Consultor Jurídico
- 10/05/2017
Ao propor súmula vinculante para acabar com o “reajuste de
13,23%”, o ministro Gilmar Mendes tenta indiretamente declarar inconstitucional
a lei que autorizou o aumento. É o que defende o advogado Ibaneis Rocha,
ex-presidente da seccional do Distrito Federal da OAB e advogado de sindicatos
de servidores do Judiciário e do Legislativo, que brigam pelo reajuste na
Justiça.
O chamado “reajuste de 13,23%” é uma construção judicial.
Teve origem na vantagem pecuniária individual (VPI), criada em 2003 pelo
governo federal. Era o pagamento de R$ 59,87 a todos os servidores públicos
federais. Mas seguidas decisões da Justiça Federal vêm dizendo que a verba, na
verdade, tem natureza de reajuste geral, e não de gratificação. E ficou
determinado que o reajuste deveria ser o equivalente à fração que a VPI
representa no menor salário do funcionalismo. E chegou-se à cifra de 13,23%.
Em 2014, a 2ª Turma do Supremo disse que a concessão do
reajuste pelo Judiciário, sem previsão legal, é inconstitucional. Aplicou a
Súmula Vinculante 37, que proíbe a concessão de aumento pela Justiça com base
no princípio da isonomia. O relator era o ministro Gilmar Mendes. De lá para
cá, diz, mesmo com diversos precedentes do Supremo reafirmando a
inconstitucionalidade do “reajuste de 13,23%”, o Judiciário continua concedendo
o aumento por meio de decisões. E por isso a proposta de súmula vinculante.
A proposta de verbete do ministro é Gilmar é a seguinte: “É
inconstitucional a concessão, por decisão administrativa ou judicial, do
chamado ‘reajuste de 13,23%’ aos servidores públicos federais, ante a falta de
fundamento legal na Lei 10.698/2003 e na Lei 13.317/2016”.
Mas, de acordo com Ibaneis Rocha, a Lei 13.317/16 encerrou a
discussão. A Lei 10.698/03, de fato, criou uma gratificação, diz o advogado.
Mas o dispositivo de 2016 estabeleceu, no artigo 6º, que a VPI “e outras
vantagens que tenham por origem a citada vantagem concedidas por decisão
administrativa ou judicial (...) ficam absorvidas”. “Não há como uma súmula
vinculante declarar a inconstitucionalidade de uma lei sem que haja ação de
controle ajuizada”, explica Ibaneis.
Milita em favor de seus argumentos, diz, o fato de a lei ter
se originado num projeto de lei de autoria do presidente do Supremo à época, o
ministro Ricardo Lewandowski. O projeto foi o resultado de um acordo do
ministro com os servidores do Judiciário para evitar uma greve, mas conceder
aumento salarial menor que o exigido. Ibaneis é o advogado do SindiJus,
sindicato que representa os funcionários do Judiciário federal.
O artigo foi inserido no projeto “para viabilizar a
negociação da presente proposta”, diz Lewandowski, na justificativa ao projeto
de lei. O projeto de lei foi assinado por todos os presidentes do Poder
Judiciário da União da época: ministro Dias Toffoli, do Tribunal Superior
Eleitoral; ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho
da Justiça Federal; ministro Barros Levenhagen, presidente do Tribunal Superior
do Trabalho; ministro William de Oliveira Barros, presidente do Superior
Tribunal Militar; e desembargador Getúlio de Moraes Oliveira, presidente do
Tribunal de Justiça do DF.
A Advocacia-Geral da União também se posicionou a favor da
conversão da VPI em aumento — embora seja a União a autora de todas as
reclamações ao Supremo contra o “reajuste de 13,23%”. No parecer que enviou à
Casa Civil para instruir a Presidência da República sobre a sanção da lei, a
AGU afirmou que “a mera possibilidade” de o artigo 6º da lei ser interpretado
como o reconhecimento, pela União, da VPI como aumento “não justifica o veto ao
dispositivo”.
Hoje, o Conselho Nacional de Justiça discute um procedimento
administrativo para regulamentar o pagamento da verba. Caso o pagamento seja
feito nos termos dos pedidos pelos tribunais, a União gastará R$ 1,3 bilhão
apenas em relação às verbas referentes a 2016.
No dia 3 de maio, o Tribunal de Contas da União negou aos
servidores da corte a transformação da VPI em reajuste geral. O argumento foi o
de que o Supremo já havia rejeitado a tese diversas vezes, conforme ficou
registrado no voto do relator, ministro Bruno Dantas.
Por Pedro Canário editor da revista Consultor Jurídico.