BSPF - 15/03/2020
Sobre essa mesma temática, o FONACATE lançará no dia 30 de
março em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado
Federal, o livro: "Erosão de Direitos: reformas neoliberais e assédio
institucional".
Há um fenômeno novo e perturbador no setor público
brasileiro. Trata-se do assédio institucional (organizacional e moral) como
forma dominante de relacionamento entre distintas instâncias ou organizações
hierárquicas em cada poder da União e nível da federação. E dentro de cada
poder e nível federativo ou organizacional, entre chefias e subordinados,
caracterizando, neste caso, o fenômeno típico do assédio moral, que obviamente
não é exclusividade do setor público.
O assédio institucional de natureza organizacional
caracteriza-se por um conjunto de discursos, falas e posicionamentos públicos,
bem como imposições normativas e práticas administrativas, realizado ou emanado
(direta ou indiretamente) por dirigentes e gestores públicos localizados em
posições hierárquicas superiores, e que implica em recorrentes ameaças,
cerceamentos, constrangimentos, desautorizações, desqualificações e
deslegitimações acerca de determinadas organizações públicas e suas missões
institucionais e funções precípuas.
Enquadra-se nessa nova categoria sociológica e jurídica a
recente e infeliz declaração do Ministro da Economia, Paulo Guedes, acerca do
parasitismo inerente aos servidores públicos funcionários do Estado brasileiro.
Não é a primeira vez que o ministro sugere que funcionários públicos sejam
parasitas. Suas desculpas não possuem qualquer credibilidade. Está claro que é
isso mesmo o que ele pensa e sente.
Nesse sentido, todas as propostas em curso de reforma
administrativa que visam, quase que exclusivamente, reduzir gastos correntes
forjando para baixo as contratações e remunerações dos servidores públicos
adquire, portanto, um teor altamente questionável. Não apenas porque são medidas
ineficazes e bastante questionáveis para se obter ajuste fiscal estrutural nas
contas públicas, como porque mal escondem a sua sanha ideológica, persecutória
e criminalizadora que está na verdade por detrás da aparente tecnicidade
fiscal.
Alguns outros exemplos são eloquentes contra Universidades e
Institutos Federais, ANVISA, ANCINE, BNDES, CNPQ, CAPES, FINEP, FIOCRUZ, FUNAI,
IBGE, IBAMA, ICMBIO, INPE, INEP, IPEA e até mesmo contra organizações e
carreiras do chamado núcleo administrativo ou estratégico de Estado,
representado pelo Fonacate (Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de
Estado), tais como: Fiscalização Agropecuária, Tributária e das Relações de
Trabalho; Arrecadação, Finanças e Controle; Gestão Pública; Comércio Exterior;
Segurança Pública; Diplomacia; Advocacia Pública; Defensoria Pública;
Regulação; Política Monetária; Inteligência de Estado; Pesquisa Aplicada,
Planejamento e Orçamento Federal; Magistratura e o Ministério Público. Tais
evidências reforçam a tese de que o que está em jogo é também o apagar de
memórias e a recontagem da história oficial segundo a visão de mundo ora
instalada no poder.
Por sua vez, o assédio institucional de expressão moral
caracteriza-se por ameaças (físicas e psicológicas), cerceamentos,
constrangimentos, desautorizações, desqualificações e perseguições, geralmente
observadas entre chefes e subordinados (mas não só!) nas estruturas
hierárquicas de determinadas organizações públicas (e privadas), redundando em
diversas formas de adoecimento pessoal, perda de capacidade laboral e,
portanto, mau desempenho profissional no âmbito das respectivas funções
públicas. No interior do setor público, geralmente, assédio organizacional e
assédio moral estão correlacionados, caracterizando o que aqui chamamos, de
modo mais amplo, de assédio institucional no setor público.
Sendo este, portanto, fenômeno novo e perturbador no
interior do setor público brasileiro, com formas de manifestação diversas e
consequências deletérias ao bom funcionamento de organizações estatais e ao
desempenho profissional adequado de seus servidores, é que a Afipea-Sindical
considerou necessário um destaque especial ao tema, até mesmo para que possamos
ter registros documentais, relatos fáticos de situações dessa natureza,
interpretações e proposições condizentes com a gravidade do fenômeno e suas
nefastas consequências para o Estado brasileiro e sua administração pública
cotidiana.
Que o governo Bolsonaro/Guedes não tenha quadros adequados e
nem competência técnica ou sensibilidade social para governar o Brasil, já é
algo público e notório. A novidade ruim é que agora, alastrando a prática do
assédio institucional (organizacional e moral) por todo o setor público, eles
pretendam tentar esconder o fracasso de seu projeto de país.
Dessa forma, somos forçados a concluir que o atual governo
caminha rapidamente para uma estratégia de acirramento de contradições relativamente
aos segmentos da sociedade não alinhados a seu projeto de poder. Mas sendo tais
segmentos mais numerosos e representativos da diversidade brasileira que os
seus seguidores, deverá haver uma inclinação autoritária crescente por parte
das frações de classe no poder, com vistas a impor – até mesmo pela força bruta
– os seus anseios e projetos.
Oxalá a comunidade internacional democrática e a sociedade
brasileira consciente do perigo autoritário/totalitário em curso possam
rapidamente perceber a abrangência, a profundidade e a velocidade dessa agenda
retrógrada para então se reorganizarem coletivamente e se reposicionarem
politicamente com vistas à recuperação das tendências recentes de construção da
República, da Democracia e do Desenvolvimento no espaço nacional.
Artigo: José Celso Cardoso Jr. – Presidente da
Afipea-Sindical
Fonte: FONACATE