Cristiane Bonfanti
Correio Braziliense - 28/11/2011
SEM ESPAÇO PARA TANTA BUROCRACIA
Com 38 ministérios e a incorporação de 221 mil servidores,
as despesas da União com salários subiram 172% desde 2002. Segundo dados da
organização não governamental Contas Abertas. Só em Brasília, no Executivo,
entraram mais de 20 mil funcionários. Para acomodar tanta gente, a Esplanada
dos Ministérios já não é suficiente. Os gastos com alugueis de prédios chegaram
a R$ 652 milhões, um acréscimo de 136,8% em cinco anos. Diante da necessidade
de cortar gastos, o governo já cogita unificar secretarias, entre outras mudanças
Em nove anos, surgiram 12 novos cargos de ministros e foram
incorporados 221 mil servidores em todo o país. Gastos da União com pessoal e
com aluguéis de prédios mais que dobraram desde 2002
A Esplanada dos Ministérios ficou pequena para tanta
burocracia. O setor idealizado por Lúcio Costa não acomoda mais sequer os
assessores diretos da presidente Dilma Rousseff. De 2002 para cá, o número de
ministros saltou de 26 para 38. Sem espaço, ao menos oito deles precisam
despachar fora do coração de Brasília. Nos últimos nove anos, foram
incorporados 221 mil novos servidores ativos na máquina federal dos três
poderes em todo o país — um contingente equivalente à população de Presidente
Prudente, em São Paulo, ou de Taguatinga. Desse total, 21,7 mil foram lotados
em Brasília. A fatura do inchaço já chegou: uma folha de pessoal ativo atual de
R$ 118 bilhões, 172% maior do que a de 2002, e uma conta astronômica com
aluguéis de imóveis, para acomodar tanta gente.
Dados da organização não governamental Contas Abertas
revelam que os gastos da União com locação de prédios no Brasil e no exterior,
para abrigar os novos servidores do Executivo, Legislativo e Judiciário,
saltaram 114,3% de 2006 a novembro de 2011 — de R$ 304,6 milhões para R$ 652,8
milhões. A maior parte desse montante foi para o bolso de proprietários de
prédios no Distrito Federal: 28,5% ou R$ 185,9 milhões. O Ministério do
Planejamento informou que somente as despesas do Executivo com aluguéis
passaram de R$ 244,6 milhões em 2006 para R$ 548,6 milhões neste ano, 124%
mais, bem acima dos 36% do índice que corrige os contratos. Em 2002, o montante
era bem menor, R$ 216,2 milhões — menos da metade da cifra atual.
Os dados mostram a distorção das prioridades da equipe da
presidente Dilma. O dinheiro utilizado com aluguéis de janeiro a novembro deste
ano é quase igual ao investido no Programa Nacional de Inclusão de Jovens
(ProJovem), que recebeu R$ 696,6 milhões, e bem maior que o destinado ao Brasil
Alfabetizado e Educação de Jovens e Adultos, para o qual foram repassados R$
508,2 milhões. Para o de Educação na Primeira Infância, o governo executou
míseros R$ 525 mil.
De janeiro a novembro, a União destinou R$ 490,4 milhões ao
programa de Controle Interno, Prevenção e Combate à Corrupção, prática nociva
que desvia dos cofres do governo federal ao menos R$ 6 bilhões por ano. O
dinheiro gasto com os aluguéis é mais que o dobro do investido para erradicação
do trabalho infantil e 84 vezes maior que o do programa para acabar com o
trabalho escravo no Brasil, país que ainda abriga 20 mil empregados em
condições degradantes.
Apesar das torneiras dos cofres abertas, a máquina pública
continua cara e ineficiente. Com carga tributária de primeiro mundo, equivalente
a 37% do PIB, o brasileiro padece com a qualidade sofrível dos serviços
públicos que recebe. "O Brasil arrecada como um país escandinavo,
semelhante à Suécia, mas presta um serviço um pouquinho pior", ironizou
André Esteves, presidente do Banco BTG Pactual, durante a comemoração dos 60
anos da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Gigantismo
O secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello
Branco, observa que o gigantismo do governo acarreta outros custos em toda a
máquina administrativa. "Aparentemente, não há essa consciência de que o
inchaço do governo traz outras despesas. Mas há gastos com diárias, passagens,
cópias, energia elétrica, com tudo", afirma o economista.
