, o Ministério do
Planejamento já deu dois treinamentos do tipo recentemente. “Conclamamos que
multipliquem treinamentos para as comissões do Brasil inteiro.”
Fraudes
A verificação da autodeclaração deve acontecer antes da
homologação do resultado final do concurso público. Caso se verifique que a
autodeclaração é falsa, o candidato será eliminado do concurso, sem outras
sanções. Haverá, no entanto, a possibilidade de recurso para candidatos não
considerados pretos ou pardos após decisão da comissão.
Conforme Frei David, além de ser eliminado da seleção, o
candidato que prestar a declaração falsa “merece ser processado imediatamente
por falsidade ideológica”. “Quando não se encaminha o fraudador para a polícia,
percebemos que ainda não está sendo levado a sério a identidade do povo
brasileiro.” Acrescentou que os movimentos organizados pedirão que seja criada
também uma comissão para avaliar a aplicação dessa orientação normativa.
Os concursos públicos que estão em andamento e que não
tiverem previsão de verificação da autodeclaração deverão ter seus editais
retificados para atender às novas regras. Segundo o diretor da Educafro, é
necessário avançar mais e que governos estaduais e municipais e universidades
públicas também tenham regras mais claras sobre as cotas.