Blog do Vicente
- 15/02/2018
As medidas tomadas pelo governo para conter o crescimento
dos gastos com servidores — os concursos estão sendo liberados a conta-gotas —
têm dado poucos resultados. Sem uma reestruturação profunda nas carreiras do
funcionalismo, as despesas com pessoal chegarão a níveis alarmantes, tornando
ainda mais complicado o ajuste fiscal. Nos últimos seis anos, o aumento médio
real da folha salarial, incluindo ativos e inativos, foi de 6,5% ao ano. Em
2017, especificamente, esses gastos cresceram três vezes mais do que a inflação
oficial (2,95%).
Diante desses números, não resta dúvida de que, tirada a
reforma da Previdência Social do radar (aprovada, ou não), o governo terá que
se debruçar sobre o projeto que muda toda a estrutura do funcionalismo. Não é
possível que servidores continuem entrando no serviço público ganhando de R$ 15
mil a R$ 20 mil por mês, salários próximos aos daqueles que estão à beira de se
aposentarem. Com esses rendimentos iniciais, não há estímulo para que executem
bem as suas funções. Ao longo do tempo, acabam se acomodando, pois falta um
plano de carreiras que premie os melhores com promoções.
A reestruturação das carreiras do funcionalismo público foi
alvo de intensos estudos pelo Ministério do Planejamento no ano passado. Depois
de analisar toda a estrutura salarial de cada grupo — são mais de 200 —, o
órgão produziu um projeto de lei que limpa o modelo atual e corrige as
distorções. A proposta com as mudanças está na Casa Civil e prevê salários
iniciais de até R$ 2,8 mil nos cargos de nível médio e de até R$ 5 mil nos de
nível superior.
Os servidores que entrarem no governo já nessas condições
levarão pelo menos 20 anos para atingir os salários máximos da carreira, num
sistema meritório, muito parecido com o que prevalece na iniciativa privada. A
medida, se aprovada pelo Congresso, obrigará os funcionários federais a se
capacitarem, a provarem que são bons e que merecem ter reajustes nos
contracheques. Mais que isso, eles terão que dar retorno adequado à sociedade,
sobretudo por meio da prestação de serviços. Hoje, mesmo custando caríssimo, o
Estado dá um péssimo atendimento aos contribuintes.
Quadro dramático
Na avaliação de Arnaldo Lima, assessor especial do
Planejamento, o projeto que reestrutura as carreiras do funcionalismo não deve
provocar tanta polêmica. Ele acredita que há uma consciência de que os gastos
com servidores não podem continuar crescendo, indefinidamente, acima da
inflação. Com o teto dos gastos, mantido o atual ritmo de expansão da folha
salarial, o governo terá que tirar recursos de áreas essenciais para custear a
folha de pessoal. A situação é tão dramática que a União vem bancando uma série
de despesas por meio da emissão de dívidas. Ou seja, o Tesouro Nacional já não
arrecada o suficiente para cobrir despesas corriqueiras. Pior, corre o risco de
incorrer em crime de responsabilidade fiscal.
Se a situação já é difícil na União, o quadro se torna
dramático entre estados e municípios. Pelos cálculos do assessor do
Planejamento, os gastos com salários têm aumentado, em média, 20% ao ano acima
da inflação. Quer dizer: a cada quatro ou cinco anos, as despesas com o
funcionalismo dobram de tamanho. Não há país que consiga sustentar tamanha
fatura. Não por acaso, estados como o Rio de Janeiro, o Rio Grande do Sul e o
Rio Grande do Norte estão quebrados, deixando os cidadãos ao deus-dará. A
violência no carnaval carioca é o exemplo mais contundente do descalabro desses
estados.
Lima ressalta que os servidores ativos e inativos da União
consomem, por ano, 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Quando essa conta
considera estados e municípios, mas só computa os que estão trabalhando, a
fatura corresponde a 10,5% de todas as riquezas produzidas pelo país. Isso
mesmo: de cada R$ 100 de tudo o que o Brasil produz por ano, R$ 10,50 vão para
o pagamento de servidores da ativa. Essas despesas são superiores à verificada
na média dos países ricos, de 10%, segundo levantamento da Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
No banco dos réus
Muitos dos problemas que estão sendo enfrentados pela União
e por estados e municípios foram causados por governos perdulários e
irresponsáveis, que deram reajustes salariais e incharam a máquina de
servidores como se o dinheiro dos contribuintes fosse infinito. No caso da
administração federal, há aumentos salariais contratados até 2019, o que fará
com que a folha de pessoal continue subindo muito além da inflação. O reajuste
previsto para este ano foi parar na Justiça e está sendo pago por meio de uma
liminar concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal
Federal (STF).
“Os gastos da União com servidores sobem muito por conta dos
reajustes concedidos nos últimos anos e por conta dos aumentos vegetativos,
como os dados a pessoas que mudam de função”, explica Arnaldo Lima. Ele destaca
que, no Executivo, o salário médio está hoje ligeiramente acima de R$ 10 mil
por mês. No Judiciário e no Legislativo, as remunerações médias variam entre R$
16 mil e R$ 17 mil. Isso, sem nenhum dos penduricalhos que incham os
contracheques. Segundo o Banco Mundial, na média, os funcionários públicos no
Brasil recebem 67% a mais do que os trabalhadores da iniciativa privada. É uma
transferência de riqueza impressionante para um grupo pequeno de brasileiros.
Por Vicente Nunes