Gil Castello Branco
O Globo - 26/02/2013
A democracia não tem preço, mas o Legislativo brasileiro tem
custo elevado. No ano passado, as despesas da Câmara dos Deputados, do Senado
Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU) atingiram R$ 9 bilhões, montante
equivalente aos dispêndios integrais de seis ministérios: Cultura, Pesca,
Esporte, Turismo, Meio Ambiente e Relações Exteriores.
Neste ano, somente os gastos das duas Casas Legislativas,
excluindo o TCU, deverão alcançar 8,5 bilhões. Assim sendo, chova ou faça sol,
trabalhem ou não suas Excelências, cada dia do parlamento brasileiro custará R$
23 milhões, ou seja, quase um milhão por hora!
Estudo realizado no ano passado pela Organização das Nações
Unidas (ONU) em parceria com a União Interparlamentar revelou que o
congressista brasileiro é um dos mais caros do mundo. No campeonato de 110
países, o Brasil ganhou a medalha de prata no ranking dos custos por
parlamentar, atrás apenas dos Estados Unidos. Na classificação dos custos por
habitante, ocupamos a 21ª posição.
Dentre as Casas, a vilã do momento é a Câmara que custou aos
contribuintes R$ 4,3 bilhões em 2012, montante superior em R$ 400 milhões à
média de R$ 3,8 bilhões dos últimos dez anos. Já no Senado, em função dos
escândalos de 2009, as despesas vêm caindo e, no ano passado, foram as menores
desde 2010, totalizando R$ 3,4 bilhões.
Considerando os 15.647 servidores da Câmara e os 6.345 do
Senado, o Congresso é uma "cidade" com quase 22.000 funcionários
efetivos e comissionados. A título de comparação, dentre os 5.570 municípios do
País, apenas 27% possuem mais habitantes. Em 2012, o custo de "pessoal e
encargos sociais" no Congresso Nacional foi de R$ 6,4 bilhões, o que
correspondeu a 84% da despesa global. A conta inclui salários, gratificações,
adicionais, férias, 13º salário e outras vantagens. Só pelo trabalho noturno,
Câmara e Senado pagaram R$ 4,5 milhões em 2012.
Comparativamente, o Legislativo é o campeão de salários
médios entre os Poderes. Em dezembro de 2012, segundo o Ministério do
Planejamento, a média salarial do Legislativo foi de R$ 16,3 mil, mais do que o
dobro dos R$ 6,7 mil que ganham os servidores do Executivo. No Judiciário, a
média é de R$ 13,5 mil.
Por vezes, as despesas do Parlamento são extravagantes e
curiosas. No ano passado, somente com horas extras foram pagos R$ 52 milhões. A
Câmara dos Deputados foi responsável por R$ 44,4 milhões desse montante. O
Senado comemorou a economia de R$ 35 milhões que obteve após implementar o
"banco de horas". A ideia poderia ser adotada pelos vizinhos. Outro
absurdo é a existência de 132 apartamentos funcionais vazios, aguardando uma
reforma que não tem data para começar, enquanto são gastos R$ 8,3 milhões/ano
com os pagamentos de auxílio-moradia a parlamentares.
Na semana passada, pressionado por manifesto popular com 1,6
milhão de assinaturas, o presidente do Senado anunciou corte de R$ 262 milhões
nas despesas da Casa, a começar por 500 funções de chefia e assessoramento. Já
era tempo. A gastança é tal que no último ano as gratificações por exercício de
cargos e funções totalizaram R$ 683,1 milhões, quase três vezes o montante dos
salários, que alcançou R$ 249,2 milhões. Ao que parece, o Senado, além de
muitos índios, tem centenas de caciques.
Além disso, o novo presidente afirmou que reduzirá gastos
com serviços médicos e terceirizados. Apesar das boas intenções, até o momento
a contenção de despesas limitou-se à demissão de duas estagiárias. A intenção
de Renan Calheiros é, por meio da transparência, reaproximar o Senado da
sociedade brasileira. É bom que comece pelo próprio gabinete, informando, por
exemplo, quais os serviços que lhe presta escritório de advocacia em Alagoas
que recebe há mais de um ano R$ 8 mil mensais da chamada "verba
indenizatória".
Enfim, há muito o que melhorar no Congresso Nacional. A
redução das despesas é necessária, mas não é o mais importante. Urgente é que
os princípios constitucionais de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência sejam aplicados tanto pelas Casas quanto pelos
deputados e senadores. O Judiciário pode auxiliar julgando os quase 200
parlamentares que respondem a inquéritos ou ações penais no Supremo Tribunal
Federal. Na pauta, crimes contra a administração pública, homicídio, sequestro
e tráfico. O saneamento do Legislativo é essencial para conter o desgaste
progressivo de sua imagem. Afinal, a democracia não tem preço. Pior do que o
atual Congresso Nacional só a sua ausência.