Consultor Jurídico
- 19/03/2018
O Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União
(CGU) divulgou recentemente o número de expulsões de agentes públicos do Poder
Executivo Federal em decorrência de envolvimento em atividades contrárias à Lei
8.112/1990 (Lei do Regime Jurídico dos Servidores), ocorridas durante o ano de
2017.
Segundo os dados publicados, foram 506 expulsões no total,
sendo 424 demissões de funcionários efetivos; 56 cassações de aposentadorias; e
26 destituições de ocupantes de cargos em comissão. A principal razão das
expulsões foi a prática de atos relacionados à corrupção, com 335 casos entre
as penalidades aplicadas, 66% do total. Os atos relacionados à corrupção são
aqueles como recebimento de vantagens indevidas; atos de improbidade
administrativa; atos de lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio
nacional; e valimento do cargo para lograr proveito pessoal. Vale lembrar que
esses dados não incluem os empregados de empresas estatais, como Petrobras,
Caixa Econômica Federal ou Correios, os quais são submetidos às regras e aos
procedimentos disciplinares próprios de cada uma dessas empresas.
Analisando-se os dados dos anos anteriores, verifica-se que
desde 2012 o número de punições decorrentes de atos relacionados à corrupção
mantém-se estável, com a média de 344,5 por ano. O ano de 2012 registrou o
menor número de demissões de servidores do Executivo Federal relacionadas à
corrupção, com 315 casos, enquanto 2013 teve o maior número, com 379 casos.
Ainda de acordo com o relatório publicado, desde 2003, já
foram punidos com expulsão devido a atos relacionados à corrupção o total de
4.453 agentes públicos do Executivo Federal. Para comparação, segundo esse
mesmo relatório, o número de servidores ativos ao final de 2017 era de 587.833.
Portanto, nesse período de tempo, um percentual abaixo de 1% do total de
servidores foi expulso em decorrência da prática de atos relacionados à
corrupção.
Os servidores punidos tiveram sua penalidade decretada após
processo administrativo disciplinar (PAD), nos termos da referida lei do Regime
Jurídico dos Servidores. O PAD garante os direitos de ampla defesa e
contraditório aos servidores processados e prevê, em caso de punição de
demissão, a inelegibilidade desses pelo prazo de oito anos, conforme o disposto
na Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa).
A título de comparação, a África do Sul teve aproximadamente
1.700 servidores públicos demitidos entre 2004 e janeiro de 2017 em razão de
atos de corrupção, após a implementação de um canal de denúncia para auxiliar
no combate à corrupção em seu setor público. No que se refere à percepção da
corrupção, Brasil e África do Sul estão relativamente próximos. A África do Sul
foi classificada em 64º lugar no ranking de Percepção da Corrupção da
Transparência Internacional de 2016, que analisou 176 países, enquanto o Brasil
foi classificado em 79º lugar.
Nesse sentido, estudos demonstram que o nível de corrupção de
um dado país, seja a pequena corrupção do dia a dia, seja a grande corrupção
descoberta em operações como a "lava jato", é impactado por fatores
variados. Um desses fatores é a sensação de impunidade, resultante da ausência
de punição efetiva e adequada. De acordo com Susan Rose-Ackerman, professora da
Yale University, nos Estados Unidos, quanto mais alta a probabilidade de a
corrupção ser detectada e punida, mais baixos serão os benefícios efetivos
disponíveis resultantes dela. Segundo ela, se a possibilidade de detecção e
punição é elevada, a oferta ou demanda pelo pagamento ou recebimento de
vantagens indevidas pode tender a zero. No Brasil, a impunidade nos âmbitos
penal, civil e administrativo tem um papel fundamental no nível de corrupção
que atingimos em todas as esferas.
Contudo, em um país que sofre com a corrupção como o Brasil,
onde a cada semana há um novo escândalo envolvendo o poder público, a
divulgação desses dados por parte da CGU é uma maneira de demonstrar que há, de
fato, combate à corrupção no Executivo Federal. Todavia, como bem demonstra
nossa posição no ranking da Transparência Internacional, ainda há muito a ser
desenvolvido em certas questões como a maior responsabilização (accountability)
dos agentes públicos e privados em razão dos atos de improbidade administrativa
ou atos corruptos por eles praticados, a detecção aprimorada desses atos e uma
maior efetividade e cumprimento (enforcement) das regras anticorrupção já
existentes em nosso ordenamento jurídico.
Por Alessandro Cruz e Marcelo Leite
Alessandro Cruz é associado da área de compliance de Trench
Rossi Watanabe.
Marcelo Leite é associado da área de compliance de Trench
Rossi Watanabe.