domingo, 6 de janeiro de 2013

A SITUAÇÃO REMUNERATÓRIA DA MAGISTRATURA FEDERAL


Nino Oliveira Toldo
Revista Consulex     -     06/01/2013 





A Lei de Acesso à Informação (nº 12.527/11) trouxe a público as distorções existentes na remuneração do serviço público, federal e estadual. Não são poucos os casos em que servidores públicos, magistrados estaduais, promotores e procuradores de Justiçarecebem remuneração superior à dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, em descumprimento ao teto remuneratório previsto na Constituição.

A Magistratura federal, no entanto, submete-se rigorosamente a esse teto e dele está refém, na medida em que o subsídio de Ministro doSTF não é reajustado há quase três anos, e outras carreiras, no âmbito estadual e federal, vêm recebendo verbas remuneratórias que o superam, o que tem causado indignação entre os magistrados federais.

Desde a sua adoção, em 2005, o valor do subsídio de Ministro doSTF – e, consequentemente, da Magistratura da União – foi revisto uma única vez, acumulando perdas inflacionárias da ordem de 28,86% (IPCA), embora a revisão anual seja prevista constitucionalmente (art. 37, inciso X). Com tal omissão, deixa de ser observada a norma constitucional que exige que o valor da remuneração no serviço público deva ser fixado segundo a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira (art. 39, § 1º, inciso I). O reajuste proposto pelo Governo (15,8%, em três parcelas anuais) não atende à reivindicação da Magistratura federal, pois não repõe perdas.

De outro lado, diversos direitos reconhecidos a outros ramos da Magistratura, inclusive a membros dos Tribunais Superiores, têm sido negados aos magistrados federais, causando indevido desequilíbrio remuneratório dentro do Poder Judiciário, em flagrante contrariedade ao caráter uno da Magistratura nacional, reconhecido pelo STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.854-DF (DJe 29.06.07). Além disso, parcelas remuneratórias e indenizatórias pagas no âmbito do Ministério Público e a servidores do Poder Judiciário não são estendidas aos magistrados federais.


Ao contrário de outras carreiras, os magistrados federais não são remunerados por atividades extraordinárias como plantões, acumulação de varas e substituições.

Se, em primeiro momento, o valor do subsídio era satisfatório e servia como atrativo para ingresso e manutenção na carreira da Magistratura federal, ao longo dos anos seguintes sofreu os efeitos da inflação. Com isso, a Magistratura federal perdeu atratividade e atualmente passa por um inédito e preocupante período de evasão de profissionais. Há juízes federais, por exemplo, prestando concursos para outras carreiras jurídicas ou retornando à Advocacia. Isso tudo porque a remuneração na carreira está inadequada às exigências e restrições do cargo, bem como ao seu grau de responsabilidade.

Esse quadro é tão grave que o ex-Presidente do STF, Ministro CarlosAyres Britto, chegou a dizer que o Poder Judiciário está se “desprofissionalizando” e que outras carreiras, mesmo no âmbito jurídico, têm hoje um maior poder de atração que a Magistratura. Isso se torna mais sensível na Magistratura federal, que se submete, reitera-se, integralmente aos limites remuneratórios fixados na Constituição Federal.

A perda de poder aquisitivo, evidentemente, tem refletido no ânimo dos magistrados federais. Afinal, ao contrário do que se imagina, os juízes federais não recebem supersalários e, assim como qualquer cidadão brasileiro, têm a legítima aspiração a uma vida digna e sem sobressaltos, para si e para os seus familiares. Sua remuneração, portanto, deve ser adequada às exigências e privações do cargo e tem que ser periodicamente revista para que o seu poder aquisitivo não seja corroído.

É preciso que se compreenda que a Magistratura federal constitui um dos pilares do Estado de Direito e, como tal, é essencial que seja bem remunerada, como uma das garantias da independência funcional. Os magistrados federais têm consciência da necessidade de que a remuneração do serviço público atenda ao princípio da moralidade e, por isso, defendem o teto remuneratório. No entanto, não aceitam que sejam os únicos a submeter-se a ele.

A Magistratura federal não está satisfeita com a forma como vem sendo tratada e é necessário que se reflita sobre isso. É preciso que se discuta seriamente o papel do Poder Judiciário e o perfil de juiz que se deseja para o Brasil. Não há democracia forte sem um PoderJudiciário igualmente forte e independente.

A Magistratura federal, nos últimos 20 anos, deu mostras de sua independência, mas tem sofrido, ao longo desse mesmo período, com a sua instabilidade remuneratória, quadro que se agravou nos últimos anos em decorrência do crescimento do País e, consequentemente, do aumento de consumo interno, que faz com que o custo de vida da classe média se eleve acima dos níveis oficiais de medição da inflação.

É preciso, portanto, que se dê à Magistratura federal a atenção que ela merece, porque é essencial ao Brasil. Desvalorizá-la é desvalorizar a democracia. A quem isso interessa?

Nino Oliveira Toldo
Juiz Federal. Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP).



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