quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Lei de greve e burocracia desmesurada


Correio Braziliense     -     30/08/2012




As dificuldades enfrentadas pela sociedade e o governo com a quase generalizada paralisação dos servidores públicos são fruto de um Estado mal-organizado. A começar pelo descumprimento da Constituição por parte dos próprios poderes constituídos. Nem o Congresso Nacional tratou de regulamentar o direito de greve do funcionalismo, obrigação que protela desde a promulgação da Carta de 1988 (há quase 24 anos), nem o Executivo cuidou de definir a forma de cumprimento do artigo 37, inciso X, da Lei Maior, que impõe a revisão anual da remuneração dos trabalhadores federais.

Portanto, ao cobrar do Legislativo a regulamentação do direito de greve, o Palácio do Planalto não pode esquecer-se de que também tem dever de casa a fazer. Se a proposta de "pegar ou largar" um aumento salarial médio de 5% nos próximos três anos fez 90% dos servidores retornarem ao trabalho esta semana, que garantia há de que em 2013 o movimento não se repita, em prejuízo até do direito de ir e vir do cidadão e do abastecimento de remédios e equipamentos hospitalares país afora, como acaba de ocorrer? Melhor tirar as lições corretas do grevismo que ainda prejudica setores do governo e tomar as providências necessárias para evitar a eternização dos conflitos e de suas consequências.

Urge profissionalizar a máquina pública, privilegiando a meritocracia. O que significa estruturar devidamente as diversas carreiras, com planos de cargos e salários transparentes, que assegurem ao trabalhador atrativos para que possa evoluir, com qualificação e manutenção dos quadros em número suficiente para o cumprimento das funções. Até para poder remunerar melhor os trabalhadores, cabe pôr fim ao gigantismo caro e inócuo de que padece o Estado. Lembre-se, a propósito, que Dilma Rousseff chegou à Presidência da República graças, em parte, ao peso da imagem de gerente competente. Passa, pois, da hora de racionalizar a burocracia.

Contudo, independentemente desse desafio de fôlego que se apresenta aos governantes, o inciso VI do artigo 7º da Constituição assegura a "irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo". Ou seja, as correções salariais são inevitáveis. E é nessa garantia que se apegam os sindicatos para preservar o poder aquisitivo dos liderados, indiferentes à importância da desindexação como instrumento de controle de preços. Cabe ao governo encontrar a fórmula de operar a atualização.

Mas também urge regulamentar o direito de greve. É inconcebível que, depois de mais de duas décadas de atraso, projeto de lei de tal importância esteja emperrado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado desde novembro do ano passado. As negociações salariais malconduzidas de agora, que levaram à radicalização do movimento, certamente teriam melhores chances de êxito se realizadas dentro das normas lá previstas, inclusive com prazos e a obrigatoriedade de manutenção dos serviços essenciais. Esse é debate do qual a sociedade precisa participar. Deixar a cobrança exclusivamente por conta do Planalto é, sem exagero, voltar as costas à própria sobrevivência.

(Visão do Correio)


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