BSPF - 08/05/2019
Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra um
fato considerado quase improvável: a Receita Federal, voraz ao cobrar dos
contribuintes, errou ao calcular o “prêmio” para seus servidores. Em uma só
canetada, feriu a Constituição, a lei do teto dos gastos e a Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF) Sorrateiramente, criou um “gatilho” para
reajustes acima da inflação, sem indicar fonte de recurso, “usurpando a
competência do Poder Legislativo”. O TCU critica, ainda, a iniciativa do Poder
Executivo, que alegou déficit no RPPS de R$ 46,4 bilhões, em 2018, mas, “por
meio da MP 765, paradoxalmente, concedeu benefício fiscal a uma pequena parcela
de servidores, deixando de arrecadar anualmente milhões de reais”
O TC destaca que, na Exposição de Motivos (EM) 360/2016, o
Poder Executivo informa que a despesa com bônus de eficiência e produtividade
(BEP) da carreira tributária e aduaneira, para 2018, era estimada em R$ 2
bilhões. “Todavia, se aludida medida provisória tivesse sido aprovada
integralmente, a despesa com o BEP, nesse mesmo período, poderia alcançar R$
2,9 bilhões”, aponta o relatório. Apenas com aposentados e pensionistas, de
dezembro de 2016 até abril de 2019 (gasto de R$ 2.550 milhões), houve renúncia
fiscal de receitas, em consequência do não desconto da alíquota de 11% para a
Previdência, sobre esse total, “pode alcançar R$ 280 milhões”.
“A sobredita constatação de subestimação da despesa é por
demais preocupante, notadamente, por se tratar de um dispêndio de caráter
continuado, o qual impactará indefinidamente as contas públicas. Repise-se que
as estimativas de impacto orçamentário-financeiro não constituem uma mera
burocracia, mas sim um instrumento de planejamento governamental e de
transparência”, acentua.
Transparência que não houve, pois não é possível sequer estimar quanto receberia cada servidor.
“Pois além de conter uma estimativa de despesa equivocada, não há qualquer informação sobre o valor individual do bônus. O Poder Executivo tinha o dever de dar publicidade à estimativa de ganhos dos servidores ao Congresso Nacional e à sociedade. No entanto, não o fez”, assinala o documento. Mesmo com inconsistência, o TCU calculou que possivelmente cada servidor ganhou um valor médio mensal de R$ 5.708,45, a título de bônus, considerando ativos, inativos e pensionistas.
Transparência que não houve, pois não é possível sequer estimar quanto receberia cada servidor.
“Pois além de conter uma estimativa de despesa equivocada, não há qualquer informação sobre o valor individual do bônus. O Poder Executivo tinha o dever de dar publicidade à estimativa de ganhos dos servidores ao Congresso Nacional e à sociedade. No entanto, não o fez”, assinala o documento. Mesmo com inconsistência, o TCU calculou que possivelmente cada servidor ganhou um valor médio mensal de R$ 5.708,45, a título de bônus, considerando ativos, inativos e pensionistas.
Irregularidades
De acordo com o TCU, são várias as irregularidades. A
primeira constatação de equívoco na Lei 13.464/2017, que institui o BEP é a
dispensa de contribuição previdenciária, contrariando a Constituição Federal e
a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). “Com efeito, também não foram atendidas
as condições necessárias para a implementação de renúncia de receita
estabelecidas no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal”, explica a Corte de
Contas. Além disso, não há explicações sobre as bases de cálculo do bônus. “O
Ministério da Economia argumentou que o estabelecimento dessas bases de cálculo
deve ocorrer por meio de ato administrativo, o que no entendimento desta equipe
de fiscalização viola o art. 150, § 6º, da Constituição Federal e os princípios
da reserva legal e da separação dos poderes”.
Gatilho salarial
Inadvertidamente, na lei que cria o bônus também cria um
gatilho salarial – expressamente proibido no país. Na lei, que ainda está
correndo no Congresso, os aumentos para o BEP estão vinculados às flutuações da
arrecadação tributária. Ou seja, a cada vez que a arrecadação aumentar,
automaticamente o dinheiro extra (atualmente em R$ 3 mil para auditores e R$
1,8 mil para analistas) que entra no bolso também cresce, em mais uma
contrariedade à lei do teto dos gastos. “Ademais, o aumento da despesa em
decorrência das “variações automáticas da base de cálculo não segue a lógica da
Emenda Constitucional 95/2016, que estabelece o “teto de gastos”, que não tem
relação com a arrecadação de receitas”, aponta o relatório.
A Lei 13.464/2017 também tem dispositivo que indica conflito
de interesses entre o público e o privado, no entender o TCU, porque prevê, na
criação de comitês gestores dos programas de produtividade – aos quais compete
fixar os índices de eficiência institucional e metodologia – , a presença dos
próprios servidores beneficiários do BEP. “Tal fato é agravado, pois esse
diploma legal não estabelece parâmetros mínimos de eficiência para tais órgãos,
ficando toda a regulamentação do índice de eficiência institucional a cargo do
Poder Executivo”, aponta o TCU.
Despesa
A situação só piora, quando feita a análise da geração da
despesa pública. Desde 2016, são pagas parcelais mensais fixas a auditores e
analistas. No entanto, a intenção era de que o valor se alterasse, de acordo
com as flutuações da arrecadação tributária, sem limite para as despesas, além
do teto remuneratório – subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal
(STF). “A inexistência de outros limites à despesa criada com o BEP vai na
contramão dos princípios estabelecidos pelo Novo Regime Fiscal, pois o
crescimento de uma despesa acima da variação da inflação exigirá a redução das
disponibilidades de outras despesas, para o integral custeio dos dispêndios com
o BEP”.
Em 2018, ainda houve uma “tentativa” de adequação das
despesas com o BEP. No Relatório de Avaliação de Despesas e Receitas Primárias
(RARDP), segundo a antiga Secretaria de Orçamento Federal do então Ministério
do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (SOF/MP), a previsão de gastos de R$
2.536,9 bilhões (considerando-se a “regulamentação”), foi revisada para R$
999,8 milhões. “Destaque-se que a MP 765/2016, nos arts. 10 e 20, estabeleceu
que, nos meses de dezembro de 2016 e janeiro de 2017, seriam devidos, a título
de BEP, o valor mensal de R$ 7.500,00 a auditores-fiscais da Receita Federal do
Brasil e a auditores-fiscais do Trabalho e o valor mensal de R$ 4.500,00 a
analistas tributários da Receita Federal do Brasil”, lembrou o TCU.