BSPF - 15/10/2019
O projeto de lei que trata da reforma da previdência dos
militares deveria ser revisto ou substituído porque é injusto, afeta direitos
adquiridos e exige sacrifício de todos os militares, mas só beneficia as altas
patentes. Esta foi a opinião unânime dos participantes da audiência pública
nesta terça-feira (15) para debater a chamada proposta de previdência dos
militares (PL 1.645/2019) ou Sistema de Proteção Social dos Militares das
Forças Armadas, que está prestes a ser votada em uma comissão especial na
Câmara dos Deputados.
Na audiência pública, promovida pela Comissão de Direitos
Humanos (CDH), os debatedores sugeriram que Câmara e Senado ouçam as
contribuições de todas as categorias para o aprimoramento do texto ou até mesmo
que o Executivo, autor da proposta, retire-a de tramitação e elabore uma nova,
com menos divergências, ouvindo os apelos e sugestões dos suboficiais.
— Hoje, diferentemente de 20, 30, 40 anos atrás, os
sargentos, os suboficiais, os cabos pensam. Têm postura, estudaram. Temos em
nosso meio mestres e doutores que podem contribuir, e não atrapalhar, para a
construção de melhorias na carreira militar. É para isto que chamo a atenção: o
mundo em que vivemos é aquele em que todos sentam para conversar, não cabe mais
no mundo atual a imposição de ideias — sugeriu o presidente da Federação
Nacional dos Graduados Inativos das Forças Armadas, Márcio Carvalho.
A mesma visão foi defendida pelo vereador de Guaratinguetá
(SP) Fabrício da Aeronáutica, que é militar da reserva, e pelo advogado
Cláudio Lino, presidente do Instituto Brasileiro de Análises de Legislações
Militares (Ibalm), para quem o projeto é “um remendo novo em roupa usada”.
— Tem que haver uma mudança, mas dentro de critérios, com um
estudo aprofundado, chamando militares da base para que a gente possa
contribuir e não saia uma legislação como esse projeto, uma verdadeira colcha
de retalhos — disse Lino.
Ele advertiu que a categoria irá recorrer ao Poder
Judiciário, se o projeto passar no Congresso com tantas brechas causadoras de
prejuízos, principalmente aos suboficiais e aos já reformados. Tanto o advogado
quanto o vereador frisaram que a proposta exige sacrifícios de todos da base,
mas os benefícios são direcionados aos graduados.
Conflitos
Alguns pontos conflituosos destacados na audiência foram a
cobrança de contribuição dos pensionistas, fazendo a lei retroagir — o que é
inconstitucional, de acordo com a advogada Solange de Jesus —, e o tratamento
diferenciado entre os militares do quadro especial, que entraram nas Forças
antes da Constituição Federal, e os oficiais, que ingressaram por concurso.
Outra crítica foi ao adicional de representação, que é mais alto para as
patentes elevadas e pode ser levado para a aposentadoria, situação que não se
repete para os demais militares.
Na reestruturação de carreira proposta pelo PL, os
adicionais mais substanciosos são garantidos a partir de cursos que não estão
disponíveis a todos, ou seja, não é qualquer militar que poderá “exercer a
meritocracia” e obter elevações em seus vencimentos progredindo nos estudos. Em
alguns casos, haverá até mesmo redução nos vencimentos, já que todos pagarão
contribuições maiores para a reforma, como é chamada a aposentadoria dos
militares, mas nem todos terão ganhos para contrabalancear, disseram debatedores.
— Meritocracia só tem para o pessoal do alto comando? Para o
soldado, o cabo e o sargento na fronteira, que estão patrulhando, não tem
meritocracia? — questionou o vice-presidente da Associação dos Militares
das Forças Armadas do Estado de São Paulo (Amfaesp), Vanderley Gonçalves.
Os militares do quadro especial são os que entraram durante
o serviço militar obrigatório antes de 1988 e permaneceram na carreira por suas
habilidades, como pintor, pedreiro, mecânico, datilógrafo, técnico em
contabilidade ou eletrônica, motoristas. Eles tiveram direito a uma ou duas
promoções em décadas de serviço, diferentemente dos que entraram pelas escolas
de carreira e que podem fazer cursos de altos estudos.
A redução do rol dos dependentes também é motivo de preocupação
para os militares. Hoje são 18 (pais e netos, irmãos, cunhados ou sobrinhos
menores ou inválidos e irmãs, cunhadas e sobrinhas solteiras ou viúvas sem
renda) e o projeto propõe apenas 5: cônjuge ou companheiro, filho ou enteado
até 21 anos ou até 24 anos se universitário e sem renda, e pai e mãe, tutelado
ou curatelado inválido ou menor de 18 anos sem rendimentos que viva sob sua
guarda judicial. Há casos de mães de militares que perderão, por exemplo, o
acesso ao atendimento hospitalar e agora, na velhice, não serão mais aceitas em
nenhum plano de saúde.
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), que participou da
audiência, disse estar convencido de que a injustiça do projeto é maior ainda
do que ele imaginava. Ele apresentou, na comissão especial, destaques para
tentar aprovar emendas que amenizem as perdas para algumas categorias e
informou já ter obtido assinaturas para levar a proposta para análise em
Plenário na Câmara, já que ela teria caráter terminativo nas comissões.
A reunião foi presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS).
Fonte: Agência Senado