Falta gente para elaborar projetos
Gabriela Valente, Danilo Fariello, Vivian Oswald
O Globo - 14/07/2012
Técnicos ameaçam com greve e presidente é pressionada a abrir concursos
BRASÍLIA - No momento em que incentivar investimento virou consenso, a presidente Dilma Rousseff tem sido pressionada por técnicos para autorizar mais concursos pois - segundo eles - falta gente para elaborar e aprovar projetos importantes, sobretudo de infraestrutura.
De janeiro a março deste ano, o Executivo perdeu quase 9 mil funcionários públicos. A maioria se aposentou.
Os interlocutores já avisaram Dilma que está difícil cumprir rapidamente a tarefa de criar um grande cronograma de concessões e licitações para destravar os investimentos com foco em 2013, porque pastas como Cultura e Meio Ambiente receberam mais mão de obra do que as áreas de infraestrutura. Atentos ao momento, os técnicos do setor ameaçam entrar em greve, o que comprometeria ainda mais o andamento do PAC.
A execução dos investimentos está aquém do que quer o governo. Dos R$ 17,7 bilhões que o Ministério dos Transportes tem para investir, apenas R$ 3,6 bilhões foram empenhados até maio. Já a pasta da Integração Nacional empenhou somente R$ 1,1 bilhão dos R$ 6,5 bilhões reservados no Orçamento. O Ministério das Cidades empenhou R$ 976 milhões dos R$ 17,3 bilhões.
Os servidores que intimidam o governo com a promessa de cruzar os braços tiveram a carreira criada em 2007. Esses funcionários públicos, espalhados pelos ministérios de Transportes, Minas e Energia, Cidades e Integração Nacional, compõem mão de obra especializada nos empreendimentos do PAC e se queixam da remuneração.
Segundo a Associação Nacional dos Analistas e Especialistas em Infraestrutura (Aneinfra), a cada ano 30% dos profissionais deixam a carreira em busca de concursos do Tribunal de Contas da União, da Controladoria-Geral da União ou partem para a iniciativa privada em busca de pagamentos maiores. No último concurso para auditores do TCU, por exemplo, dos 21 aprovados, sete eram analistas de infraestrutura.
Os concursos e nomeações sequer repõem essa evasão, diz Guilherme Floriani, presidente da Aneinfra.
- Esse problema de recursos humanos prejudica a tentativa de acelerar projetos de infraestrutura e o PAC.
Dilma tem ouvido que está na hora de recompor o quadro, para dar vazão aos investimentos. Nos últimos quatro anos, o Ministério das Cidades perdeu 157 servidores. Em três anos, Transportes perdeu 435 pessoas, e a pasta da Integração Nacional ficou sem 226 pessoas.
Segundo um interlocutor da presidente, o Ministério dos Transportes está parado. Já o da Integração Nacional nunca esteve tão esquecido e perdeu os melhores técnicos para órgãos com atuação mais forte.
— Há alguns anos, esse ministério está sendo sucateado e transformado em trampolim político, mas agora chegou a um ponto que a última coisa que a pasta faz é a sua função primordial: pensar o desenvolvimento regional – disse um ex-integrante do alto escalão do ministério.
A pressão deve fazer com que o concurso para o Dnit — que está parado desde os escândalos do ano passado — saia do papel. Desde 2008, o governo autorizou apenas três concursos para área de infraestrutura. Foram criados mais cargos para áreas como Cultura, Meio Ambiente e Previdência nesse período.
— Para o investimento ocorrer, tem de ter antes um gasto de custeio — disse uma outra fonte graduada do governo.
Sala de concursados aprovados vira ‘lan house’
Um retrato da ineficiência da área virou chacota nos corredores de Brasília. Um grupo de recém-concursados passou meses em uma sala à espera de trabalho durante muito tempo até o ano passado. O lugar foi apelidado de lan house, porque a única atividade era navegar na internet, à espera de um compromisso.
Técnicos relatam a paralisia nas coisas mais cotidianas: como a compra de material de escritório para um dos ministros de maior peso na Esplanada. O cargo do servidor responsável para liberar o gasto está vago.
A presidente cobra que os técnicos da ativa montem o cronograma para acelerar investimentos: devem apresentar perspectivas para elevar as expectativas das empresas e tenta manter recursos no país enquanto houver pressões de saída de dinheiro que levam à desvalorização do real no curto prazo.
— A expectativa muda o sinal da economia para a frente. Tem que haver uma programação para os agentes econômicos começarem a se movimentar. Só assim eles terão a garantia de que as oportunidades vão acontecer — admitiu um integrante do governo.