BSPF - 25/06/2019
Para Denise Gentil, é uma falácia dizer que os servidores
públicos federais são responsáveis por parte do déficit da Previdência. Os
professores, por exemplo, recebem de aposentadoria metade do que contribuem
A Proposta de Emenda a Constituição (PEC) nº 006/2019, nome
oficial da reforma da Previdência do governo de extrema direita de Jair
Bolsonaro (PSL), tem entre outras mudanças nefastas para a classe trabalhadora
a que aumenta a alíquota da contribuição dos servidores públicos em até 22% do
valor dos seus vencimentos.
A desculpa para o reajuste, segundo o ministro da Economia,
o banqueiro Paulo Guedes, é a de que os servidores contribuem pouco (hoje, a
contribuição é de 11% sobre o salário bruto) e há um déficit nas contas da
Previdência que teria sido provocado pela categoria.
O discurso do governo é uma falácia, garante a professora de
economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ), Denise Gentil, que
fez uma série de cálculos em parceria com o também professor do Instituto de
Economia da UFRJ, Ary Barradas, e a conclusão é a de que há servidor que paga
muito para se aposentar, o que contradiz o discurso do governo.
Os professores universitários são um exemplo do que Denise e
Ary estão afirmando. A cada R$ 2,00 de contribuição para o Regime Próprio de
Previdência Social (RPPS), têm direito de receber de volta como benefício na
aposentadoria apenas R$ 1,00.
O déficit do servidor público de hoje está vinculado a
eventos do passado, explica Denise Gentil. De acordo com ela, a partir da
Emenda Constitucional (EC) nº 3 de 1993, do governo de Fernando Henrique
Cardoso (PSDB-SP), os servidores passaram a contribuir para o regime próprio, o
RPPS. O parágrafo 6º da EC diz: “As aposentadorias e pensões dos servidores
públicos federais serão custeadas com recursos provenientes da União e das
contribuições dos servidores, na forma da lei”.
Além disso, a Emenda Constitucional obriga os servidores
aposentados e pensionistas a também contribuir. Ou seja, diferente do
trabalhador urbano do setor privado, os servidores e os dependentes dos
pensionistas continuam contribuindo com a Previdência, mesmo após passarem a
receber o benefício.
Fazendo as contas
Segundo a economista, na simulação do cálculo que fez com
Ary Barradas), para o caso de um professor doutor que ingressou na década de
1990 em uma universidade federal, as contribuições foram corrigidas pela
inflação e submetidas a uma capitalização semelhante a da caderneta de poupança
até 1998 e, depois desse ano, pela taxa básica de juros (SELIC). Quando
colocado na conta o quanto o servidor pagou à Previdência em comparação com o
que irá receber (supondo-se que receberá o salário integral da fase ativa), o
saldo é positivo ao regime de aposentadoria dos servidores.
“É essa conta que o atual governo não faz. Desde 1998 muita
coisa mudou nas regras da Previdência e houve uma redução do valor das
aposentadorias dos servidores. Há sete anos que vem caindo o déficit na
Previdência da categoria”, explica Denise.
Segundo ela, em função dos concursos públicos, que permitem
a contribuição de novos funcionários para o sistema e da contribuição dos
aposentados e pensionistas, hoje se inverteu a paridade: o servidor paga mais
do que receberá.
"O servidor que entrou na ativa depois da metade dos
anos 1990, e ainda vai se aposentar, terá contribuído com muito mais do que
receberá em benefícios pagos pelo governo ao longo de sua vida e de seus futuros
dependentes e continuará contribuindo até morrer”, diz.
Sobre o déficit alardeado pelo governo, a professora explica
que medidas que vêm sendo tomadas desde a década de 1990 contribuíram
fortemente para reduzir ou acabar com o que eles chamam de rombo da
previdência.
“A partir de 1995, diversas vantagens que oneravam muito as
despesas com inativos foram sendo extintas: licença prêmio, promoção à classe
superior, incorporação de cargos em comissão, incorporação de quintos,
anuênios. Também em 2003, foi extinta a integralidade e a paridade dos
servidores inativos com os ativos, e as aposentadorias passaram a ser
calculadas pela média dos salários de contribuição. Além disso, o valor das
aposentadorias por invalidez e pensão por morte foram reduzidos”.
Alíquotas maiores para servidores é confisco
Denise Gentil diz ainda que a alíquota progressiva de
contribuição dos servidores que está na PEC da reforma da Previdência, que
varia de 11,68% para quem ganha de R$ 5,8 mil a R$10 mil a 22% do salário para
quem ganha acima de R$ 39 mil é um confisco, já que eles já contribuem, hoje,
com mais do que o que é gasto com benefícios e ainda vão continuar pagando este
percentual mais elevado após a aposentadoria.
“O valor das aposentadorias dos antigos servidores, daqueles
que se ingressaram antes de 2003 e até 2013, também já foi ajustado para baixo
por várias reformas de tal forma que sua aposentadoria corresponderá a um valor
muito menor do que a soma das parcelas que descontou de seu salário ao longo da
vida”, diz a professora de economia.
Ela explica ainda, que, além disso, em 2013, foi
regulamentado o regime de capitalização para os servidores em caráter
complementar. Ou seja, a capitalização já é uma realidade para os servidores e,
hoje, os que ingressaram após 2013 recebem uma aposentadoria equivalente à do
setor privado. Já o governo Dilma já uniformizou os dois regimes”.
Reforma vai asfixiar a economia
Além disso, segundo a professora de economia da URFJ, há um
descompasso entre a realidade e o que o governo pensa, já que a reforma da
Previdência vai produzir um aumento da pobreza no país.
“Embora o relatório da reforma da Previdência tenha
melhorado em alguns pontos, o que o relator propõe, ainda assim, vai agravar a
situação recessiva do país, vai provocar uma situação social catastrófica ao
diminuir a capacidade de consumo das famílias. O consumo das famílias
representa mais de 60% do PIB brasileiro. Reduzir isso, com o corte no valor
das aposentadorias do setor privado e do setor público é asfixiar a economia”,
lamenta Denise Gentil.
Fonte: CUT Brasil