Cristiane Jungblut
O Globo - 09/02/2012
Magistrados querem previdência diferenciada
Presidente da Câmara, Marco Maia adia votação sobre fundo
complementar para servidores públicos e irrita Dilma
BRASÍLIA - As entidades representativas de juízes e
magistrados anunciaram ontem que são contra o projeto que cria o Regime de
Previdência Complementar do Servidor Público e ameaçam recorrer ao próprio
Poder Judiciário, caso essa proposta seja aprovada e se torne lei. Em nota, a
Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Juízes
(Ajufe) e a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) afirmaram
que a previdência dos magistrados deve ser tratada em lei complementar e não
por lei ordinária.
Eles querem um tratamento diferenciado no novo regime de
previdência do servidor público. O Palácio do Planalto pressionou a Câmara para
votar o projeto ainda ontem, mas não conseguiu.
O adiamento gerou um malestar entre o Planalto e o
presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS). À noite, o líder do governo
na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-RS), foi chamado ao Planalto para
tratar do assunto. A presidente Dilma Rousseff não autorizou acordo com o PSDB
e outros quatro partidos, que sugeriram deixar a votação para depois do
carnaval. Diante do adiamento de ontem, o governo tentará votar na próxima
terçafeira, mas deve ficar mesmo para depois do Carnaval.
Apesar de o rombo do atual regime do servidor ser hoje de R$
60 bilhões, incluindo civis e militares, as entidades que representam os
magistrados alegam que a previdência da magistratura é superavitária e ameaçam
ir ao Supremo Tribunal Federal contra a nova lei: "As entidades defendem a
manutenção da previdência pública e consideram que, por disposição
constitucional, o regime de previdência da magistratura não pode ser tratado
por lei ordinária, o que desafia, em caso de inclusão dos membros do Poder
Judiciário no referido projeto, questionamentos perante o Supremo Tribunal
Federal", diz a nota.
Para o presidente da Anamatra, Renato Sant"Anna, o
projeto contraria os princípios constitucionais de vitaliciedade e de
irredutibilidade dos vencimentos dos juízes. Para ele, acabando com esse
princípio, se poderá criar juízes de duas categorias: os atuais, que
permanecerão nas regras atuais, e os novos, que seriam submetidos ao novo
regime — regra que valerá para todos servidores públicos.
— Poderia se criar juízes de primeira e de segunda
categorias, e vamos ao Supremo impedir isso — disse o presidente da Anamatra.
Na mesma linha, o presidente da Ajufe, Gabriel Wedy, disse
que os magistrados contribuem com 11% dos seus vencimentos, e que a
Constituição prevê que eles tenham uma previdência pública.
— Essa questão não pode ser trada por lei ordinária, como o
projeto de lei, apenas por lei complementar. Se for sancionada, vamos impugnar
através de uma Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) — disse Wedy.
As entidades reclamam que não foram ouvidas no debate.
Nas discussões com o governo, o representante do Poder
Judiciário foi o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello.
Por insistência do Supremo, o texto original do projeto foi
modificado e permite a criação de até três fundos de previdência, um para cada
Poder. O Judiciário queria um fundo separado, o que foi atendido pelo relator
da proposta, o ex-ministro da Previdência, Ricardo Berzoini (PT-SP).
Mas, para as entidades, isso não resolve a questão. Eles disseram
que há preocupações ainda com violações da Lei de Responsabilidade Fiscal e
pregam mais diálogo: "Conclamamos o governo federal e o Parlamento a
debaterem o assunto de forma democrática, de modo a extrair das discussões o
necessário amadurecimento, evitando conflagrações desnecessárias, que têm se
tornado a marca das relações entre o poder público e o seu corpo funcional nos
últimos tempos"