BSPF - 25/06/2019
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal
(STF), deferiu liminar nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6172,
6173 e 6174 para suspender trecho da Medida Provisória (MP) 886/2019 que
transferia a competência para a demarcação de terras indígenas para o
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Em sua decisão, o
ministro destacou que a reedição de norma rejeitada pelo Congresso Nacional na
mesma sessão legislativa viola a Constituição da República e o princípio da
separação dos poderes.
Interesses conflitantes
As ações foram ajuizadas pela Rede Sustentabilidade (ADI
6172), pelo Partido dos Trabalhadores – PT (ADI 6173) e pelo Partido
Democrático Trabalhista – PDT (ADI 6174) contra o artigo 1º da MP 886, na parte
em que altera os artigos 21, inciso XIV e parágrafo 2º, e 37, inciso XXI, da
Lei 13.844/2019. A lei, que reestrutura os órgãos da Presidência da República,
é resultante da conversão da MP 870, e, no processo de conversão, o Congresso
Nacional havia rejeitado a transferência da demarcação de terras para o Mapa,
mantendo tal atribuição no âmbito da Fundação Nacional do Índio – Funai.
Segundo os partidos, Constituição da República veda a
reedição de medida provisória da mesma legislatura em que rejeitada, e a
iniciativa da Presidência da República desrespeita a cláusula do estado de
direito (artigo 1º da Constituição) e o direito dos povos indígenas à
demarcação das suas terras (artigo 231), pois o Mapa defende interesses
conflitantes.
Histórico
Ao examinar o pedido de cautelar, o ministro Barroso traçou
o histórico do debate em torno da questão. Em 1º/1/2019, o presidente da
República editou a MP 870, que atribuía ao Mapa a competência para identificar,
delimitar, demarcar e registrar as terras tradicionalmente ocupadas por
indígenas. A medida foi objeto da ADI 6062, em que o ministro indeferiu
cautelar, por entender que a restruturação de órgãos da Presidência da
República se inseria na competência discricionária do chefe do Executivo e que
a MP estava sob a apreciação do Congresso.
Na sequência, o Legislativo rejeitou a transferência de
atribuição, e o projeto de lei de conversão da MP 870, com a supressão desse
ponto, foi aprovado e convertido na Lei 13.844/2019. “Sobreveio, então, a MP
886, que alterou justamente a mesma lei para reincluir na norma a previsão que
havia sido rejeitada pelo Congresso”, observou o relator.
Vedação
Barroso lembrou que o artigo 62, parágrafo 10, da
Constituição da República veda expressamente a reedição de medida provisória
que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido a sua eficácia por decurso de
prazo na mesma sessão legislativa e que seu teor literal não suscita qualquer
divergência. “A jurisprudência do STF sobre a matéria é igualmente pacífica”,
assinalou, citando os precedentes recentes nas ADIs 5709, 5716 e 5717.
Segundo o relator, a MP 870 vigorou na atual sessão
legislativa, e a transferência da competência para a demarcação das terras
indígenas foi igualmente rejeitada na atual sessão legislativa. “Por
conseguinte, o debate, quanto ao ponto, não pode ser reaberto por nova medida
provisória”, explicou. “A se admitir tal situação, não se chegaria jamais a uma
decisão definitiva e haveria clara situação de violação ao princípio da
separação dos poderes”.
Requisitos
Na avaliação do ministro, os dois requisitos para a concessão
da liminar estão presentes no caso. “A palavra final sobre o conteúdo da lei de
conversão compete ao Congresso Nacional, que atua, no caso, em sua função
típica e precípua de legislador. Está, portanto, inequivocamente configurada a
plausibilidade jurídica do pedido, uma vez que, de fato, a edição da MP
886/2019 conflita com o artigo 62, parágrafo 10, da Constituição”, destacou.
O perigo da demora, segundo requisito, também está presente,
segundo Barroso. “A indefinição da atribuição para demarcar as terras indígenas
já se arrasta há seis meses, o que pode, por si só, frustrar o mandamento
constitucional que assegura aos povos indígenas o direito à demarcação das
áreas que ocupam (artigo 231 da Constituição) e comprometer a subsistência das
suas respectivas comunidades”, concluiu.
A decisão do relator será submetida a referendo do Plenário.
Fonte: Assessoria de Imprensa do STF