Autor(es): DIEGO
ABREU e CRISTIANE BONFANTI
Correio Braziliense
- 02/09/2011
PLANALTO CEDE AO
JUDICIÁRIO
Um dia depois de anunciar o Orçamento e dizer que em 2012
não haveria reajuste para ministros do Supremo Tribunal Federal e para
servidores do Judiciário, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, se viu
obrigada a voltar atrás na decisão. A dura reação de integrantes do STF causou
tanto mal-estar na Esplanada que a presidente da República precisou intervir.
Prestes a embarcar para São Paulo, o ministro Guido Mantega foi convocado às
pressas por Dilma para dar um jeito de encaixar a proposta do Judiciário na
peça orçamentária e acabar com o impasse. No fim do dia, Miriam e os ministros
José Eduardo Cardozo (Justiça) e Luís Inácio Adams (AGU) foram conversar com o
presidente da Suprema Corte, Cezar Peluso, e lá garantiram: o projeto,
exatamente como foi apresentado pelo Judiciário, será encaminhado hoje ao
Congresso.
Após forte reação do presidente do Supremo, Dilma manda
reinserir propostas de aumento no Orçamento da União
O Judiciário conseguiu virar o jogo e incluir no Orçamento
da União de 2012 os pedidos de reajustes salariais para os ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF) e para seus servidores. Ao divulgar, anteontem, a peça
orçamentária, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, foi incisiva e disse
que a pasta havia excluído as previsões no projeto encaminhado ao Congresso
Nacional. "Não é adequado", afirmou ela, na ocasião, em referência ao
momento de ajuste fiscal. Mas a decisão causou tamanho mal-estar entre o
Executivo e a mais alta Corte de Justiça que a presidente Dilma Rousseff precisou
intervir.
Ontem, Dilma mandou o ministro da Fazenda, que estava a
caminho de São Paulo, cancelar o voo e ir para a Casa Civil. O comando foi para
que o auxiliar desse um jeito de incluir a proposta do Judiciário no Orçamento
e reverter a situação. No fim do dia, ao lado dos ministros José Eduardo
Cardozo (Justiça) e Luís Inácio Adams (Advocacia-Geral da União), Miriam foi
conversar com o presidente da Suprema Corte, Cezar Peluso, e garantiu que
encaminhará ao Congresso, hoje, uma mensagem para que o Legislativo considere o
reajuste salarial assim como havia sido apresentado pelo Judiciário.
A mudança veio depois das críticas feitas por Peluso.
Visivelmente contrariado, o presidente do STF disse não ter dúvida de que o
Executivo revisaria a questão. "Parece que houve um pequeno equívoco que o
Executivo vai retificar, sem dúvida. Nem precisava receber comunicação. É uma
coisa óbvia. Houve um pequeno equívoco", afirmou o ministro na tarde de
ontem.
A posição do governo, no entanto, foi tomada com bastante
clareza. Na terça-feira, Peluso recebeu quatro ministros em seu gabinete. Na
ocasião, ele foi comunicado de que o Orçamento de 2012 não contemplaria o
aumento salarial de 14,79% para os ministros do STF e de 56% para os servidores
da Casa. A proposta orçamentária, apresentada por Peluso no começo de agosto,
prevê um salto de R$ 26,7 mil para R$ 30,6 mil no salário dos magistrados da
Suprema Corte. O impacto total dos reajustes é estimado em R$ 8 bilhões.
Equilíbrio
O ministro do STF Marco Aurélio Mello foi irônico quando
questionado sobre a possibilidade de ter havido algum "equívoco" na
preparação do Orçamento, como citou o colega Peluso. "De bens
intencionados, o Brasil está cheio. A quadra que vivenciamos é um tanto quanto
estranha. Não se pode atropelar a Constituição", respondeu. Ele observou
que a Constituição não permite ao Executivo revisar o Orçamento apresentado
pelo Judiciário.
Para o ministro, o corte não saiu do "âmbito
técnico-burocrata", mas da Presidência da República. "O ruim é que,
frente ao leigo, que não percebe que, acima de tudo, devemos preservar a
Constituição, a bandeira do Judiciário não é boa. Ao contrário, é capaz de
acharem que nós somos perdulários. Não é isso. O que está em jogo não é
pecúnia, não é dinheiro, não é gasto. O que está em jogo é o princípio que
implica equilíbrio, que se faz ao mundo jurídico para que não haja supremacia
de poderes que estão no mesmo patamar", ressaltou Marco Aurélio.
Repúdio
O atropelo feito pelo Ministério do Planejamento também
desagradou a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e do
MPU (Fenajufe). Ramiro López, coordenador da entidade, observou que, embora
seja reticente quanto ao assunto, o Executivo, via de regra, se comporta dentro
da lei. "É um procedimento contrário à Constituição. Nossa posição é de
repúdio. Não esperávamos essa atitude", disse.
O bate-boca também envolveu os integrantes do Movimento
Pró-Subsídio, que defendem uma mudança no modelo remuneratório do Judiciário.
Para o analista judiciário Rodrigo Barros, integrante do grupo, o governo
federal retrocedeu para evitar uma crise institucional. "Agora, temos a
perspectiva de aprofundar os debates sobre um novo sistema de
remuneração", afirmou. A ideia é que, em vez de ter um reajuste linear de
56%, os servidores passem a receber por meio de subsídio — pagamento com um
teto incluindo o vencimento básico e uma série de gratificações. Essa parcela
só não englobaria valores indenizatórios, como auxílio-alimentação,
auxílio-creche, vale-transporte e 13º salário.
Assim, funcionários mais antigos, que incorporaram
gratificações (a última vantagem foi extinta em 1999), ficarão com os salários
congelados se suas remunerações ultrapassarem o teto do subsídio. A
possibilidade está prevista em uma emenda do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG)
ao Projeto de Lei nº 6.613/09, que está parado na Câmara e altera o plano de
carreira dos servidores do Judiciário. O projeto original não altera o modelo
de remuneração. Mas a emenda estabelece subsídio com teto de R$ 11,5 mil para
os técnicos e de R$ 18,4 mil para os analistas.
A estimativa é de que, hoje, 60% dos 121,5 mil ativos do
Poder sejam mais antigos na carreira e tenham gratificações incorporadas.
Alguns mais antigos têm mais de 15 rubricas no contracheque, entre vencimento,
gratificações e vantagens pessoais. Os outros 40% dos servidores, que
ingressaram no funcionalismo sem esses benefícios, ganham proporcionalmente
menos. As possíveis alterações, no entanto, são polêmicas. Entre os órgãos
contrários está o próprio STF.
Correndo por fora
Como o governo incluiu no Orçamento de 2012 correção
salarial somente para metade dos servidores (ativos e inativos) do Executivo,
algumas categorias correram, na última hora, para apresentar ao Congresso
projetos de lei dentro do prazo final para entrar na Lei Orçamentária do ano
que vem. Diante do impasse quanto ao aumento dos vencimentos dos juízes em
cerca de 14,8%, que já tramita na Câmara, até o Supremo Tribunal Federal (STF)
protocolou nova proposta, prevendo correção de 4,8% no vencimento de seus
ministros. A Mesa da Câmara também quer alterar novamente o plano de cargos e
salários para seus funcionários, estabelecendo aumento de até 108%. O
Ministério Público da União (MPU) saiu na frente da turma do Judiciário e
propôs o pagamento em forma de subsídio para seus servidores, prevendo um
reajuste médio de 100%.