Consultor Jurídico
- 21/04/2019
Morro de medo dos defensores da moral e dos bons costumes.
Em nome de resgatar e preservar tais valores, já se matou, ilegitimou e excluiu
muitas pessoas do laço social. Muitos já foram torturados (embora no Brasil há
quem negue, ou não queira ver isso). Em nome dessa moral e bons costumes, até a
Constituição da República de 1988, os filhos havidos fora do casamento eram
ilegítimos e tinham que ficar invisíveis, como se eles não existissem. Sua
visibilidade apontaria os nossos desejos tortuosos. Negar a existência do
sujeito de direitos como sujeito de desejos é desumanizar pessoas, criar um
sistema jurídico em cima de dogmas religiosos e de uma moral excludente.
Embora desde a primeira Constituição da República (segunda
do Brasil), em 1891, o Estado brasileiro seja, oficialmente, laico, pois não há
mais uma religião oficial, a laicidade ainda não é uma realidade, e neste
momento dá sinais sérios de retrocesso. E isso significa uma grande ameaça de
retrocesso também para o Direito das Famílias.
As religiões são muito importantes, pois têm sido uma enorme
força civilizadora e funcionam como vastos sistemas simbólicos que contêm
verdades profundas acerca da existência humana (Camille Paglia in Verdades
Cintilantes). Assim como o Direito, as religiões também funcionam como um
sistema de freios e ajudam a colocar limites instalando sentimentos de culpa,
de pecado, ou seja, leis morais, cuja sanção máxima pode ser o fogo do inferno.
É assim que elas operam como um grande sistema de sentido das coisas, como
criação do mundo, vida além da morte etc. No Direito, cuja função civilizatória
é também colocar limites externos em quem não o tem internamente, a sanção
jurídica pode ser por atos reparatórios e restrições da liberdade de ir e vir,
por exemplo. É o “não” necessário para que o sujeito respeite o direito alheio.
O problema está em se estabelecer uma única religião como verdade. E pior ainda
é querer impô-la aos outros. Este é o grande pecado do Estado contaminado por
verdades e dogmas religiosos, que pretende se instalar no Brasil.
Os dogmas são verdades que não se deve questionar, mas tão
somente aceitá-los, são uma grande ameaça ao Direito. Eles se sustentam, em
última análise, para manutenção das relações de poder. É tudo em nome do bem e
de Deus. Somente quando o Estado respeita todas as religiões, e também quem não
tem religião, mantendo-se neutro em relação a elas para suas políticas
públicas, é que os grupos minoritários podem estar seguros de que não terão
ameaçados os seus direitos já conquistados. Um Estado, cujas políticas públicas
forem guiadas por preceitos e dogmas religiosos, certamente excluirá direitos
das...
Leia a íntegra em Por um Estado laico: misturar Direito e religião sempre gerou injustiças