BSPF - 16/11/2019
Estatais que queiram alterar o horário de expediente terão
que consultar, primeiro, os trabalhadores e conquistar o consentimento de cada
um. O Comando Nacional dos Bancários conseguiu impedir a execução da MP
905/2019 até que seja concluída a negociação entre a Febraban e a representação
da categoria. A próxima reunião será no dia 26 de novembro
Às vésperas do feriado de Proclamação da República, os
servidores levaram um susto com a decisão da Caixa Econômica Federal de ampliar
a jornada de trabalho de seis para oito horas (com exceção dos caixas), para se
adequar às determinações da Medida Provisória (MP 905), editada na terça-feira,
que flexibiliza os contratos de trabalho. Horas depois, o banco recuou. Admitiu
que não poderia ferir as regras dos editais dos concursos de seus funcionários.
Mas a dúvida entre servidores do Executivo e no Judiciário que só trabalham
seis horas por dia, se serão ou não afetados, permaneceu. Segundo
especialistas, os servidores podem ficar tranquilos. As novas regras só podem
valer para os futuros concursados.
Caso o governo decida aplicar as imposições da MP ao pessoal
atualmente na ativa, vai dar tiro no pé. Terá que iniciar imediata expansão de
gastos. Seria um contraste com as metas de ajuste fiscal da equipe econômica do
presidente Jair Bolsonaro. “Não é possível aumentar a carga horária sem
aumentar o salário proporcionalmente. Caso contrário, a medida é
inconstitucional e fere o princípio da irredutibilidade de vencimentos”,
garante Mônica Sapucaia Machado, especialista em direito político e econômico e
professora da Escola de Direito do Brasil (EDB).
A Caixa – ou qualquer empresa estatal com a intenção de
alterar o expediente – teria que consultar primeiro os trabalhadores e
conquistar o consentimento de cada um. “Os contratos de trabalho da CEF são
originários de editais de processo seletivo público. Se nos editais não existir
aumento de carga horária com aumento de vencimentos, será necessário negociação
com o empregado e aceitação do mesmo da nova jornada”, afirma Mônica Sapucaia
Machado. A advogada constitucionalista Vera Chemim, especialista em direito
público administrativo, explica que, apesar dos objetivos de modernização da MP
905, alguns pontos podem ser contestados.
Normas
Entre eles, o respeito ao direito adquirido. “Assim, tal
regra, se aprovada, só valerá para trabalhadores ou servidores admitidos a
partir da data de sua vigência. Há que se respeitar, respectivamente, o
contrato de trabalho e as normas que vigiam à época da admissão por concurso
público”, enfatiza a advogada. Vera Chemim alerta que, mesmo que apenas os futuros
servidores venham a ser admitidos em novo modelo, a forma de contratação não
pode ferir o direito fundamental individual.
“Regras diferenciadas para os trabalhadores em geral correm
o risco de afrontar o princípio da igualdade”, lembra. Os servidores também
devem ficar atentos. Na hipótese de haver na MP 905 um dispositivo já tenha
constado em MP anterior (a MP 881, por exemplo, da liberdade econômica), o item
deve ser excluído, já que a Constituição proíbe a reedição na mesma sessão
legislativa. Ou seja, no mesmo ano em que o outro dispositivo foi editado e
rejeitado pelo Congresso Nacional.
Bárbara Anacleto, do núcleo trabalhista do Nelson Wilians e
Advogados Associados, detalha que os funcionários da Caixa estão sujeitos às
normas da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Como a MP 905 prevê a
alteração da jornada do bancário, põe fim ao expediente de seis horas e determina
o trabalho aos sábados e domingos, os futuros servidores não poderão contestar
as regras, que deverão estar detalhadas nos editais dos concursos daqui para
frente. “Com a MP em vigência, que tem eficácia imediata, é possível a
alteração da jornada dos bancários. E é preciso considerar os benefícios dos
maiores períodos diários e aos sábados. Será um benefício para quem busca a
agências físicas e tem dificuldades para ir a um posto bancário no horário
comercial nos dias de semana”, defende Bárbara Anacleto.
Sem apoio
O Senado Federal abriu consulta pública sobre a MP 905, com
a pergunta “Você apoia essa proposição?”. Até as
18h55 de quinta-feira (14), o “não” estava à frente, com 39.352 votos, contra
936 votos pelo “sim”. Ontem, o Comando Nacional dos Bancários se reuniu com a
Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) para tratar do assunto. “O Comando
Nacional conseguiu segurar a implantação da MP 905/2019 até que seja concluída
a negociação com a representação da categoria. A próxima reunião será no dia
26”, informam os bancários. Juvandia Moreira, presidente da Confederação
Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf) crê que, pelo texto da
MP, “não resta dúvidas de que alguns artigos foram incluídos a pedido dos
bancos”.
“Fomos negativamente surpreendidos pela publicação desta MP,
que é, na verdade, um aprofundamento da reforma trabalhista”, disse Juvandia.
Por meio de nota, o Ministério da Economia (ME) informa que não há qualquer
dispositivo na MP 905 que afete o serviço público federal. “De acordo com a Lei
nº 8.112, a jornada de trabalho dos servidores deve respeitar a duração máxima
de 40 horas semanais, com a exceção das demais jornadas estabelecidas em leis
especiais, como para alguns cargos da área de saúde, por exemplo”.
O órgão lembrou ainda que a Instrução Normativa nº 2, de
setembro de 2018, “estabelece que o servidor público da administração pública
federal direta, autárquica e fundacional pode requerer a redução da jornada de
trabalho”. Também por meio de nota, a Caixa informa que “os reflexos da MP
905/2019 estão em avaliação, e eventuais medidas serão comunicadas
oportunamente”. Os servidores estão de olho no desenrolar nas discussões.
Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado
(Fonacate) lembra que o serviço público não está preparado para aumento de
jornada. “Algumas estatais, como é o caso do Banco do Brasil, já fizeram
adequação do pessoal de oito horas, para seis horas, com indenizações,
inclusive, para evitar ações judiciais”.
Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação
Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público (Condsef) concorda que a “medida
foi açodada, sem consulta aos maiores interessados e deve causar uma enxurrada
de ações judiciais”. Os servidores estão se organizando. Na segunda-feira (18),
a Condsef se reúne em São Paulo com as centrais sindicais. Na terça-feira (19),
a Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público vai traçar, em Brasília,
estratégias de convencimento de deputados e senadores. No dia 23, haverá
plenária, no Sindicato dos Bancários, com servidores das três esferas
(estadual, municipal e federal). E de 3 a 15 de dezembro, a Condsef fará um
Congresso para construir um método de defesa para 2020.
Fonte: Blog do Servidor