BSPF - 19/11/2019
Sem uma reforma administrativa, a proporção da despesa com
servidores públicos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) chegará a 14,8%
em 2030. Atualmente, esse percentual é de 13,6%. É o que aponta um relatório
elaborado pelo Ministério da Economia. O Blog obteve acesso ao documento,
intitulado Menos Máquina, mais Social — Governo justo, eficiente e fraterno,
uma espécie de exposição de motivos e defesa à reforma administrativa em gestação
pela equipe econômica.
O diagnóstico faz parte do chamado Plano mais Brasil — A
Transformação do Estado, apresentado em 5 de novembro. O documento traz três
grandes desafios: aumentar a capacidade de investimento do Estado e dar retorno
para a sociedade; reduzir a complexidade e implementar uma gestão que coloque o
serviço público na vanguarda; e aproximar o serviço público do cidadão, “uma
vez que o Estado existe para servir à sociedade”.
Ao longo de 24 páginas, o relatório, baseado em dados de 2018,
começa fazendo um “raio X” das despesas. É neste gráfico que se insere o
primeiro dado. A equipe econômica expõe que a proporção das despesas com
pessoal do setor público em relação ao PIB tende a saltar de 13,6% em 2018 para
14,8%, um aumento de 1,2 ponto percentual. “Quase 1/7 do que nosso país produz
vai para pagar salários, benefícios e encargos da máquina”, destaca.
O documento faz comparativos da proporção dos gastos com
servidores em relação ao mundo. A União Europeia, informa, gasta 9,9% do PIB
com funcionários públicos. O Reino Unido gasta 8,9%. Os Estados Unidos, 9,5%. O
Canadá, 12,4%. Economistas mais próximas com a brasileira, como México e
Colômbia, desembolsam 8,4% e 7,3%, respectivamente.
“A despesa tem crescido a um ritmo forte (de 2012-18, média
de 0,23 p.p. ao ano) e distante tanto de países-referência (Inglaterra e
Canadá) quanto de países em desenvolvimento (México e Colômbia)”, destaca um
trecho do diagnóstico. Em outro slide, a equipe econômica faz comparativos
sobre o custo do Estado com a qualidade dos serviços prestados, sustentando que
o tamanho estatal não justifica serviços melhores.
A equipe econômica reforça o argumento mostrando que a carga
tributária brasileira corresponde a 32,2% do PIB, mas expõe que o Brasil lida
com a 84ª taxa mais alta de mortalidade infantil, o 91º mais elevado índice de
homicídio, está em 67º colocado na nota em matemática no Programa Internacional
de Avaliação de Estudantes (Pisa), e se enquadra em 154º lugar no ranking de
maiores taxas de desemprego.
Capacidade de investimento
Ao destrinchar o “desafio I”, a capacidade de investimento,
o Ministério da Economia sustenta que a curva de gastos reais — ou seja, já
descontada a inflação — com a folha de pagamentos de empresas públicas federais
saltou de R$ cerca de R$ 237 bilhões, em 2003, para aproximadamente R$ 350
bilhões em 2018.
Os investimentos, por sinal, subiram de R$ 50 bilhões para
pouco mais de R$ 100 bilhões, de uma diferença de R$ 187 bilhões no início da
curva para R$ 277 bilhões. “O forte crescimento dos gastos obrigatórios
comprometeu a capacidade de investimento do Estado brasileiro. São menos obras
de saneamento básico, menos estradas e pontes, menos saúde e educação”, sustenta
um trecho.
Ainda no campo de capacidade de investimento, o governo
reitera que, em 2018, as despesas com pessoal correspondiam a R$ 295 bilhões da
Receita Líquida da União, ou seja, 24%. Em outro slide, reitera que 11 estados
estão com os gastos com servidores maior que 60% da receita corrente líquida.
Isso traz, no entendimento do governo, “dificuldades para honrar compromissos
com seus servidores”. As despesas obrigatórias, frisa, sobe exponencialmente
desde 2008, enquanto as despesas discricionárias desabam desde dezembro de
2014.
Redução da complexidade
Na exposição de motivos do desafio seguinte, o governo
informa que a força de trabalho na administração pública federal saltou de 532
mil servidores, em 2003, para 712 mil, em 2018, o equivalente a um aumento de
34%. Nesse período, ressalta que a despesa com pessoal civil ativo subiu de R$
44,8 bilhões, em 2008, para R$ 108,7 bilhões, em 2018. Uma alta de 242% no
período. “Aumento da força de trabalho sem aumento correspondente na qualidade
de serviço público”, analisa.
