O Dia - 02/02/2020
PEC do governo federal prevê a medida a qualquer ente
público em crise; categorias vão tentar barrar
A PEC Emergencial (Proposta de Emenda à Constituição 186/19)
tem tido cada vez mais adesão de parlamentares, como o presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ). O projeto integra o "Plano Mais Brasil", do
governo federal, e prevê economia de R$ 50 bilhões em dez anos com medidas para
conter gastos públicos.
Entre elas, a redução por até dois anos de 25% da jornada e
de salário de servidores da União, estados e municípios, quando as despesas do
ente ultrapassarem 95% da receita. Atento a esse cenário, o funcionalismo já se
articula para frear o avanço do texto. E no caso de aprovação, as categorias
vão acionar a Justiça.
Para alguns representantes do setor público, o salário é
irredutível. E se esse entendimento for alterado, entidades de diferentes
categorias vão acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para que a Corte
analise a constitucionalidade da emenda (na hipótese de promulgação).
Presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas
de Estado (Fonacate), Rudinei Marques lembrou que a PEC prevê ainda outras
medidas de contenção de despesas. Mas ressaltou que o corte de vencimentos é
"indiscutível".
"No caso da redução salarial, haverá briga no Supremo,
porque a irredutibilidade salarial entendemos ser cláusula pétrea (um
dispositivo constitucional que não pode ser alterado nem mesmo por proposta de
emenda à Constituição)". Entre as outras medidas emergenciais de contenção
de despesas estabelecidas pela proposta estão a suspensão de concursos,
proibição de aumentos e de progressão na carreira.
Direitos sociais em pauta no Supremo Tribunal Federal
A expectativa de funcionários públicos e também de alguns
juristas é de que o tema será alvo de questionamentos jurídicos. Professor de
Direito Administrativo e Constitucional da PUC-Rio, Manoel Peixinho destacou
que as cláusulas pétreas estão previstas no Artigo 60 (parágrafo 4) da
Constituição Federal.
"São a forma federativa de Estado; o voto direto,
secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e
garantias individuais", detalhou o especialista.
Peixinho acrescentou que irredutibilidade de salário é
direito social. E ponderou que direitos sociais não estão no rol de cláusulas
pétreas. Porém, o jurista levantou uma questão: pode haver uma interpretação de
que os direitos sociais integram o núcleo dos direitos individuais.
"E, assim, poderão ser considerados cláusulas pétreas.
Mas essa compreensão pode ser objeto de debate no Judiciário, principalmente no
STF", frisou Peixinho. "A interpretação mais garantista é de que os
direitos sociais integram o núcleo dos direitos individuais, que estão
protegidos na Constituição como cláusulas pétreas. Mas se a Justiça (o
entendimento) for liberal, dirá que não. Caberá em última instância ao Supremo
dizer", complementou.
Além disso, para o especialista, a medida, se colocada em
prática, pode gerar efeito contrário: "A redução de salários poderá surtir
um efeito colateral, diminuindo o poder de compra da classe trabalhadora.
Assim, poderá haver desaquecimento da economia".
Fórum garante que país vai parar
Coordenador do Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores
Públicos Federais (Fonasefe), Rogério Expedito lembrou que, em 2019, o STF
julgou o tema: a maioria dos ministros decidiu por barrar a redução salarial.
"Já existe decisão do Supremo sobre isso, e iremos acionar a Justiça novamente
se a PEC passar", declarou. Expedito disse ainda que, se colocada em
prática, a medida vai parar o país. "Haverá greve. Os servidores estão com
o salário corroído e não vão aguentar", afirmou, acrescentando que, em 18
de março, já haverá paralisação do setor público no país. Aliás, a PEC vai
ganhar a atenção de servidores e parlamentares na reunião da Frente Parlamentar
Mista em Defesa do Serviço Público, no próximo dia 12, em Brasília.
Por Paloma Savedra