Bocão News - 11/03/2018
A cada R$ 100 em despesas com salários, a União gasta outros
R$ 77 com gratificações e incentivos a servidores na ativa dos três Poderes e
do Ministério Público da União.
Levantamento feito pela Folha na base de dados do Ministério
do Planejamento mostra que, em 2017, esses gastos somaram R$ 42,3 bilhões,
enquanto os desembolsos com salários totalizaram R$ 54,5 bilhões. A folha custou
R$ 96,8 bilhões.
As gratificações por cargo efetivo, instituídas no governo
Lula em meio a reestruturações da remuneração do funcionalismo, compõem a
maioria das vantagens.
Como são calculadas com base nos salários, crescem sempre
que há reajustes, como o concedido pelo presidente Michel Temer no ano passado
aos peritos médicos previdenciários.
Esses benefícios foram idealizados para elevar remuneração e
ao mesmo tempo estimular a eficiência do servidor, sendo pagos de acordo com
variáveis como desempenho do funcionário e da instituição em que trabalha.
É um sistema de pontuação que totaliza 100, correspondente à
gratificação máxima: na média das categorias, a performance do servidor
responde por 20 pontos, e a do órgão, pelos 80 restantes.
Segundo a Folha apurou, na prática, entre 95% e 100% dos
servidores sempre ganham a maior nota por seu desempenho. E, como os próprios
órgãos são responsáveis por determinar os parâmetros a que se sujeitam, não
existem casos em que as metas institucionais não sejam atingidas.
“O governo não tem processos de avaliação de desempenho que
garantam que aquela recompensa está atrelada a esforço e resultado”, afirma
Sandro Cabral, professor de estratégia do Insper.
Além disso, as gratificações, que pagam contribuição
previdenciária, são incorporadas aos salários após cinco anos, segundo decisões
de tribunais superiores, perdendo o caráter de recompensa.
Também são pagas, na metade do valor, aos servidores
aposentados, em uma desvirtuação do projeto original, que previa que o valor
fosse concedido somente durante o período em que o servidor estivesse na ativa.
MUDANÇAS
De acordo com fontes da equipe econômica ouvidas pela
reportagem, o governo trabalha em um projeto de lei em que o sistema de
gratificações, daqui para a frente, seria substituído por promoções na carreira
pública.
Outro ponto desse projeto é estabelecer em 25 o número de
etapas que o servidor tem de cumprir para chegar ao topo da carreira.
Atualmente, há carreiras em que essa progressão leva cinco
ou nove anos. A consequência disso é que, em curto período, a maior parte dos
servidores passa a ser remunerada pelo salário máximo.
O problema é que alterações teriam de passar pelo Congresso,
onde os grupos de pressão de servidores têm força.
A complexidade das carreiras no serviço público também torna
difícil fazer mudanças: há mais de 75 gratificações distintas, cada uma com
regras próprias.
“Ao longo do tempo, distintas carreiras do serviço público
foram ganhando quase que vida própria, com suas especificidades e vantagens”,
diz José Matias-Pereira, professor de administração pública da UnB
(Universidade de Brasília). “Quanto maior o poder de fogo de determinada
categoria, maiores os reajustes e benefícios.”
O tema causa preocupação crescente porque as despesas com
pessoal e encargos são, cada vez mais, um problema fiscal, representando o
segundo maior gasto da União, atrás da Previdência.
Entre 2003 e 2010, no governo Lula, esses gastos cresceram
53% acima da inflação. Em 2017, após uma estabilidade de seis anos na alta real
desses gastos, essas despesas voltaram a crescer acima da inflação, com um
aumento de 6,5% sobre 2016.
“Há bons argumentos que indicam que a política de
remunerações usada atualmente não é boa”, afirma Claudio Hamilton dos Santos,
pesquisador do Ipea.