O governo sustenta, ainda, que, de 1970 a 2019, a quantidade
de planos e carreiras na administração pública federal subiu 319%. “Mudanças
orientadas para beneficiar a própria máquina, não para melhor servir à
sociedade”, sustenta um trecho. O relatório comunica, ainda, que 15,5 mil
servidores cuidam da folha de pagamento em um custo de R$ 1,6 bilhão por ano. E
ressalta ainda existirem funções como chaveiro, discotecário, seringueiro,
detonador, operador de telex, especialista em linotipos, hialotécnico, datilógrafo
e operador de vídeo cassete.
Em outro slide, o relatório mostra a disparidade dos
salários pagos no setor público em relação ao privado. Existem 440 rubricas de
folha de pagamento, das quais 80% não encontram equivalência no privado. Dessa
forma, destaca, 34% de toda a despesa com os salários não encontram
equivalência com o pago pelas empresas.
A equipe econômica mostra, ainda, o que classifica como
“amplitude remuneratória”, ao comparar a diferença salarial entre cargos de
analista administrativo, que chega a variar entre cerca de R$ 13 mil e R$ 20
mil em agências reguladoras, com o pago a analistas técnico administrativos do
Plano Geral de Cargos do Poder Executivo (PGPE), que recebem entre R$ 5 e R$ 8
mil. “Atribuições similares, remunerações distintas; serviço público é desigual
e distante da realidade do país.”
Aproximar do cidadão
O terceiro e último diagnóstico faz uma comparação entre o
rendimento médio mensal nominal — ou seja, sem descontar a inflação — pago aos
servidores ativos com trabalhadores do setor privado. Em 2002, a diferença era
de R$ 2,5 mil, quando a média no setor público era de R$ 2.924, e no privado
era de R$ 484. Em 2019, informa o relatório, essa diferença chegou a R$ 10 mil,
com o governo pagando, em média, R$ 11.842, e as empresas, R$ 1.960.
A equipe econômica sustenta, ainda, que os servidores
públicos federais têm um dos maiores prêmios salariais do mundo, ao mostrar
comparativos com a Europa e Ásia Central, Sul da Ásia, África Subsariana,
América do Norte, América Latina e Caribe, Leste da Ásia e Pacífico, Oriente
Médio e Norte da África.
O documento enfatiza, ainda, que, na maioria das carreiras,
o servidor chega ao topo em menos de 20 anos. Em apenas dois casos, sem
detalhar quais, se ultrapassa a faixa dos 30 anos. Ao destrinchar as
remunerações, a equipe econômica mapeou que mais de 500 “tabelas
remuneratórias” obtiveram aumento real acima de 50% nos últimos 15 anos. Nesse
mesmo período, 220 “tabelas” obtiveram aumento real acima de 100%.
Janela de oportunidade
No slide 24, o último, a equipe econômica sugere que a
digitalização e a aposentadoria dos servidores reforçam a necessidade de
discutir a reforma administrativa, atribuindo os fatores como uma “janela de
oportunidade”. “Grande parte dos servidores se aposentará nos próximos anos,
demandando replanejamento da força de trabalho”, destaca um trecho. Segundo a
equipe econômica, 21% irão se aposentar até 2024. 42% se aposentarão até 2030.
E 61% entrarão em inatividade até 2039.
A digitalização, por sua vez, é apontada pelo governo como
indutor do aumento da “qualidade e velocidade”, “reduzindo gastos e necessidade
de pessoal”. O relatório sustenta que, em 2019, mais de 450 serviços estarão
disponíveis em formato digital. O processo de modernização sugere uma economia
anual de R$ 351 milhões ao governo federal, R$ 1,3 bilhão ao “cidadão” e 83
milhões de horas do cidadão.
O governo faz uma associação com requerimentos físicos e
digitais de serviços do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Em abril,
foram registradas 440 mil demandas físicas, contra 34 mil por meio digital. Em
outubro, os pedidos físicos foram de 78,5 mil, contra 695 mil pelo modelo
digital.
Por Rodolfo Costa
Fonte: Blog do Vicente