Valor Econômico -
26/07/2012
Brasília - Um dia depois de representantes da administração
Dilma Rousseff e sindicalistas conversarem sobre uma eventual trégua no
movimento grevista que paralisa diversas áreas do Executivo, servidores
públicos e autoridades do governo federal deram ontem sinais de que as
negociações sobre reajustes salariais correm risco de passar por um processo de
radicalização. De um lado, o governo publicou um decreto para não ficar refém
dos grevistas e conseguir executar serviços essenciais para a população. E
avisou que é dever do gestor público descontar os salários dos faltosos.
No front oposto, servidores da Receita Federal anunciaram
que recorrerão à Justiça contra o decreto. Já os servidores do Banco Central
informaram que amanhã farão a quarta paralisação deste mês para pedir um
reajuste de 23,01%, e ameaçaram deflagrar greve por tempo indeterminado caso o
governo não apresente até o dia 31 uma proposta para as 19 categorias do
movimento.
O decreto presidencial publicado ontem estabelece que cabe
aos ministros de Estado e supervisores de órgãos federais promover convênios
com Estados e o Distrito Federal para evitar que atividades essenciais à
população sejam paralisadas. Um dos objetivos do Executivo é a liberação de
veículos e cargas no comércio exterior. "As medidas adotadas nos termos
deste decreto serão encerradas com o término da greve, paralisação ou operação
retardamento e a regularização das atividades ou serviços públicos", prevê
o decreto.
Segundo o advogado geral da União, ministro Luís Inácio
Adams, o "destravamento" dos portos brasileiros é um dos focos do
governo. "A preocupação é garantir que a economia continue a funcionar. O
Brasil está em uma situação muito boa, mas está numa situação em que a
realidade internacional é incerta. Então, as medidas são necessárias para
garantir que o Brasil não sofra com essa realidade", afirmou Adams ao
Valor. "Melhor seria se tivesse a lei de greve específica para o serviço
público, mas acho que, no caso concreto, não é um paliativo. O decreto
especifica ações para garantir o funcionamento de serviços considerados
essenciais para o país."
Outra fonte do governo avaliou que o decreto abre caminho
para a contratação de funcionários temporários para os postos desocupados pelos
grevistas. O dispositivo autoriza a substituição de servidores federais por um
funcionário semelhante do Estado ou município. Caso o servidor negue a missão,
a possibilidade de contratação temporária estaria aberta, disse a fonte.
Segundo ela, o "corporativismo" não permitirá que um grande número de
auditores estaduais ou municipais assuma o trabalho de um congênere federal.
Em entrevista a jornalistas, Adams afirmou ainda que o corte
de ponto de servidores públicos em greve é um debate pacificado na Justiça e
entendido como uma obrigação do Estado. "Por conta de uma negociação, você
pode no futuro abonar o ponto e compensar as faltas, retornando os pagamentos
que foram descontados. Mas isso é uma faculdade do processo de
negociação", explicou o ministro.
Os ministérios foram orientados a alertar os grevistas e
fazer com que seus departamentos de recursos humanos tomem as "medidas
cabíveis" em caso de falta. Os sindicalistas notaram nos sistemas internos
das Pastas que o ponto de alguns dias de julho seriam cortados em agosto, e
querem evitar essa medida. Está prevista para hoje uma reunião entre os
sindicatos e a Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério do Planejamento
para negociar a questão.
Para os auditores da Receita Federal, o decreto fere o
artigo da Constituição Federal que dá ao Ministério da Fazenda a
responsabilidade de fiscalizar e controlar o comércio exterior. O Sindicato
Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) decidiu ir à
Justiça contra o Decreto nº 7.777, o qual qualificou de "arbitrário"
e "inócuo". Ontem, a entidade ainda não havia decidido se
protocolaria um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) ou
apresentaria ações ordinárias na primeira instância da Justiça.