Somente a folha de pagamento de pessoal mostra o desequilíbrio
fiscal da gestão Lula nos últimos anos de seu governo. Entre 2002 e 2011, a
despesa anual com salários de funcionários ativos e inativos dos três poderes
subiu 152%, de R$ 75 bilhões para R$ 196 bilhões — enquanto isso, o crescimento
médio anual do Produto Interno Bruto (PIB) foi de 4%.
No mesmo período, a quantidade de servidores em atividade e
aposentados nos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário passou de 1.855.966
para 2.087.374. Entre os ativos, o acréscimo foi de 24,2%, de 912.192 para
1.133.156. Isso tudo sem falar nos postos que não exigem concurso. A quantidade
de cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) passou de 18.374 para
21.976, dos quais 5.880 são ocupados por funcionários sem vínculo com a
administração.
Na avaliação de Castello Branco, a finalidade da expansão
dos órgãos públicos é muito mais atender a interesses políticos do que
priorizar setores. Ele observa que, considerando um mês com 22 dias úteis, se a
presidente Dilma despachar com um ministro por dia, ela levará mais de um mês e
meio para falar com todos. "A realidade é que tem ministro que despacha
com ela uma vez por semestre. Alguns apenas a encontram em solenidades
oficiais", afirma.
Mais pastas
O descontrole começou no governo Lula, que recebeu a máquina
com apenas 26 ministros. Logo em 2003, criou-se o Ministério do Combate à Fome,
depois transformado em Desenvolvimento Social. No mesmo ano, ele desmembrou o
Ministério do Esporte e Turismo em dois e deu status de ministro aos chefes das
secretarias de Direitos Humanos, Políticas para as Mulheres e Igualdade Racial.
Em 2004, o ex-presidente criou o Ministério do Desenvolvimento Social, que
passou a coordenar os programas sociais do governo, e deu status de ministro ao
presidente do Banco Central. Em 2007, o Palácio do Planalto tirou a gestão dos portos marítimos do
Ministério dos Transportes e criou a Secretaria de Portos, além da de Assuntos
Estratégicos. A Secretaria de Pesca, cujo comandante já tinha status de ministro,
virou Ministério da Pesca em 2009.
Não bastassem os novos órgãos, neste ano, a presidente Dilma
criou a Secretaria de Aviação Civil, o 38º ministério, mais que o dobro dos que
existem nos Estados Unidos. Agora, o projeto de lei que institui a Secretaria
de Micro e Pequena Empresa aguarda aprovação no Congresso. "Dar a um
secretário o patamar de ministro implica abrir mais salas, ter mais assessores
e linhas de telefone. A mudança se reflete em vários itens da máquina",
destaca o secretário-geral do Contas Abertas.
Diante da necessidade de cortar gastos, o Palácio do
Planalto já cogita unificar as secretarias de Direitos Humanos, Igualdade
Racial e Políticas para Mulheres na reforma ministerial a ser promovida no
início de 2012. Outra mudança em estudo é a reincorporação da Secretaria de
Portos pela Pasta dos Transportes.
Representação pesada
Historicamente, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) é
o que mais gasta com locação de imóveis, por causa das representações
diplomáticas no exterior. De janeiro a 23 de novembro deste ano, a despesa do
órgão chegou a R$ 102,4 milhões, um pouco acima dos R$ 100,8 milhões destinados
ao programa de Gestão da Política da Educação no mesmo período. Depois do
Itamaraty, a pasta que mais paga aluguel é o Ministério da Fazenda, com R$ 75,2
milhões, seguido da Presidência da República (R$ 73,3 milhões) e do Ministério
da Educação (R$ 43,1 milhões).