Correio Braziliense
- 02/05/2017
O servidor público civil será o maior prejudicado pela
reforma da Previdência que está em tramitação no Congresso. A afirmação é de
Lucieni Pereira, auditora federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União
(TCU). "Os militares, por exemplo, ficaram fora do projeto", disse,
durante seminário no Correio sobre o tema. "Novamente, o servidor público
civil é o único alvo da reforma previdenciária quando se debatem os gastos da
União com funcionários aposentados e pensionistas." De acordo com Lucieni,
não está havendo transparência em relação às despesas do setor público.
"Não venho aqui para pregar que não se deve fazer a reforma da
Previdência, mas a gente tem de ter clareza do que está sendo discutido. O texto
se restringe ao servidor federal civil aposentado quando se fala em contas da
União", ressaltou, defendendo maior debate sobre a amplitude da reforma.
Conforme dados do
Tesouro Nacional, as aposentadorias e pensões do servidor público federal
geraram à União um deficit de R$ 77,2 bilhões em 2016. Esse número, porém, é
contestado por Lucieni. Para provar que o maior peso não se refere ao
funcionário civil, a técnica abriu os números do governo. Ela mostrou que os
benefícios de 689 mil servidores civis resultam num rombo de R$ 33,3 bilhões, o
equivalente a R$ 48,8 mil por benefício ao ano, enquanto as aposentadorias e
pensões de 300 mil militares somam R$ 34 bilhões, ou R$ 113,4 mil por benefício
ao ano. "O custo do militar e dos aposentados e pensionistas do Distrito
Federal a cargo da União é muito maior do que o alvo da reforma da Previdência.
Isso tem que ser dito à sociedade. Eu não posso fazer um debate achando que
essa reforma se destina a R$ 77,2 bilhões, pois não é verdade", rebateu.
"Quem apresenta o número dessa forma ou não está compreendendo bem as
finanças e a ordem jurídica ou não está sendo transparente."
Para a auditora, há, nesses dados, uma importante
discrepância a ser corrigida. A União arca com o Fundo Constitucional do DF,
que paga as aposentadorias e pensões de 49,1 mil servidores das áreas de
educação, saúde e segurança pública. O deficit dessa conta chega a R$ 4,2
bilhões por ano, o que representa R$ 85,5 mil anuais por benefício. Segundo
Lucieni, apesar de a União despesa, as contribuições previdenciárias
descontadas do funcionário distrital não vão para o Executivo federal e, sim,
para o caixa do GDF, gerando outro impacto no cofre da Previdência. "É uma
excrescência que se perpetua por alguns anos. O custo das aposentadorias e pensões
do DF é maior que o do Judiciário, do TCU (Tribunal de Contas da União) e do
MPU (Ministério Público da União)", afirmou. Segundo Lucieni, a União
segue rigorosamente a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) no que diz respeito
às despesas com pessoal, que se mantêm estáveis em relação ao Produto Interno
Bruto (PIB).
Dados de 2015 mostram
que o Executivo federal, em nenhum momento desde de 2002, chegou perto do
limite de 50% da receita corrente líquida imposta pela LRF, incluídos gastos
com servidores ativos, aposentados e pensionistas. Em 2002, a despesa ficou em
31,88% do total das receitas correntes líquidas, e, em 2015, atingiu 32,32%.
Lava-Jato Lucieni Pereira, auditora federai de Controle Externo do Tribunal de
Contas da União (TCU), destacou que o Banco Mundial, a Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), magistrados e juristas
reconhecem a necessidade de haver tratamento diferenciado entre servidores
públicos e trabalhadores da iniciativa privada, porque o regime jurídico não é
o mesmo. "É falacioso e rasteiro os discursos de que tem que aproximar o
servidor público do empregado do setor privado. É preciso olhar para plano de
benefícios de procuradores e magistrados, de quem vai fazer a Lava-Jato do
futuro", frisou. Entidades devem ir ao STF, orienta advogado O advogado
Cláudio Farág aponta como inconstitucionais as mudanças que o governo busca na
Previdência.
Na opinião dele, as
entidades de defesa do serviço público devem recorrer ao Supremo Tribunal
Federal (STF) a fim de paralisar a tramitação da Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) no Congresso. De acordo com o defensor, diante das
diferenciações que estão sendo estabelecidas nas regras para a aposentadoria
poderá haver uma grande judicialização da Previdência. Cada grupo que se sentir
prejudicado pedirá equiparação a outro mais favorecido. No caso dos servidores,
a proposta de reforma do governo prevê aposentadoria aos 65 anos para homens e
de 62 anos para mulheres, desde que tenham contribuição mínima de 25 anos.
Não haverá garantia
de integralidade nem de paridade com os salários de funcionários que estão na
ativa para aqueles que entraram no serviço público a partir de 2003. O salário
integral só será pago para os servidores que tiverem pelo menos 35 anos de
contribuição. As entidades de classe estão se movimentando no Congresso com o
objetivo de garantir a integralidade e a paridade, mas o governo resiste em
ceder. * De acordo com Farág, a reforma da Previdência já começou errada,
devido à falta de transparência nas discussões. Ele afirmou que o governo mente
ao dizer que há deficit no sistema previdenciário, sobretudo no regime próprio
dos servidores (RPPS). O Executivo fala num rombo de R$ 77 bilhões por ano com
pouco mais de 1 milhão de beneficiários. Esse buraco, porém, não existe, na
opinião dele, já que o governo não cumpre a sua parte ao recolher os 20% de
contribuição sobre a folha de salários. Os servidores pagam 11% do salário
bruto para o sistema.
"A União é uma
grande sonegadora e omite o quanto deixou de contribuir", acusou. Confisco
Segundo o advogado, a Previdência Social necessita de fundamento para ter
regras justas. Isso não quer dizer que os sistemas que atendem os trabalhadores
do setor público e do setor privado devem ser unificados, como chegou a propor
o governo logo no início do debate sobre a reforma. "A unificação dos
regimes é cruel. Como podem exigir um mesmo tempo de contribuição para um
pedreiro que não tem emprego fixo e para um servidor público com
estabilidade?", questionou. Por isso, destacou Farág, o debate sobre a
proposta de mudança deve ser amplo.
Não se deve impor a
vontade de um grupo que se apresenta como dono da verdade. Para ele, a equipe
econômica apresenta números que não correspondem à realidade. Pelos cálculos do
Tesouro Nacional, somente nos primeiros três meses deste ano, a Previdência
registrou deficit de R$ 40 bilhões, 38% a mais que no mesmo período de 2016.
Farág declarou ainda que o servidor público merece receber proporcionalmente ao
que contribuiu. "Ninguém quer benefício assistencial, quer a aposentadoria
a que tem direito e, com a reforma, não vai receber o correspondente ao que
pagou. Isso é confisco", concluiu.