Correio Braziliense - 15/08/2013
O Tribunal de Contas da União deu 60 dias para a Câmara dos
Deputados ajustar a folha de pagamento ao teto constitucional, de R$ 28 mil,
valor recebido por ministros do Supremo. Pela decisão, não será mais permitida
a incorporação de gratificações de cargos de confiança ao salário-base. Com a
medida, calculou o tribunal, haverá economia de R$ 517 milhões anuais. Em 17 de
julho, o Correio revelou que 94 servidores de nível médio da Câmara ganham mais
que um magistrado do STF. No total, no Legislativo, estima-se que há 3 mil
pessoas com contracheque superior ao limite máximo. A direção-geral da Câmara
só se pronunciará sobre a determinação depois da publicação do acórdão do TCU.
O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu ontem, no início
da noite, que a Câmara dos Deputados terá 60 dias para promover uma série de
adequações na folha de pagamentos de funcionários. A principal é limitar os
salários ao teto constitucional de R$ 28 mil, o que recebem os ministros do
Supremo Tribunal Federal (STF).
Não será mais permitida a incorporação de gratificações por
exercício de cargos de confiança ao salário-base. Graças a esse mecanismo,
considerado ilegal pelo TCU, técnicos legislativos — uma carreira de nível
médio — passaram a receber mais do que os analistas, com formação
universitária. Reportagem publicada pelo Correio em 17 de julho revelou que 94
funcionários de nível médio da Casa recebem remuneração superior à dos
ministros do Supremo. O valor mais alto da lista chegava a R$ 42 mil.
Estima-se que cerca de 3 mil funcionários do Legislativo
tenham remuneração superior ao teto, incluindo também os de nível superior. A
decisão de ontem, que teve como relator o ministro Raimundo Carreiro, atém-se a
uma auditoria realizada pelo TCU, em 2010, na Câmara, portanto as decisões são
endereçadas apenas à Casa. Há outro processo envolvendo o Senado. Em princípio,
porém, os senadores devem se preocupar a partir de já com a adequação às mesmas
normas.
O presidente do TCU, Augusto Nardes, afirmou que os técnicos
calcularam em R$ 517 milhões a economia anual do erário com as correções que a
Câmara terá de fazer. "Há funcionários que recebem o dobro dos vencimentos
de um ministro do tribunal", protestou na sessão de ontem o ministro
Walton Rodrigues. Ex-procurador da República e ex-consultor legislativo do
Senado, ele afirmou que sempre recusou artifícios que lhe permitissem acumular
salários.
Rodrigues queria que os valores recebidos a mais nos cinco
anos anteriores à auditoria, portanto, desde 2005, fossem devolvidos. Mas seu voto
foi vencido. Prevaleceu a interpretação de Carreiro de que as decisões do TCU
corrigem o problema, mas não exigem devolução de recursos se não houve intenção
de erro por parte da pessoa que recebeu pagamento indevido.
O ministro José Jorge acompanhou Rodrigues no voto, com o
argumento de que as pessoas que recebem acima do teto estão entre as mais
preparadas do Legislativo, portanto, não deveriam ignorar a lei e a
Constituição. "Os funcionários são suficientemente sabidos para notar que
isso não está certo", afirmou Jorge durante a sessão.
Para o ministro Benjamin Zymler, caso se interprete que o
pagamento foi indevido, o pedido de ressarcimento poderá valer não a partir de
2005, mas de 2003, quando a Constituição ganhou o artigo 37, estabelecendo o
teto salarial. "Não há prescrição para o ressarcimento de recursos
públicos", argumentou. Mas ele quer que os funcionários tenham amplo
espaço para defesa. "É preciso respeitar o contraditório", disse.
Em defesa dos servidores que recebem acima do teto, o
ministro Valmir Campelo afirmou que há divergências sobre o valor que deve ser
considerado como limite. "Em 2003, eu afirmei que deveria ser criado um
órgão para cuidar desse assunto", disse.
A interpretação da direção-geral da Câmara é de que o teto
constitucional aplica-se apenas ao salário-base dos funcionários. Assim, não
haveria limite para qualquer pagamento de outra natureza, incluindo as
gratificações por cargos de confiança.
Essa leitura se deve ao fato de que há, no Supremo,
ministros que recebem abono de R$ 3 mil. O valor é destinado aos integrantes da
corte que já teriam idade para se aposentar, mas continuam na ativa; ao
presidente; e aos que trabalham também como membros do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE). "É um absurdo que a regra usada para essas exceções
permita que três mil funcionários do Legislativo recebam acima do teto",
argumentou na sessão de ontem do TCU o ministro Walton Rodrigues.
O Ministério Público da União também discorda dessa leitura
e entrou com ação para derrubar os salários acima do teto na Câmara. Conseguiu uma
liminar para limitar os ganhos. Mas essa decisão provisória foi derrubada
graças ao trabalho de advogados da Câmara.
A direção-geral da Casa informou ontem que não vai se
pronunciar sobre as determinações do TCU até que seja publicado o acórdão.
Além da limitar os salários ao teto e eliminar a
incorporação de gratificações ao salário-base, o tribunal também exigiu que
funcionários em cargos de confiança trabalhem ao menos 40 horas semanais;
determinou a eliminação do pagamento de horas extras indevidas; e proibiu que
aumentos de vencimentos concedidos a parlamentares sejam automaticamente
repassados a servidores. A Universidade de Brasília (UnB) deverá ser comunicada
sobre os casos de professores contratados em regime de dedicação exclusiva que
são também funcionários do Legislativo, o que contraria as regras da
instituição acadêmica.
"Os funcionários (que recebem acima do teto) são
suficientemente sabidos para notar que isso não está certo", José Jorge, ministro do Tribunal de Contas da União
Fim da farra
Veja o que o Tribunal de Contas da União decidiu
A Câmara terá de eliminar a incorporação de gratificações ao
salário base de servidores, que fazem com que alguns funcionários de nível
médio ganhem mais que os de nível superior. Há rendimentos superiores a R$ 50
mil.
O limite do salário total dos servidores será o teto
constitucional, de R$ 28 mil.
Os funcionários que exerçam cargos de confiança terão que
trabalhar ao menos 40 horas semanais.
A Câmara terá de abolir o pagamento de horas extras
indevidas.
A casa legislativa terá de comunicar à Universidade de
Brasília (UnB) o caso de professores contratados em regime de dedicação
exclusiva que são também funcionários do Legislativo
Os aumentos de vencimentos concedidos a parlamentares não
serão mais repassados automaticamente aos servidores.