Consultor Jurídico
- 13/11/2017
O governo federal anunciou as novas metas fiscais para a
adequação dos gastos públicos à situação fiscal do país, dentre as quais está a
postergação, por 12 meses, dos reajustes concedidos para algumas carreiras de
servidores federais. Diante disso, é relevante a discussão acerca da legalidade
do anunciado adiamento dos reajustes salariais em função das limitações
trazidas pela Emenda Constitucional (EC) 95/2016, a qual instituiu o chamado
“Novo Regime Fiscal”.
A EC 95 limitou o aumento dos gastos públicos à inflação
acumulada no ano anterior, calculada pelo Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA), ou por outro índice que venha a substituí-lo. O limite
se refere às despesas totais. Dessa forma, desde que mantidos os demais gastos
no mesmo patamar de crescimento, não há qualquer violação ao teto de aumento de
despesas estipulado a partir do “Novo Regime Fiscal” em decorrência da
concessão de reajustes já previstos aos servidores públicos.
É preciso ficar claro que os reajustes já concedidos foram
definidos por lei, cujo projeto previu que seus impactos financeiros fossem
incorporados nas respectivas leis orçamentárias de cada exercício. Embora ainda
não se tenha efetuado o pagamento, pois essa majoração remuneratória está
prevista para ocorrer gradualmente, tal se incorporou ao patrimônio dos
servidores.
Por isso, essa alteração salarial configura um direito
adquirido, instituto que está atrelado ao princípio da segurança jurídica, os
quais são de observância obrigatória por todos os atos do Poder Público. O
direito adquirido ganha contornos de garantia fundamental do indivíduo. Com
isso, por se tratar de cláusula pétrea, nenhuma outra espécie normativa pode
violá-lo, ainda que seja uma Emenda à Constituição.
Outro aspecto que deve ser observado é que, para a gestão
dos recursos orçamentários, é necessária uma análise concomitante da
Constituição da República e da Lei Complementar 101/2000 (Lei de
Responsabilidade Fiscal). A LRF prevê que, se a despesa total com o pessoal
ultrapassar os limites previstos na Lei, devem ser observadas conjuntamente as
medidas de contenção de gastos trazidas pelo artigo 22 da norma, e as
disposições do artigo 169 da Constituição, as quais devem ser aplicadas na
ordem de preferência, conforme veiculadas pelo ordenamento.
Mas, em nenhuma hipótese pode-se violar direito adquirido.
Portanto, quando a LRF prevê a impossibilidade de concessão de novos reajustes
como uma das medidas de contenção, refere-se a projeções de gastos que não
integram o patrimônio dos servidores, ou seja, aumentos que ainda não foram
aprovados pelo Legislativo, pois a LRF prevê a impossibilidade de concessão de
novos reajustes, mas sem ferir os já concedidos.
Além disso, é necessário ressaltar que, se o limite ao
aumento de gastos for desrespeitado, poderá ser proibida a “concessão de
qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de membros de
Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos e militares”, excetuado
o que for resultante de determinação legal decorrente de atos anteriores à
entrada em vigor da EC nº 95/2016, conforme a redação do artigo 109 dos Atos
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
Mas, para os reajustes salariais concedidos no mesmo
exercício financeiro da entrada em vigor da EC 95/2016, torna-se irrelevante o
fato de as leis terem sido aprovadas em data posterior ao início da sua
vigência. Vale dizer, os efeitos da Emenda somente poderiam impedir que se
finalizassem os processos legislativos que tratassem de reajustes, pois
integram o cenário de “estimativa de impacto orçamentário-financeiro no
exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes”, de acordo com a
LRF.
Assim, uma vez que as propostas de reajustes tenham se
tornado lei formal, impõe-se a integralidade do seu pagamento, sob pena de se
violar o princípio da irredutibilidade salarial, mesmo diante da EC 95/2016.
Em caso semelhante, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o
direito adquirido a reajuste concedido por lei estadual. No julgamento da Ação
Direta de Inconstitucionalidade 4.013, reconheceu a violação a direito
adquirido por meio de nova lei que revogava o aumento salarial previsto em lei
vigente, porém, com previsão de pagamento em exercício orçamentário posterior.
Portanto, não é possível, por força das limitações trazidas
pela EC 95/2016, o adiamento do reajuste salarial, pois violará o direito
adquirido dos servidores decorrentes das leis já aprovadas e vigentes, bem como
a segurança jurídica.
O momento é mesmo delicado e pode exigir medidas
impopulares, mas isso não significa que, mais uma vez, o bolso do trabalhador
deve ser ilegalmente sacrificado para pagar a conta!
Por Robson Barbosa
Robson Barbosa é advogado do Cassel Ruzzarin Santos
Rodrigues Advogados.