Correio Braziliense - 05/11/2010
Na primeira entrevista coletiva à imprensa, Dilma Rousseff anunciou rumos a serem adotados no governo que se inicia em 1º de janeiro de 2010. Entre eles, chamou a atenção assunto bastante espinhoso. Trata-se do renascimento da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, a malfadada CPMF. A extinção do tributo há quase dois anos constituiu alívio para a economia, que se livrou do efeito cascata que onerava todas as fases do processo de produção.
Apesar do indiscutível benefício para o ambiente de negócios, o fim da CPMF parece não ter sido digerido pelo governo petista. O presidente Lula ressente-se até hoje da derrota sofrida no Congresso. Daí talvez a defesa apaixonada que faz do retorno do imposto para garantir investimentos na saúde. Na oportunidade, criticou o egoísmo dos congressistas: os parlamentares, segundo ele, têm acesso aos meios mais sofisticados da saúde, mas negam o direito ao povo ao sonegar os recursos destinados à pasta.
Dilma Rousseff se disse preocupada com a recriação da CPMF. Mas não fechou as portas para iniciativas que visem à recomposição do tributo.
Passou a responsabilidade aos governadores que, segundo ela, se movimentam na busca de mais verbas. Em bom português: no discurso, o Executivo federal compreende a situação dos estados e não se oporá ao retorno da contribuição. Não apresentará o projeto ao Congresso, mas o apoiará.
A realidade, porém, é outra. O governo precisa desesperadamente de receita para tapar o rombo decorrente da gastança dos últimos dois anos para inflar a candidatura Dilma. A fim de manter a credibilidade, tem de apresentar superavit primário de 3,3% do PIB no primeiro ano de mandato. Mas nem o recorde de arrecadação será suficiente para cumprir tal meta.
Tanto que, nos últimos meses, o Tesouro Nacional foi obrigado a recorrer a manobras fiscais para apresentar a esperada economia para o pagamento de juros da dívida pública. A fim de se ter uma ideia do excesso de despesas, só o reajuste dos servidores custará ao governo, em 2010, nada menos de R$ 11 bilhões.
A saída encontrada é a mais fácil — aumentar a já escorchante carga tributária. O movimento é, no mínimo, frustrante. Os brasileiros elegeram novos governantes na esperança de ajudar o país a ocupar melhor lugar em rankings importantes no cenário internacional. Entre eles, três sobressaem — competitividade, custo de produção e ambiente de negócios. A volta da CPMF vai de encontro às expectativas. Mais: não significa que a saúde melhorará nem que os recursos serão destinados ao setor. O passado serve de prova.