Canal Aberto Brasil
- 25/09/2017
A Lei nº 8.112/1990, Estatuto do Servidor Público,
estabelece, em seu art. 138, que configura abandono de cargo a ausência
intencional do servidor ao serviço por mais de 30 dias consecutivos. O abandono
de cargo é uma das causas de demissão do servidor público, conforme estabelece
o art. 132, inc. II, do mesmo texto legal.
Uma vez detectado o abandono de cargo, deverá ser instaurado
um processo administrativo disciplinar em procedimento sumário para a apuração
do caso concreto, que deverá ocorrer em três etapas: instauração, instrução
sumária – indicação, defesa e relatório – e julgamento. A materialidade, nesses
casos, será apurada pela indicação precisa do período de ausência intencional
do servidor ao serviço superior a 30 dias.
O art. 142 dispõe sobre a prescrição nos casos de infrações
disciplinares. Assim preceitua o texto legal:
Art. 142. A ação
disciplinar prescreverá:
I – em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com
demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo
em comissão;
[…]
1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o
fato se tornou conhecido.
O tema foi alvo de parecer da AGU para esclarecer o início
da contagem desse prazo. Isso porque não era pacífico o entendimento sobre o
momento inicial para fins de estabelecer a prescrição no caso concreto. Em
parecer¹ publicado no Diário Oficial da União do dia 21 de setembro, foi fixado
o seguinte enunciado: “a infração de abandono de cargo é de caráter permanente,
tendo como termo inicial do prazo prescricional o dia em que cessar a
permanência”.
O parecer destaca que “o legislador federal ordinário
previu, por intermédio do art. 142, da Lei nº 8.112/90, a regra geral de
contagem dos prazos prescricionais sem adentrar, entretanto, nas
especificidades dos diversos ilícitos funcionais, como sói ocorrer no direito
penal”. Assim, buscou-se auxílio, por analogia, no Direito Penal. Isso porque,
conforme explicado, é possível observar uma intersecção entre o Direito
Administrativo sancionador e o Direito Penal, inclusive, sendo possível que
“uma mesma conduta amolde-se às duas disciplinas o que gera, por consequência
natural, a aplicação subsidiária de institutos do direito criminal no âmbito do
direito disciplinar, notadamente em razão de omissão legislativa na esfera
administrativa”.
Para corroborar o entendimento, o parecer traz decisão² do
Tribunal de Contas da União, que estabelece: “[…] o caso de omissão da Lei nº
8.112/90 e de suas alterações, aplicam-se, analógica e subsidiariamente, no que
couber, a juízo do Tribunal de Contas da União, as disposições contidas nas
normas do Poder Judiciário, em especial os Código Penal e de Processo Penal”.
Em relação ao caráter permanente da infração do abandono de
cargo, o parecer ressalta a diferenciação entre crime instantâneo de caráter
permanente e crime permanente, buscando os institutos do Direito Penal para
aplicá-los no caso descrito. Desse modo, fixa que não se pode identificar o
abandono de cargo como instantâneo de efeito permanente, pois necessita da
vontade do trabalhador para ocorrer. Inexistindo tal vontade, o abandono não se
caracteriza, por mais que seja elevada a quantidade de faltas, nem a situação
de permanência.
Assim sendo, reiterando o descrito acima, a AGU entendeu que
o fato de o abandono de cargo possuir a natureza jurídica de infração de
caráter permanente, o termo inicial do prazo prescricional, a exemplo dos
ilícitos criminais, somente se dará a partir do dia em que cessar a
permanência.
¹ PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Parecer nº GMF 06, de 18 de
setembro de 2017. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil,
Brasília, DF, 21 set. 2017. Seção 1, p. 06-10.
² TCU. Processo nº 3188/1997-3. Decisão nº 358/1998 –
Plenário. Relator: ministro Iram Saraiva.
Por J. U. Jacoby Fernandes