Correio Braziliense
- 21/06/2012
O cidadão obrigado a recorrer a serviços públicos já ruins
sabe que, assim como a primavera, o verão, o outono e o inverno, todos os anos
há uma espécie de estação das greves. Uma hora, a correspondência não vai
chegar; as filas para exames e consultas, assim como a espera pelo transporte,
parecerão eternas; escolas de todos os níveis terão o calendário alterado; as
perícias do INSS serão sucessivamente remarcadas; os pedidos de aposentadoria,
retardados; a tramitação de ações judiciais, adiada; a arrecadação de tributos,
suspensa; as operações em bancos oficiais, impossibilitadas; a segurança
pública, fragilizada; o fornecimento de água e luz, cortado; o lixo, acumulado;
e por aí afora. Enfim, o contribuinte, acostumado ao purgatório, terá sua temporada
de inferno.
Greve é direito legítimo de todo trabalhador, assegurado
pela Constituição. Porém, a Carta Magna de 1988 remete para o Congresso
Nacional a obrigação de regulamentar essa garantia em relação ao setor público,
o que, quase 24 anos depois, continua pendente. Até porque o Executivo tampouco
se empenha. No vácuo, o Supremo Tribunal Federal determinou que se aplique a
lei de greve vigente para a iniciativa privada.
A solução provisória,
obviamente, é precária. Quando se trata de governos, a paralisação, mais do que
a patrões, empregados e clientes, atinge toda a sociedade. Às vezes é questão
de vida ou morte para o contribuinte. Não raro, traz prejuízos significativos
para a máquina estatal. No limite, ameaça o Estado de Direito, como quando a PM
baiana cruzou os braços, recentemente, e a desordem campeou, com uma onda de
saques e outras violências, incluindo assassinatos.
Pois o caos voltou a brilhar ameaçador no horizonte da
pátria na segunda-feira. Nesse dia foi declarada aberta nova estação das
greves, com a adesão imediata de seis ministérios (Saúde, Previdência, Justiça,
Trabalho, Relações Exteriores e Desenvolvimento Agrário) e três órgãos
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Fundação Nacional de
Saúde e Arquivo Nacional). A ideia do comando é, em efeito dominó, a partir das
capitais, ir parando o país, até a generalização do movimento. Uma rodada de
negociações com o governo federal está prevista para hoje. Mas, se não tiveram
capacidade de evitar que a questão alcançasse tal nível de complexidade, é
difícil imaginar que as autoridades federais agora tenham solução para o
impasse. Ou seja, transtornos à vista para todos, sem lei que estabeleça
parâmetros para o funcionamento mínimo da máquina.
O quadro é ruim também para os grevistas, postos em situação
de insegurança jurídica. Como reivindicar dentro da legalidade, se não existe
legislação que determine desde como formalizar a paralisação até o percentual
mínimo de servidores a ser mantido em serviço? Qual o limite a ser respeitado e
que tipo de sanção admitir em caso de a medida ser extrapolada? A demissão,
prevista na Lei nº 7.783, de 1989, referente à iniciativa privada, é aplicável?
E o corte do ponto, com o não pagamento dos dias parados? São muitas as dúvidas
a responder, pantanoso o terreno para o qual o funcionário público é empurrado
no gozo de um direito que lhe é plenamente garantido pela Constituição.
Portanto, que se apresse o Congresso em cumprir o previsto no inciso VII do
artigo 37 da Carta, aprovando lei complementar que regulamente a greve no
âmbito estatal. E que o Executivo busque soluções perenes, como planos de
carreira que contemplem as categorias, encerrando as repetitivas e desgastantes
disputas.